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11 DE MARÇO DE 1964 3571

de liberdade» como sendo a de duração inferior a seis meses) com esta frase edificante:

C'est donc à juste titre que l'on affirme que les courtes peines de prison créent des recidivistes (9).

O indivíduo que as sofre perde o amor próprio e a consideração dos que o cercam; em muitos casos pode desadaptar-se socialmente:

Chez les individus plus sensibles, une peine d'emprisonnement, même courte, fera naitre des sentiments de révolte et cet individu peut devenir un être anti-social (10).

Vê-se assim como os penalistas criticam a pena curta de prisão (independentemente de ser ou não aplicada por conversão de outra pena). Não parece curial estabelecê-la senão por igualmente fortes razões contrárias. Vejamos se existem.

) E de Garofalo uma distinção que, tratando problemas criminais de jure condendo, parece à Câmara Corporativa ter alto valor: a distinção dos delitos (ou crimes, lato sensu) em delitos naturais e aquilo a que Garofalo chamava, em contraposição e completamente fora do significado hoje usual da expressão, delitos políticos. Retendo a ideia fundamental do criminologista italiano, deve reconhecer-se uma profunda distinção entre os crimes que correspondem à violação de uma norma recebida e defendida como essencial pela ética social (positiva) (11), e aqueles que sancionam penalmente um acto que a ética social positiva não condena, e até algumas vezes impõe. Não convém chamar a estes últimos delitos políticos, como fez Garofalo, dado o sentido hoje corrente da expressão; chame-se-lhes, convencionalmente, crimes (lato sensu) ou delitos de pura criação legal.
Destes, alguns há através da criação dos quais a ordem jurídica pretende justamente actuar sobre a ética social positiva e torná-la (segundo a sua concepção) mais perfeita - é o caso típico do duelo. Mas há outros que representam pura e simplesmente a punição de actos para os quais não é fácil encontrar outra sanção eficaz.
A aplicação de penas de carácter pessoal aos agentes de crimes de pura criação legal, deste último tipo, representa a deliberada degradação moral, pela ordem jurídica, de uma pessoa que em nada mostrou falta de princípios éticos ou morais. A sua mais coerente justificação ainda se encontra numa ideia de prevenção geral. Mas é preciso não esquecer que a ideia de prevenção geral como fim da pena transforma o homem num mero instrumento da ordem jurídica, a usar «para que os outros vejam», e é assim contrária ao personalismo de origem cristã, que não devemos permitir que os técnicos da eficiência - os quais, cegos pelos fins, vêem em tudo instrumentos a usar para a sua prossecução - posterguem da ordem jurídica portuguesa.
Ora o uso ilegal de acendedores e isqueiros é sem dúvida alguma um crime (12) de pura criação legal: na

(9) «Les Courtes Peines de Prison», parte I, in Révue de Droit Pénal et de Criminologie, ano 19.º, p. 372.
(10) Frère, ob. cit., p. 273.
(11) «E então chamaremos delito natural à ofensa dos sentimentos profundos e instintivos do homem social» (Garofalo, Criminologia, 2.a edição, Turim, 1891, p. 9).
(12) Lato sensu - trata-se de uma contravenção. O que aliás se pode discutir. _V p. ex. Dr. Mouteira Guerreiro, «Direito Processual Tributário», in Boletim da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos n.º 22, p. 1736:

O que tudo revela é a dificuldade da construção da figura jurídica da infracção fiscal, certo que se trata de um delito sociedade, à luz da sua ética positiva ou natural, não se pode considerar reprovável (13) o não possuir licença de isqueiro. Parece portanto justificado à Câmara Corporativa que as medidas a tomar contra aqueles que usem ilegalmente acendedores e isqueiros se mantenham livres de toda a incidência de degradação moral.
Poderá suceder que a pena seja assim menos eficiente, mas é sem dúvida mais justa.
Tanto mais que o objecto jurídico da infracção é a protecção da rentabilidade de um imposto - não o do próprio imposto do selo sobre os acendedores e isqueiros, mas mais propriamente a protecção da rentabilidade do regime tributário especial dos fósforos.
Este regime já não é hoje o de um monopólio fiscal, como foi entre nós até 1925, mas o de uma indústria em regime tributário especial, consistente sobretudo num imposto de fabrico, que se pretende seja o mais possível rendoso. Mas parece à Câmara Corporativa em qualquer hipótese exacto que não è justificável a intervenção do Estado que tale na vida económica, designadamente favorecendo, ou impedindo tipos de consumo, com o fim primário de conseguir receitas. Sobretudo, repita-se, quando essa intervenção tente fazer persistir certas formas de consumo e actividade (p. ex., fósforos), impedindo o progresso ou, que seja mesmo, a mera moda de actividades e consumos diferentes (p. ex., acendedores e isqueiros). Então o poder do Estado é usado para impor aos seus súbditos uma verdadeira servidão pessoal, sobrepondo ao interesse geral o interesse particular do Estado- e são coisas distintas. Parecem à, Câmara Corporativa válidos estes princípios não só em doutrina económica e financeira, como em face da nossa Constituição Política, máximo artigo 31.º
A única justificação real do monopólio dos fósforos, diz Pascaud, é a de que ... as pessoas se habituaram já a ele (11); mas em rigor é essa também só a justificação de qualquer forma de protecção tributária da sua venda e consumo.
C) E ainda a natureza de infracção fiscal que reveste o acto de uso ilegal de acendedor ou isqueiro vem ao encontro destas considerações.
E doutrina amplamente dominante entre nós que a multa imposta por infracção fiscal não é em regra convertível em prisão (15). Ora, não vemos qualquer razão
com uma natureza híbrida, toda peculiar, ora a comparticipar da teoria da contravenção, ora da teoria do crime, suscitando sanções que pressupõe ora um ilícito civil, ora um ilícito penal.

Sobre o ponto, ver também Dr. Mouteira Guerreiro, «Em Torno da Infracção Fiscal», in Ciência e Técnica Fiscal, n.08 37 e 38, pp. 117 a 153, e Domingos Martins Eusébio, «Subsídios para uma Teoria da Infracção Fiscal», in Ciência e Técnica Fiscal n.º 55, pp. 107 e seguintes.

(13) A não ser como desobediência a uma lei; mas por este raciocínio qualquer acto ilícito deveria ser punido.-
(14) Pascaud («Les Monopoles d'État et leurs Funestes Consequénces Économiques», in Revue Critique de Législation et de Jurisprudence, ano 52.º, 1903, pp. 416-417):

Nous ne concluons pas à la supression des monopoles des tabacs et des allumettes: le temps nous y a accoutumés, et en matière de finances il faut savoir se garder de toute innovation qui fait table rase du passé si l'on ne peut pas se rendre un compte exact dês conséquences quelle produira dans l'avenir.

(15) Prof. Beleza dos Santos, «Ilícito Penal Administrativo e Ilícito Criminal», in Revista da Ordem dos Advogados, ano 5.º p. 57; Dr. Mouteira Guerreiro, As Transgressões no Direito Fiscal, Viana do Castelo, 1943, pp. 78 a 81; Dr. Manuel Cortes