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3830 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 152

sua industrialização e ainda uma terceira para estudos de mecanização agrícola - esta de flagrante oportunidade. E os seus resultados técnicos podem considerar-se sensacionais, se encarados através dos índices que os traduzem.
Na verdade, a produção de cana por hectare mais do que duplicou no meio século de existência destas estações experimentais, e o seu rendimento fabril, expresso pela relação entre a sacarose entrada na fábrica e o açúcar saído da fábrica, anda à volta de 84 por cento, umas quatro unidades acima da nossa província. Não é, pois, de surpreender que a indústria açucareira sul-africana - como, aliás, a agricultura que lhe fornece a matéria-prima - viva próspera, vendendo o açúcar refinado ao público por metade do valor que nós, na metrópole, pagamos a uma indústria sempre em apuros financeiros, que têm provocado constantes e repetidos aumentos do preço de venda.
Parece-me assim justificada a minha inteira adesão às teses do projecto de Plano Intercalar e não regateio o meu entusiástico aplauso aos seus autores.
Contudo, se nada se me oferece apontar contra outras localizações propostas, ficaria de mal com & minha consciência se não manifestasse aqui a minha inteira discordância com a indicada para a estação experimental da cultura da cana sacarina na Manhiça, em pleno vale do Incomati.
A cultura açucareira em Moçambique, em perfeita coerência, com as condições climáticas, concentra-se entre os rios Buzi e Zambeze, numa área caracterizadamente tropical, situada entre os paralelos 18º e 20º.
Aí, num raio de 100 km, encontram-se, presentemente, três fábricas em plena laboração: Buzi, Marromeu e Luabo, com uma produção autorizada de 215 0001 anuais, (3 que produziram, em 1962, 156 000 t. Servem-nas mais de 25 000 ha de terreno em cultura sacarina. Além de que se projecta, ainda, nesta área, mais uma unidade fabril para 60 000 t anuais de açúcar. E são incalculáveis as áreas de expansão nesta zona de rara fertilidade açu: careira. Até interesses estrangeiros, ambicionando carrear capitais para Moçambique, planeiam estabelecer, entre a actual fábrica de Luabo e Quelimane, mais uma importante unidade açucareira, com a capacidade de 500 000 t anuais - mais do dobro da autuai produção de Moçambique.
E a 1000 km, para sul desta grande zona açucareira da província, situa-se a Manhiça, no vale do Incomati, onde se projecta estabelecer uma nova unidade açucareira de dimensões pouco ambiciosas - 26 000 t -. pois as terras aproveitáveis são já poucas. E a uns 40 km está em plena laboração a fábrica da S. A. Incomati, que em 1962 produziu 30 000 t.
O que equivale a dizer que a área do Incomati constitui uma zona excêntrica, afastada do seu núcleo principal,, u produzindo apenas um sexto do açúcar de Moçambique. Sendo assim, é nesta zona tão excêntrica que se propõe a localização da estação experimental da cultura da cana sacarina? Parece-me, pois, em face desta argumentação insofismável, que esta estação experimental se deve fixar, de preferência, no local mais conveniente, a escolher dentro da grande zona açucareira da província, entre o Buzi e o Zambeze. Assim é que a escolha se me afigura inteiramente acertada.
Sr. Presidente: Besta-me, ainda, para terminar este modesto e despretensioso apontamento ao projecto de Plano Intercalar em debate, acrescentar umas breves considerações sobre a parte concernente ao ensino. E começarei por anotar que é bastante escassa a verba de 220 000 contos que lhe foi atribuída. Não basta, para valorizar um país, concretizar as suas riquezas potenciais de solo e subsolo.
De nada valerá todo esse esforço ingente, se não for acompanhado da indispensável valorização espiritual, moral e mental do Homem. Ele é, na verdade, em parte, uma criatura económica, animal; mas é também, e sobretudo, «uma criatura espiritual, com necessidades e desejos espirituais». Mais: «essas necessidades e desejos reflectem a faceta superior da natureza humana, tomando, por isso, precedência sobre as necessidades económicas». E a primeira obrigação de um pensador político é compreender o Homem.
Por isso eu direi que precisamos, com a maior urgências de criar ao ensino, em Moçambique, condições materiais que lhe permitam cumprir, com relativo desafogo e um mínimo de comodidades, a sua nobre missão de lusitanidade naqueles territórios portugueses das margens do Índico.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O professor e o missionário deverão ser, na grave conjuntura ultramarina da hora presente, as duas mais poderosas alavancas de difusão de portuguesismo em África. Na verdade, o missionário continua a ser o maior de todos os colonos, pelo total desinteresse material da sua missão divina, pela perfeita integração na maneira de ser e de viver das terras e das gentes que evangeliza, pelo alto padrão da sua cultura científica e técnica e, até, pelo seu indiscutível patriotismo.
Por isso, o professor e o missionário poderão ser os grandes agentes da tão decantada acção psicossocial, se lhes derem condições materiais de trabalho eficaz e proveitoso. Há lá nada que valha a «promoção social» - como agora se diz tão pomposamente - feita no silêncio e na modéstia dos nossos estabelecimentos de ensino, primários e secundários, por professores de rara abnegação docente, que, apesar de muito mal pagos, fizeram da sua nobre profissão um verdadeiro sacerdócio?
Pois não é verdade que são os nossos estabelecimentos de ensino, de norte a sul da província, verdadeiros laboratórios pedagógicos, onde se deparam tipos humanos dos mais variados cambiantes psicológicos e morais e das mais desencontradas tonalidades afectivas, étnicas e sociais? Já alguma vez os censores empertigados do trabalho escolar em terras de África teriam pensado, escassos minutos embora, no que representa de argúcia psicológica, de flexibilidade espiritual e de abnegação profissional, a tarefa ímpar de um professor em terras de África, com turmas por vezes de 50 alunos, das mais variadas etnias, a maior parte dos quais são falam a língua pátria no ambiente escolar?
Por isso lhes poderemos chamar, com inteira propriedade, os verdadeiros obreiros da portugalidade em terras do ultramar, pois são eles quem primeiro modela a plasticidade espiritual, moral e mental daquela mocidade enflorada de anseios e aspirações indefinidas, transformando-a, no silêncio da sua escola, em portugueses de alma e coração.
Precisamos, pois, com a maior urgência, de olhar a sério para a situação angustiosa em que se trabalha em certos estabelecimentos de ensino da província, à cabeça dos quais é de inteira justiça colocar a Escola Comercial dê Lourenço Marques, cuja frequência, no ano lectivo em curso, é três vezes superior à capacidade das suas instalações. Aqui, sim, pode bem dizer-se que o apostolado do seu corpo docente tem conseguido realizar um perfeito «milagre pedagógico».