26 DE FEVEREIRO DE 1964 3361
construção das poucas estradas existentes, é de contar que nem no fim deste século possamos dispor de comunicações capazes em todas as ilhas.
Muito bem se afirma na mensagem das forças vivas:
... havia necessidade de aceleramento do programa e de se dar prioridade às ligações inexistentes sobre a melhoria das ligações existentes. Isso não significa inacabamento de obras começadas, mas sim preferir abrir uma nova estrada entre dois centros que nunca foram ligados, a ir abrir uma segunda estrada (embora necessária) em substituição de uma já existente, ainda que funcionando precàriamente.
Existem ilhas, como Santo Antão, ainda hoje divididas em verdadeiros compartimentos estanques.
Às comunicações marítimas dedicarei algumas mais considerações, as bastantes para se poder fazer comparação entre o passado e o presente.
No que respeita, à navegação estrangeira, cujos barcos outrora utilizavam em grande número o Porto Grande de S. Vicente, foi ela decaindo progressivamente, queda que se tornou espectacular, entre outras razões, por não termos querido competir (pelo menos igualando) com os preços por que os combustíveis eram fornecidos por Dacar e Canárias.
E assim muita navegação abandonou o nosso admirável porto, não se apercebendo a Administração de que esse abandono significaria baixa muito sensível no fornecimento desses combustíveis, diminuição considerável do fornecimento de géneros, como carnes, peixe, frutas, hortaliças, bebidas, etc., e das relações mercantis do comércio local com os passageiros e tripulantes, donde proveio sempre, e enquanto o porto teve constante movimento comercial, grande afluxo de cambiais.
O exposto explica um dos motivos que levaram à decadência o Porto Grande. Até quando? Não é fácil conjecturar.
As comunicações entre as ilhas, enquanto a Empresa Nacional de Navegação delas estava encarregada, eram perfeitas, a ponto de todas terem ligação directa com a metrópole e Guiné, bimensalmente, dispensando-se assim o transbordo de mercadorias, a essas ilhas destinadas, nos portos de S. Vicente e Praia, como vem acontecendo há muitas dezenas de anos. Quando essa Empresa suspendeu as carreiras, entrou-se em período incerto e irregular. Hoje suponho estar o caso resolvido com a compra por banda do Estado de um pequeno vapor, o Santo Antão (compra, que, diga-se de passagem, não me pareceu absolutamente acertada), o qual começou este ano a percorrer as ilhas três vezes por mês, o que é já muito bom.
Um pequeno senão ensombra o panorama: o facto de o barco ser explorado pelo Estado, o que a província encara com certo temor, resultante de fracassos anteriores, justamente por a exploração ter sido feita pelo Estado, com outros navios, o que parece não deveria ter aconselhado tal sistema de exploração.
É de lamentar que o Santo Antão tenha de vir a Lisboa, duas vezes por ano, limpar o fundo, como já aconteceu desde que é pertença do Estado. Durante o tempo em que esteve na província como propriedade da Sociedade Geral, creio que cerca de três anos, nunca a Administração se lembrou de que, aumentando de alguns metros o comprimento do rudimentar plano inclinado existente no Porto Grande, ou construindo outro condigno, escusava o barco de se deslocar a Lisboa ou, como sucedia outrora, a Dacar, o que representou e representa despesa de certo vulto, além da suspensão das carreiras entre as ilhas, que também implica, inconvenientes de vária ordem.
Mais uma pequena anotação: não posso deixar de deplorar que, devendo o Porto Grande oferecer à abundante navegação que passa um pouco ao largo do arquipélago possibilidades de assistência, não esteja ele dotado de um estaleiro naval, modesto, mas com as condições bastantes para bem servir os navios que dessa assistência porventura necessitem, não podendo eles, por vezes, dada a natureza da avaria, atingir o porto de Dacar. Assim, terão de demandar o nosso porto e ali esperar que um reboque os venha buscar.
Dizem-me estar em estudo a construção do estaleiro no Porto Grande. A boa vontade sempre manifestada pelo ilustre Ministro do Ultramar não permitirá, decerto, delonga demasiada rios estudos e consequente construção.
E para terminar este capítulo referente a comunicações marítimas, é de pedir a atenção do Governo para um estado de coisas que não deve continuar a subsistir.
Outrora Cabo Verde tinha ligação certa, bimensal, com S. Tomé e Angola, mantida pelos paquetes da Empresa Nacional de Navegação.
Foi suprimida essa ligação há algumas dezenas de anos. Em sua substituição apenas de quando em vez apareço um barco que traz ou vai levar trabalhadores para S. Tomé e Angola e algum outro que é portador de géneros alimentícios para a província. Se alguém quiser embarcar dessas províncias ultramarinas para Cabo Verde, ou vice-versa, terá de vir a Lisboa, e sabe-se lá quanto tempo poderá estar à espera de um lugar para seguir viagem.
Outro tanto sucede com a actual carreira Lisboa-Cabo Verde-Guiné, feita bimensalmente pela Sociedade Geral. Só um desses seus barcos na ida para o Sul escala o Funchal. No regresso, qualquer deles não escala esse porto. Daí resulta que um passageiro que da Guiné ou Cabo Verde se destine ao Funchal tem de vir a Lisboa e daqui terá de percorrer caminho já andado até à Madeira, com perda de muito tempo e dinheiro.
Não convém às companhias de navegação a escala pelos portos de S. Vicente e Praia e a escala pelo Funchal quando os paquetes regressam da Guiné? Comercial e económicamente pode estar certo. Politicamente é que de modo nenhum.
Grandes somas, que vão a caminho de duas centenas de milhares de coutos, foram já despendidas em infra-estruturas, competindo delas destacar os planos de construção de aeródromos, que tem seguido ritmo não muito regular, mas podendo os aviões de serviço interno aterrar em quase todas as ilhas, excepto Santo Antão e Brava.
O aeródromo internacional da ilha do Sal esteve durante algum tempo votado a incompreensível abandono. Muitos aviões de companhias estrangeiras deixaram de o escalar, parece que por as condições de aterragem não terem acompanhado a evolução da aeronáutica. Assim, não foram levadas a cabo as obras absolutamente indispensáveis para que nesse aeroporto tivessem possibilidade de aterrar os jactos e outras grandes naves aéreas, que, por vezes, não podem servir-se das pistas de Dacar por razões de ordem meteorológica e que por via dessas obras teriam essa alternativa. Admite-se até a hipótese de que, com o aumento da dimensão das pistas, fosse possível contar com o regresso de muitos aviões que abandonaram esse notável aeroporto.
Constou em tempos, parece que com visos de verdade, que investimentos volumosos por companhias de navegação aérea da África do Sul iriam ser realizados nessa ilha e que seriam especialmente destinados a novas pistas, a construção de um grande hotel e pesquisas de águas ou dessalinização da água do mar para o seu devido abastecimento.