O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3570 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 142

A esto momento de reacção, sentimental e destrutivo, seguiu-se um momento de reflexão, lógico e construtivo, que deu origem à chamada escola clássica (do direito penal).
Nesta escola clássica chocaram-se pois os mais nobres sentimentos humanitários com a mais fria e muitas vezes desapiedada lógica.
A pena curta privativa de liberdade é o resultado do encontro destas duas tendências:

Da tendência humanitária, que preconizava a abolição das antigas penas cruéis e infamantes e a sua substituição pela pena privativa da liberdade-que, segundo o parecer da comissão revisora do Código Penal Português de 1852, deveria teoricamente ser a única pena.
Mas também do seu orgulhoso logicismo de jurisprudência de conceitos, porque nunca a escola clássica se preocupou em apurar se todas estas penas privativas de liberdade, mesmo quando extremamente curtas, seriam ainda eficazes, cumpririam realmente a sua função social.

O problema da função social, ou da eficácia, ou do fim da pana criminal, foi relegado pela escola clássica para plano muito secundário.
A pena corresponde ao delito como o efeito :i causa; pune-se porque e não para que (teorias absolutas da pena criminal, que. encontraram apoio firme em Kant e Hegel-Koestlin).
Punindo-se porque, o grande princípio a que deve obedecer a pena é o da sua matematicamente exacta adequação à gravidade do delito cometido: o efeito deve corresponder à causa. Um crime muito grave exigirá uma punição muito prolongada; um outro pouco grave, outra pouco prolongada.
E mesmo que o jogo matemático destes princípios se traduza numa prisão de dois dias, esta será de aplicar-se, ainda que não sirva absolutamente para nada.
Já em 1864, em pleno domínio da escola clássica, Bonneville de Marsangy (4) se insurgiu contra as penas curtas de prisão, consubstanciando as suas reflexões na seguinte fórmula: «a pena privativa de liberdade não deveria ser nunca pronunciada quando a pena pecuniária basta à repressão».
A evidência dolorosa deste princípio levou-o a intervir activamente nos Congressos Penitenciários Internacionais de Londres (1872) e Estocolmo (1878); mas sem resultado, devido ao triunfo então absoluto o mundial dos princípios da escola clássica.
Coube à escola positiva um novo movimento humanitário contra o logicismo excessivo da escola clássica.
Acima do crime como ente jurídico abstracto pôs o delinquente real, o uomo delincuente: hominis causa omne ius constitutum est.
Reflexo desta orientação foi o primado dos problemas do fim, função social e eficácia da pena, resolvidos segundo o inegável axioma- de Platão: nemo prudens punit quia peccatum, sed ne peccetur.
O fim da pena não é repressivo, mas preventivo; segundo outra técnica terminológica, toda a repressão (entendida como qualquer reacção da sociedade contra o crime) deve ter fim preventivo. É preciso que a pena seja, não só justa, mas também útil ou eficaz.
E um dos resultados a que quase unânimente chegou a análise positiva dos problemas penais foi o seguinte: Les courtes peines privatives de la liberté sont presque toujours inutiles et même nuisibles (5).
Em suma: a pena curta privativa de liberdade é inútil e prejudicial. A sua eficácia preventiva não está em correlação com os prejuízos que causa.
Neste sentido se pronunciaram, como nota o criminalista espanhol Cuello Calon (6), penalistas como Mittelstadt, Rosenfeld, Franz von Liszt, Heilborn, Vila Miguel, Cuche, etc.; congressos e associações de juristas, como os Congressos Penitenciários de Roma (1883), S. Petersburgo (1890) e Paris (1895), aos quais podemos juntar os de Londres (1925); os Congressos Internacionais da União Internacional de Direito Penal (Bruxelas, 1889, Berna, 1890, Cristiânia, 1891) e os dos Juristas Alemães de Bremen (1895).
Todas estas entidades, juriscientistas e colectividades bonac voluntatis condenaram a pena curta privativa de liberdade e pediram a sua substituição por outras medidas.
Um dos maiores criminalistas desta plêiade, Adolphe Prins (7), resume neste trecho todas as críticas que se dirigiram ao instituto em exame:

78G. Lês peines de courte durée sont onéreuses, car dans tous les pays l'entretien du détenu dans la prison, quelle que soit la perfection du regime pénitentiaire, ne sera jamais un moyen d'amendement ou de régénération.
Elles n'auront pas d'effet intimidant sur les endurcis qui, en général et quand la détention est courte, se trouvent mieux en prison que chez eux.
Elles sont enfin nuisibles aux individus encore doués de sentiments d'honneur, car elles dégradent, découragent le détenu, le rabaissent aux yeux de sa famille et de ses compagnons; elles affaiblissent en lui la notion de dignité personnelle; dans bien des cas elles enlèvent au malheureux sa place ou ses clients et le poussent à l'ivrognerie ou au vagabondage.
L'Etat supporte donc de ce chef des charges lourdes et inutiles. De plus les prisons sont encombrées dune population flottante livrée à un va-et-vient perpetuel qui rent la mission du personnel de surveillance difficile et empêche de fournir un travail régulier aux détenus disposés à travailler.
787. D'autre part, l'Etat a intérêt à réduire le rôle de la prison parce que l'emprisonnement appliqué à ceux pour qui cette peine n'est pas indispensable entame le fonds d'honorabilité et de dignité qui est le patrimoine moral d'une nation.

Parece à Câmara Corporativa particularmente relevante esta parte final.
Cuello Calon (8) acrescenta a estes inconvenientes a corrupção resultante do contacto com os delinquentes e a perda definitiva dos que entram no cárcere possuindo ainda um resto de moralidade.
Edgard Frère resume um artigo seu cheio de interesse (por exemplo, concretiza a expressão «pena curta privativa

(4) Amélioration de la loi criminelle, Paris, 1864, vol. li, p. 251.

(5) Bekaert et Cornil, «Les Courtes Peines de Prison», in Revue de Droit Pénal et de Criminologie, ano 19.º, p. 982.
(6) Penologia, Madrid, 1920, pp. 216 e seguintes.
(7) Science Pénale et Droit Positif, Bruxelas, 1899, p. 467.
(8) 0b. cit., pp. 217 e 218.