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11 DE MARÇO DE 1964 3569

se vê da sua parte final, mal ficaria à Câmara Corporativa não apontar imediatamente qualquer desvio ou violação que a esse preceito se pretendesse fazer.
No entanto parece que, sob este prisma, não sofre dúvida razoável a constitucionalidade do projecto. Com efeito, ele incide sobre «bases gerais de um regime jurídico» - o do uso de acendedores e isqueiros. Que o objecto desse regime jurídico seja de relativamente pequena importância, já não é relevante para o efeito de aplicação do preceito constitucional referido. A Assembleia Nacional é soberana quanto à escolha da matéria que versa legislativamente; só quanto à forma lhe impõe limitações o citado artigo 92.º Esta disposição poderá exigir a revisão de preceitos pesada e minuciosamente redigidos, como o da base II do projecto; mas esse ponto caberá melhor aquando do exame na especialidade.

4. Quanto ao artigo 97.º - Também ao projecto, na sua generalidade, não tem aplicação a proibição contida na parte final do artigo 97.º da Constituição Política. A esse respeito poderiam levantar-se - sem razão - dúvidas em face dos preceitos das bases IV e v; essas dúvidas, analisá-las-emos quando do exame na especialidade.

3.º

Fundamentação axiológica

Quanto ao conteúdo e mérito actual

5. Resta agora a justificação do projecto em face da justiça e do bem comum.
E sob este prisma há dois pontos a considerar: primeiro, quanto ao conteúdo da inovação proposta, e aqui ainda se podem distinguir dois aspectos: o do seu mérito actual - será o regime proposto melhor que o vigente, que se pretende substituir? - e o do seu mérito potencial - não haveria regime melhor ainda, que se lhe pudesse substituir? Em segundo lugar, há a considerar a forma pela qual a inovação se pretende operar - será de alterar-se o regime vigente por meio de lei (em sentido formal) ?
Todos estes aspectos serão considerados sucessivamente no parecer.

6. E assim, encaremos o primeiro: o mérito da inovação tal como se apresenta (independentemente de como se poderia apresentar).
O conteúdo inovador do projecto assenta em dois pontos principais:

A) Alargamento do prazo de isenção a pessoas não residentes na metrópole;
B) Atenuação das medidas previstas contra o uso ilegal de acendedores e isqueiros, sobretudo pela supressão da sua incidência, pessoal.

7. A) Dado que esta finalidade inspira uma única disposição do projecto, a da base IV, reservaremos a sua análise para quando do exame na especialidade.

8. B) A ideia, mestra do projecto, segundo parece à Câmara Corporativa, é a da atenuação, através muito particularmente da supressão da incidência pessoal (1), das medidas tomadas contra o uso ilegal de acendedores e isqueiros. Como tal ideia inspira quatro das cinco bases do projecto (com exclusão apenas da base IV), parece curial examiná-la nesta parte do parecer, reservada à apreciação na generalidade.
Esta linha de orientação é seguida quer quanto às medidas processuais (captura, custódia), quer quanto às próprias penas.
Assim, dispõe o projecto que o não pagamento imediato da multa só envolve captura do infractor em caso de não identificação (base II). Limita-se assim o âmbito de uma medida que, não sendo em rigor uma pena, no entanto se lhe assemelha pela imposta restrição da liberdade pessoal.
E antecipe-se desde já que parece à Câmara inteiramente de aplaudir este sistema. Mas o ponto será retomado quando do exame na especialidade da base n.
Quanto às penas, restringe-se a sua pessoalidade, quer a de origem - as multas aplicadas a funcionários públicos não são elevadas ao dobro (base v) -, quer a de incidência - as multas deixam de ser convertíveis em prisão (base I) e deixam de ter reflexos ou efeitos profissionais ou disciplinares (base III).
Parecem à Câmara de aplaudir sem reservas estas inovações.
Agora, na apreciação do projecto na generalidade, a atenção incidirá apenas sobre o que parece ser o seu objecto essencial: a abolição da incidência pessoal das medidas tomadas contra o uso ilegal de acendedores e isqueiros (2).
A ideia fundamental do projecto parece ser realmente a de limitar a sanção de um delito (contravenção) que lesa unicamente (e só reflexamente) os interesses patrimoniais do Estado, a medidas de natureza e incidência também unicamente patrimoniais. Bastaria este paralelismo lógico talvez para justificar o regime do projecto, mas parece à Câmara Corporativa que ele pode basear-se ainda na seguinte linha de considerações, que se procurará em seguida demonstrar mais pormenorizadamente.

A) As penas curtas de prisão, ou as situações equivalentes, como a custódia, são de evitar na medida do possível;
B) Sobretudo no caso de crimes que poderíamos dizer de pura criação legal, como o que está em causa;
C) E designadamente tratando-se de uma infracção fiscal.

A) Contra as penas curtas de prisão tem-se a- doutrina penalista pronunciado; e ,como a questão interessa neste ponto - a prisão por uso ilegal de acendedor ou isqueiro não pode ir além de dez dias (3) - convém examiná-la com maior minúcia, até porque parece à Câmara Corporativa que a importância do projecto vem menos das soluções em si que dos princípios que põe em causa.
Contra o sistema penal dos tempos antigos, elevaram-se no século XVIII vozes de protesto, entre ias quais se salienta a de Beccaria, em Itália.

(1) Nesta abrange-se a incidência profissional (cf. base III III fine).
(2) Incidência potencialmente pessoal, no caso da conversão da multa em prisão.
(3) 20 sendo o infractor funcionário público - a multa é de 250$ (Decreto-Lei n.º 28 219, de 7 de Junho de 1937, artigo 1.º. § 1.º), elevada ao dobro «se o delinquente for funcionário do Estado, civil ou militar, ou dos corpos administrativos» (artigo 2.º do mesmo diploma, cuja revogação se propõe - base V do projecto) e é convertida em multa a 25$ por dia (artigo 11.º do mesmo diploma, cuja revogação igualmente se propõe - base I do projecto).