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3364 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 134

De Macau chega até mim a notícia de que este magno problema das transferências, ou, melhor, da falta de transferências de Angola, começou também a afectar aquela província, longínqua parcela de Portugal, a partir de Dezembro do ano findo, sem qualquer prévio aviso ou razão justificativa. De repente foram as transferências sustadas é, como consequência de tal medida, a filial do Banco Nacional Ultramarino em Macau deixou igualmente de descontar as letras de câmbio sacadas sobre Angola!
São evidentes os inconvenientes e perigos do uma tal situação, face aos exportadores e industriais de Macau, que subitamente se vêem privados de podarem continuar a exportar os seus produtos, pois não iriam arriscar-se a continuar uma operação sem a mínima garantia de reembolso dos capitais por eles despendidos.
E, assim, o comércio de exportações para Angola encontra-se praticamente paralisado, com todos os inconvenientes resultantes de tal situação, que. afectando directamente os industriais e exportadores, se reflecte igualmente na vida económica da província e pode criar nos ânimos dos que, em Macau, tem vindo a investir generosamente os seus capitais, um clima d« desconfiança na nossa administração que importa a todo o custo evitar.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E lugar-comum, mas nem por isso deixa de ser uma verdade de todos os tempos, que uma boa administração tem, necessariamente, de se basear na confiança dos administrados, o que, por outras palavras, quer dizer que os governantes precisam da confiança dos governados para que o seu governo seja estável, próspero e profícuo, e quando esta confiança diminui ou é abalada, depressa fará sentir os seus efeitos.
Macau está em riscos de atravessar esta crise, pois, além da falta de transferências de Angola, a que já me referi, um outro facto, a meu ver ainda mais grave, se está a passar que ultrapassa até o âmbito local, para se projectar no campo, nacional, indo colidir com a política de integração económica nacional em que o Governo se encontra empenhado.
Como de todos é sabido, o Decreto n.º 41 026, de 9 de Março de 1957, criou o regime de livre circulação em todas as províncias ultramarinas dos produtos delas originários, constituindo, por assim dizer, um primeiro passo para a integração económica do espaço português, aproximando-se, assim, da unidade política já existente.
Com a entrada em vigor do referido decreto, a província de Macau, que pela sua diminuta extensão e características especiais só pode aspirar a ser um centro de distribuição de produtos importados e nela transformados em maior ou menor escala, viu que se lhe abriam horizontes mais largos com a possibilidade de colocação destes produtos nos vastos mercados ultramarinos, designadamente Angola e Moçambique.
Com tal perspectiva e com a confiança inspirada pela Administração, começam a afluir a Macau os grandes investimentos que fazem com que o artesanato comece a ceder o passo a unidades industriais de certo vulto, dando nova feição económica à província e contribuindo para esbater o conceito que de Macau se fazia anos atrás, principalmente no estrangeiro, de «metrópole do prazer e do vício»!
Animados com as novas perspectivas que se lhes abriam e encorajados com as facilidades concedidas pelo governo local, procuraram os industriais não só ampliar e melhorar as suas instalações fabris, como ainda aperfeiçoar os processos de fabrico, por forma que o produto acabado pudesse competir, não só em preço como em qualidade, com os produtos congéneres de outras origens. O que plenamente se conseguiu!
A pouco e pouco e sempre progressivamente foram os produtos macaenses conquistando os mercados de Angola e Moçambique, onde ocupam a posição de relevância que as contas referentes ao ano de 1962 expressivamente representam:
Em 1958 o valor da exportação de Macau para as restantes províncias ultramarinas cifrou-se em cerca de 14 877 000 patacas, o que corresponde a 81 823 500$. Mas já em 1962 o valor da exportação foi para além do dobro, cifrando-se em 34 362 000 patacas, ou sejam 190 476 000$, sendo de se notar que o valor da exportação para Angola foi da ordem de 16 014 000 patacas, ou 88 077 000$ (superior à exportação global do ano de 1958), e três vezes mais do que o valor da exportação para Angola em 1958, que foi de 5 418 000 patacas, equivalentes a 29 799 000$.
Eram assim, francamente optimistas os resultados obtidos e tudo levava a crer que a curva ascensional se mantivesse, pois nem as possibilidades de Macau se encontravam esgotadas, nem os mercados ultramarinos portugueses estavam saturados, e os resultados do l.º semestre do ano de 1963 corroboraram a previsão!
Infelizmente, porém, já quase no fim do 2.º semestre do ano findo, é a província surpreendida ,com um estranho e singular despacho do Exmo. Sr. Secretário Provincial de Angola, a que coube o n.º 21/63, exarado na informação n.º 334-222/31/1.ª da Direcção Provincial das Alfândegas, e no qual se determina que na importação de determinadas mercadorias, mesmo acompanhadas de certificados de 100 até 50 por cento, poderão os importadores, se não desejarem pagar desde logo os direitos pela pauta preferencial, caucioná-los, de harmonia com o disposto na circular n.º 96 de Agosto de 1959, até resolução definitiva do assunto.
E de uma penada se derrogam, não só o decreto já citado, n.º 41 026, da livre circulação das mercadorias, como ainda os Decretos n.ºs 44 016 e 44 260, que isentam de direitos as mercadorias exportadas a coberto de certificados de origem nacional!
Estranho e singular despacho este, pois aprendi, e sempre julguei que assim fosse, que os diplomas legais só poderiam ser alterados ou revogados por diplomas legais de igual ou maior força.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E, pelos vistos, não é assim!

O Sr. António Santos da Cunha: - Isso é.

O Orador: - Independentemente, porém, de tal anomalia, o certo é que tal medida, tomada sem a audição de Macau, nem sequer com prévio aviso, colocou os exportadores e industriais em verdadeiro pânico e vibrou duro e devastador golpe na confiança sempre depositada na Administração, e sem a qual não é possível fazer-se obra que perdure, além do desprestígio que para ela acarretará.
Para já, o referido despacho determinou a suspensão imediata de ordens dos importadores angolanos, que não podendo ou não desejando imobilizar os seus capitais com o caucionamento que arbitrariamente lhes foi determinado e sem a certeza do seu eventual reembolso, e não podendo, por isso, determinar os preços para a venda a alho dos produtos importados, preferiram acabar pura e simplesmente com a importação, aguardando o esclarecimento da situação.