11 DE MARÇO DE 1964 3563
O «pé descalço» do País é, no entanto, muitíssimo mais rotina de mau hábito que reflexo de necessidade. Prova-o até o facto de que no País se não vê, e não há, «pé descalço» em certas regiões de muito menor nível económico do que o de outras em que ele se espalha profusamente.
De resto, não parece que seja mais barato o vestir do que o calçar.
Já há cerca de doze anos VI compilado num meritório livro, além de pormenorizada enumeração de tristes casos de morte pelo tétano, todo um conjunto de medidas, de exposições e de reclamações, revelador de profunda preocupação de longa data para que este humilhante aspecto da vida portuguesa desapareça por completo.
Várias campanhas se têm feito, dimanadas de organismos oficiais de saúde, dos governos civis e, na sua sequência, das câmaras municipais, dos comissariados policiais, etc., mas, ou por falta de persistência, ou por força de rotina perante moderação rui imposição, ou ainda por carência do regulamentação de cume, o facto é que ao fim de tanto ano de acção o «pé descalço» persiste ainda, embora - diga-se - com muito menor expressão e hoje quase limitado aos meios rurais.
Não me furto a apelar para que se renove a iniciativa de campanha, de inteiro âmbito nacional, compreensiva mas definitiva, condutora de eliminação rápida e total do «pé descalço» no País, campanha que não precisa, nem deve esquecer, o amparo de casos raros e isolados de carência, através dos centros de assistência local.
Outro aspecto a eliminar: o pedir esmola em público - este aspecto está ainda, com não rara frequência, generalizado a centros urbanos, grandes ou pequenos, a meios rurais e aos locais privilegiados de concentração e afluência turística.
É obrigação nossa suprir através de toda a organização assistencial, oficial e privada, com total amplitude os casos de carência; mas é altamente humilhante para nós - e a acção policial tem de o eliminar eficaz e totalmente - o recurso do nosso «pobre» - fingido ou real - à caridade do turista estrangeiro.
Torna-se também necessário banir a possibilidade do péssimo industrial, hoteleiro ou proprietário de restaurante, que faz com o cliente estrangeiro especulação de preços, numa atitude, além de desonesta, imbecil, porque não descortina ao longe, que em vez de multiplicar por pouco, divide por muito, a possibilidade, do desenvolvimento do turismo nacional e da sua própria indústria.
Têm ainda de eliminar-se aspectos hostis, como aquele há dias referido na imprensa, de agentes fiscais entrarem de chapéu na cabeça, ostensivamente, e com consequências vexatórias, na sala restaurante e bar de estabelecimento público de categoria e clientela turística. A fiscalização é imprescindível para defesa do próprio cliente ou turista, mas exerce-se recatadamente. Não procedendo dessa forma, pode concorrer-se para vigoroso aspecto de propaganda antiturística, até pelo que se avoluma e distorce.
A expressão do grande valor que assume o turismo de passagem é em grande parte definida pelo número dos que entram a fronteira por via rodoviária, uma vez que esses que se deslocam em veículos automóveis, ou vêm dispostos a percorrer o País, ou percorrem-no com certeza antes e depois de fixar-se.
Em 1962 entraram as fronteiras do continente 64 800 automóveis estrangeiros, tendo o número mais que duplicado no lustro 1958-1962.
Processou-se dessa forma o aumento durante aqueles cinco anos a um ritmo de 20 por cento, o que revela, se este se relacionar com o ritmo de afluência total, uma tendência a entrar-se cada vez mais no País viajando de automóvel.
Por outro lado, se aceitar como firme aquele ritmo de 20 por cento até 1970, entrariam nesse ano no País 277 300 veículos estrangeiros, ou sejam mais do que o quádruplo do número de 1962.
Se admitir a média de 3 passageiros por veículo, dos 195 000 turistas automobilistas de 1962 passar-se-ia aos 830 000 em 1970, e o volume do turismo de passagem complementa-se ainda pela irradiação dos centros de chegada do turista que vem pelas vias clássicas do transporte colectivo: avião, comboio e barco.
É fundamental, para que se atinja o nível de expansão turística que legitimamente se procura, que a «Voz de Portugal Turístico» se faça ouvir com autoridade competitiva em todos os países em que se revelam tendências de potencial alimentador do turismo nacional, por persistente propaganda aliciadora através dos organismos representativos da nossa actividade turística no estrangeiro: Casas de Portugal, centros de turismo e informação - criando, quando os não haja, em países que afirmam possibilidade alimentadora, e nada parece impedir que, para idêntica finalidade, se interessem e se habilitem as nossas representações diplomáticas e consulares.
São meios de acção a prover aos centros: cartazes, impressos desdobráveis, roteiros, em boa linguagem nativa do país a que se destinam, e não em traduções que espalhem ridículo em vez de fazer propaganda - mas tudo fornecido com liberal profusão, e não em remessas de 100 e 1000, referidas como enviadas ao director do nosso Centro de Turismo de Bona, tal qual se tratasse de exercício de propaganda para uma festa de família.
Terá de manter-se insistente publicidade em jornais e revistas e de impulsionar demonstrações ocasionais de elevada e característica expressão nacional de atracção turística e ampla projecção colectiva.
Tudo a irradiar lá fora, bem forte, a inconfundível modalidade e distinção do turismo nacional.
Cá dentro: recepção de simpatia e regozijo por coloridos cartazes, de boas-vindas, em várias línguas, à entrada da fronteira; sinalização perfeita e atraente ao longo das estradas, evidência dos roteiros turísticos, de acesso a monumentos, castelos, locais panorâmicos - tudo quanto seleccionado como valor turístico; e nos centros urbanos - cidades e vilas - orientação convidativa às zonas centrais e ao órgão local do turismo.
A acção dos órgãos locais de turismo (comissões regionais, juntas de turismo e comissões municipais) -que em muitas zonas se limita a pouco mais que existência - deve ser: prontidão em auxiliar o turista; fornecer esclarecimentos sobre equipamento hoteleiro local, preçários, dominância comercial local; exercer propaganda, distribuir impressos elucidativos e convidar à visita de atracções turísticas regionais.
E passamos a breves aspectos de caminhos ou vias de acesso turístico ao País.
Verifica-se que a afluência turística está a acorrer aproximadamente da seguinte maneira:
Percentagens
Por estrada ........................ 43
Por avião .......................... 34,5
Por caminho de ferro e barco ....... 22,5
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Total ............... 100
Desta fornia, dos 520 000 turistas vindos ao País em 1963, 223 600 teriam acorrido pela estrada, 179 400, por avião, e os restantes 117 000, por caminho de ferro e por barco.