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3294 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 131

Não, não há crise. Há apenas o que. sempre houve e que é aquilo que acabo de relatar: uma subsistência de factores de vária ordem a determinar uma situação permanente que já não pode reputar-se de simples conjuntura, mas que em si mesma reflecte, claramente, todo um vasto e complexo problema estrutural dessa lavoura.
A crise, para ser crise, tem de representar algo diferente da realidade habitual, tem de constituir uma qualquer espécie de perturbação ou alteração do que é usual e corrente, tem de surgir como acontecimento insólito, diverso, a sobrepor-se ou a destacar-se do curso rotineiro da vida.
E não é isso, infelizmente, o que acontece naquela região.
Infelizmente, repito, porque se acontecesse era sinal de que antes as coisas estavam ou tinham estado a correr bem!
Atente-se, portanto, na gravidade da situação.
É normal o lavrador só conhecer uma espécie de contacto com os bancos, casas bancárias e estabelecimentos de, crédito, públicos ou particulares: o contacto para a solicitação de empréstimos sucessivos que sucessivamente vão agravar a sua cada vez mais precária situação financeira.
É normal o lavrador ignorar os modernos métodos e técnicas agrícolas que lhe consentiriam aumentar a produção e torná-la mais lucrativa.
É normal o lavrador olhar indiferente ou conformado para a dispersão e pulverização da sua propriedade sem se aperceber de que esse duplo fenómeno constitui, afinal um dos maiores óbices à reestruturação ideal do agro, como ponto de partida, para o autêntico progresso da agricultura.
É normal o lavrador não dispor, no campo, de máquinas, de armazéns, de silos, de meios de transporte adequados, de serventias ou vias de comunicação adaptadas às necessidades da exploração, de assistência técnica permanente e pronta, de assistência financeira atempada e eficiente, e, em casa de electricidade, de esgotos, de água corrente, de abundância, de higiene, de comodidade, de alegria de viver!
É normal o lavrador lançar uma semente à terra para só colher meia dúzia, tendo feito uma despesa que só viria a ser coberta se colhesse pelo menos dez.
É normal o lavrador submeter um terreno a determinada cultura nada lucrativa ou mesmo ruinosa por não saber que as características agrológicas, geológicas e climáticas desse terreno exigiam que lhe fosse destinado um tipo de. cultura totalmente diferente.
É normal, por fim, que o trabalhador agrícola, o jornaleiro, o homem da enxada, para quem o horário de trabalho consiste em baixar o dorso quando o Sol se erguer e só erguer o dorso quando o Sol baixar - receba um salário muito próximo do afrontoso - porque mais o lavrador não pode dar, e mesmo esse só o possa vencei quando o tempo lho permita; normal que ele não goza de qualquer protecção estadual, de qualquer modalidade de assistência ou previdência, nem beneficie de seguros obrigatórios, nem de tabelas de salários mínimos, nem de horários de trabalho, nem de férias pagas, nem de abonos de família, e assim arraste uma existência de verdadeiro pária, com um nível de vida sem termo de comparação, a debater-se permanentemente em faltas e necessidades, e a toda a hora a ruminar na fuga da terra, madrasta no êxodo para uma existência melhor!
E é a esta situação de facto, estabelecida desde o fundo dos séculos, sempre igual, sempre corta, intacta, indeformável, que se teima em chamar de «crise», pomposamente, por luxo fazendo-se crer que antes as coisas corriam de vento em popa às mil maravilhas!
Ora nunca foi assim! Pelo menos no Noroeste transmontano, a que me estou a referir.
Normalidade, portanto, adentro da própria anormalidade.
E um dos aspectos que assume essa estranha normalidade é o da confusão, do abandono, do erro e por vezes do caos em que se processa a cultura da batata nas zonas da região em causa, a ela afectadas, com justo relevo para o concelho de Chaves.
Reporto-me à batata, não só por ser a cultura ali dominante, com interesses de monta a ela ligados, como ainda pela notável frequência com que os produtores, consumidores, compradores, organismos corporativos e o próprio Estado se vêm envolvidos em complicadíssimas situações, donde, por via de regra, só consegue sair-se à custa de considerável sacrifício, quer dos particulares, quer do Estado, e sempre da economia da Nação.
É claro que estas alterações periódicas da normalidade sui generis atrás apontada hão-de ter uma causa, ou mais.
E têm-nas, efectivamente, de ordem genérica, umas, e de ordem específica, outras.
As primeiras, de todos conhecidas, e que já deixei em grande parte enumeradas, concernem à lavoura em geral, ao seu estado de involução ou penosíssima evolução, à ausência ou incipiência da sua mecanização, industrialização e comercialização, ao clima de subdesenvolvimento II inviabilidade que a tolhe, asfixia e lhe determina o rumo incerto por onde vai seguindo, aos baldões, desajeitadamente!
As segundas, conhecidas só de alguns, respeitam à própria batata, desde a sementeira à venda, com percurso por todas as vicissitudes do seu ciclo de produção, e a abranger problemas de transporte, colocação, importação ou exportação, sementes, crédito, preços, taxas, intermediários, etc.
Ora, como a lavoura da região a que venho aludindo está neste momento a suportar as agruras de mais uma daquelas cíclicas perturbações a que soe apelidar-se de «crise» - a meu ver erradamente, atentas as razões expostas - e visto que tal perturbação afecta de modo directo a comercialização e preços da batata, com todo o seu cortejo de más consequências para o equilíbrio económico, social e até político das zonas interessadas, é de flagrante oportunidade que se enumerem as causas específicas do fenómeno, a fim de que, pelo seu exacto conhecimento, possam os responsáveis tomar as medidas reclamadas pela urgente resolução do caso presente, e também das medidas de fundo exigidas para a resolução definitiva do problema.
Pois bem: como principais factores determinantes de todas as crises da batata (usando da terminologia corrente), costumam apontar-se:

1.º A livre importação de batata de semente de polpa amarela, o que, pelo jogo de fixação de quotas de importação determinadas pela quantidade, leva os importadores a inscreverem-se com os maiores contingentes possíveis daquela batata, embora daí lhes não advenham praticamente quaisquer lucros, mas procedendo assim para firmarem posições que lhes permitam importar depois largos contingentes de batata de semente de polpa branca, da qual auferem, segundo os melhores cálculos, um lucro de cerca de 100$ por cada saca de 50 kg!
2.º A falta ou irregularidade de manifestos de sementeira e produção nos grémios da lavoura, com o consequente desconhecimento, pelas entidades que superintendem no assunto, da exacta situa-