20 DE MARÇO DE 1964 3749
cursos económicos que lhe não consintam o acesso à instrução na medida das suas possibilidades.
A execução daquele princípio reveste por esses continentes fórmulas diversas, mas em todas está patente o mesmo objectivo - assegurar aos sem-recursos a frequência escolar que satisfaça as suas legítimas aspirações.
Um dos modos mais praticados e generalizados, e sem dúvida dos mais eficientes e dignificantes, é o crédito escolar, concedido aos que dele carecem mediante "empréstimos de honra".
Infelizmente, é ainda desconhecido entre nós.
Nos Estados Unidos da América - das nações hoje mais evoluídas na instrução a todos os níveis -, apesar de o seu teor de vida ser o mais elevado do Mundo e apesar das extraordinárias facilidades a todos concedidas para a frequência de estabelecimentos de ensino de todos o graus, o presidente Ivennedy decretou, entre as providências destinadas "a assegurar que todos os jovens com qualidades e capacidade para a frequência da universidade possam estudar, se essa for a sua vontade, sem olharem à sua situação financeira", o reforço de vários milhões de contos para o fundo de empréstimo a escolares.
Empréstimo de honra de montante suficiente para a frequência anual de uma universidade e respectiva manutenção aí assegurada. O juro é de 3 por cento. A amortização inicia-se um ano após a conclusão do curso e o total do empréstimo é reduzido a 50 por cento st1 o diplomado exercer o magistério por um período de cinco anos.
Normalmente são satisfeitos todos os pedidos apresentados.
Essa forma, aliada a muitas outras providências de idêntico objectivo, era a solução de que o presidente Kennedy se socorria para garantir aos Estados Unidos a preponderância universal, e não hesitou proclamá-la nestes termos, em 20 de Fevereiro de 1961:
Os nossos progressos como nação não se podem verificar mais ràpidamente do que os nossos progressos na educação.
As exigências do nosso papel condutor no Mundo, a nossa esperança de expansão económica, reclamam que todos os jovens americanos desenvolvam integralmente as suas capacidades, pois os nossos talentos são a nossa maior riqueza.
Isto proclamava o chefe de estado da. mais rica nação do Mundo. Seja-o embora: mais que toda essa riqueza vale a inteligência dos seus cidadãos. Essa é que é preciso cultivar, aproveitar e exportar.
Não se cuide, porém, que o crédito escolar é apanágio do tesouro norte-americano. Praticam-no, sob a forma de empréstimo de honra, a África do Sul, que instituiu duas modalidade - o empréstimo reembolsável e o não reembolsável, indemnizado, aliás, com o exercício da profissão por certo tempo-, a Alemanha Ocidental, com o juro de 5 por cento, a Bélgica, com várias modalidades, a Colômbia, a Dinamarca, onde o concede o Estado e a banca privada, a França, a Finlândia, o Japão, o Luxemburgo, a Noruega, a Suécia, a Suíça, a Jugoslávia, etc.
Consinta-se-me que termine esta citação pela nossa vizinha Espanha.
Na relatividade da sua posição económico-social em face da Europa, afigura-se-me o país de mais larga assistência escolar, nos termos em que a define, a Lei de 21 de Julho de 1960.
Depois de assinalar que todos os espanhóis têm direito a uma educação geral e profissional que não poderão deixar de receber por falta de recursos económicos e de garantir a todos o acesso a uma formação profissional e a um ensino de todos os graus na medida da sua capacidade e mérito próprio, estabelece o fundo de igualdade de oportunidades, destinado unicamente àqueles membros da comunidade que não possuem meios materiais para a frequência escolar e profissional em todos os graus.
A mero título de informação, direi que, em 1963, o investimento daquele fundo foi de 2000 milhões de pesetas, o que equivale a cerca de 1 milhão de contos. Direi ainda que os preceitos legais que regulam a aplicação do princípio da igualdade de oportunidades expressamente registam que ele abrange apenas os necessitados de recursos, e de entre estes a começar pelos mais capazes, e que afasta, frisa-se, a intervenção de toda e qualquer recomendação.
Não obstante o funcionamento deste fundo, aberto a todos os espanhóis sem meios materiais para prosseguirem os seus estudos, a nação vizinha não desconhece o crédito escolar, também sob a modalidade de empréstimos de honra.
Concedem-nos as universidades, concede-os o Estado a filhos de funcionários seus concede-os a mutualidade do seguro escolar.
E Portugal? Como já referi, entre nós é desconhecido o crédito escolar. Não o criou, até agora, o Estado, nem, que eu saiba, o concedem quaisquer instituições privadas.
É verdade que existem bolsas de estudo, e estas dadas tanto por aquele como por algumas destas. Mas a solução quase não tem significado algum no alargamento e na extensão da nossa tão reduzida escolaridade.
Em primeiro lugar, as bolsas de estudo do Estado não atingem a bem modesta verba de 5000 contos, desconhecendo o montante que as organizações particulares lhes dispensam.
Ora, com tão reduzida verba, que extensão escolar poderia obter-se? Só para evitar confrontos, que são altamente desfavoráveis, não mencionarei aqui as verbas despendidas pelos países que acima referi na concessão de bolsas de estudo, a par do crédito escolar.
Mas acontece ainda que as bolsas de estudo são concedidas aos que já frequentam o ensino e sob a condição de serem dos alunos mais qualificados.
Resulta daí que por elas jamais poderão ter acesso à instrução precisamente os que mais necessitariam de socorro e. ajuda, já que tão carecidos são de recursos que nem ao menos puderam ingressar no ensino.
As bolsas de estudo, mesmo no seu reduzido volume, são apenas um estímulo para bons alunos que, embora com sacrifício, puderam já iniciar os seus cursos.
Mas tal providência deixa de fora da sua- alçada os 75 por cento da população portuguesa em idade escolar que por falta de meios materiais nem sequer pôde iniciar o 1.º ciclo do liceu ou das escolas técnicas.
E se aí ficam dos melhores, como não há-de também o rendimento do nosso ensino ser dos mais baixos da Europa, e a que justamente aludia o magnífico reitor da Universidade de Coimbra, como expus?
Até por essa bem fundamental razão importa criar quanto antes o crédito escolar, a ver se por ele ascendem, sem demora e numa primeira fase, ao menos aos institutos médios e às escolas superiores os milhares de portugueses que aí não chegam por lhes faltar em recursos económicos o que lhes sobra em capacidade e vontade.
Essa é uma função do Estado, esse é um dever do Ministério das Finanças, que importará cumprir quanto antes.
Eu confio em que o ilustre titular daquela pasta, o Sr. Prof. Doutor Pinto Barbosa, espírito aberto aos grandes problemas nacionais e cuja inteligência e capacidade de trabalho a Nação vem podendo apreciar na grave emergência que a guerra criou à nossa vida finan-