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25 DE NOVEMBRO DE 1964 3877

que foi decretado nesta matéria recentemente? Já uma vez referi o dito do velho sapateiro da minha Braga: ou haja moralidade ou senão comemos todos.
Sr. Presidente: As verbas consignadas no Plano Intercalar de Fomento para os objectivos que, quanto ao sector agrário, o mesmo se propõe, são mais do que insuficientes e parece-nos, que deviam ser reforçadas, mesmo com prejuízo de outras de indiscutível menor projecção na economia nacional.

O Sr. Costa Guimarães: - Muito bem!

O Orador: - Deve pois a Assembleia, quanto a mim e sei que como eu pensam outros Srs. Deputados, alterar nesse, sentido algumas das bases do projecto, o que eu mesmo oportunamente proporei, se outros, com mais autoridade, o não fizerem, o que aliás, espero, não sucederá.
Reconhece-se a necessidade de efectuar a chamada revolução mecânica, revolução a que a lavoura não tem sido refractária, pois que só o parque de tractores da mesma, de 1958 a 1962, duplicou. Posso afirmar que no Norte, de 1962 até esta data, o progresso neste campo é enorme. O que demonstra bem que o lavrador fez o que lhe foi possível fazer, nada no entanto do que seria preciso, pois não tem possibilidades, pelo que se esperava que neste Plano fosse estabelecida, para a motomecanização, verba que não fosse, como a que lhe foi atribuída, mais que insuficiente, para não dizer ridícula.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Não gosto de interromper os oradores, mas, se V. Ex.ª me permite, faço-o agora excepcionalmente, para dizer que lhe assiste toda a razão, como tem assistido a todos os que nesta Assembleia se tem ocupado da incontestável e gravíssima crise da lavoura. Não pode haver duas opiniões a este respeito, e todos entendemos que é mister resolver urgentemente o problema.
Porém,, não é possível, é mesmo contraproducente; vencer a crise ou sequer atenuá-la com o aumento do preço da venda dos produtos ao consumidor, como parece ser pretendido por V. Ex.ª e outras pessoas que se têm manifestado.
Ora, a mim, como a muitos, afigura-se que, excepto em casos muito excepcionais que se imponham, tal solução nada resolve, antes pode agravar o problema, pois que se restabelece o círculo vicioso. Sim, aumentam os preços, aumenta, como é óbvio, o custo da vida, com todas as trágicas consequências que é desnecessário enumerar. E daqui não sairíamos.
O que é indispensável é criar cooperativas- em grande número e lutar por todos os meios contra os intermediários, fazendo, sempre que possível, levar os produtos directamente à mão do consumidor ou, em último caso, à do retalhista. E é sobretudo indispensável diminuir o custo da produção, pela baixa dó preço dos adubos, das sementes e dos transportes, pelo barateamento da maquinaria agrícola, seja melhoria dos métodos da cultura, já que não é possível a baixa dos salários e é difícil a luta contra a emigração.
Por vezes, colhe-se do que se diz e escreve a impressão de que a gravidade desta crise e verifica só em Portugal, quando é certo que ela existe por toda a parte. Basta
Lembrar como exemplo o que se passa em França, país de solo rico, onde a lavoura faz greves e barricadas, e na Alemanha Federal, onde o Chanceler Erhard se referiu muito especialmente a ela, no notável discurso da sua posse.

O Sr. Sousa Birne: - Aí é que está a grande gravidade do problema.

O Orador: - Sinto-me profundamente honrado com a intervenção de V. Ex.ª, mas quero dizer-lhe o seguinte:
Como V. Ex.ª verá, não defendo que a resolução da crise agrícola esteja só na elevação de preços e entendo que os mesmos têm que ser controlados. E até aproveito a oportunidade para trazer aqui uma conversa que há dias tive com um destacado elemento da oposição, o qual me dizia: «Vocês podem ter o orgulho de manter a moeda no alto nível em que ela se encontra».
Sei muito bem que o valor da moeda tem de ser defendido. Mas não compreendo que esse critério de defesa da moeda só se estabeleça em relação à agricultura e não em relação a outros sectores.
V. Ex.ª vai ver que nas minhas considerações digo que, para já, não há outro meio senão elevar os preços.
Referiu-se V. Ex.ª à Alemanha e à Franca, mas a agricultura nesses países, principalmente na Alemanha, está a ser fortemente subsidiada pelo Estado: é o chamado «plano verde», através do qual são dados subsídios para a compra de máquinas, de sementes, etc.
Ora o que eu gostaria é que este nosso Plano de Fomento desviasse para a agricultura as verbas necessárias e não algumas que são perfeitamente ridículas, para que a lavoura pudesse defender-se desses tais parasitas a que V. Ex.ª se referiu e pudesse aperfeiçoar-se tecnicamente. Gostaria que se encarasse de frente, como está a acontecer na vizinha Espanha, a criação de técnicos, a educação dos lavradores. Há tempos em Orense vi o governador civil respectivo a presidir a uma reunião de lavradores em que se estabeleceram cursos nas freguesias.
Sobre cooperativismo, posso dizer a V. Ex.ª que sou presidente de uma cooperativa de leite. Pois, apesar de termos uma administração rigorosíssima - nenhum de nós é remunerado, todos exercemos voluntariamente e gostosamente a nossa função -, mesmo assim, não conseguimos pagar ao produtor o mínimo necessário para que ele possa continuar a produzir leite. Logicamente, de mês para mês baixa a produção de leite no meu concelho e na minha região.
Repito: não sou dos que consideram que só a elevação dos preços pode resolver o problema, mas entendo que é necessário por igual socorrer a lavoura com técnicos, com a educação dos lavradores, que não estão preparados para receber os ensinamentos dos técnicos, e - chamemos aos bois pelo seu nome - com dinheiro, sobretudo com dinheiro, porque a lavoura não o tem, para que os lavradores possam mecanizar a sua agricultura e comprar sementes.
Finalmente, quero dizer a V. Ex.ª, que é dos mais ilustres membros desta Câmara e que eu muito admiro, que na minha casa, quando eu era pequenino, aos serões, meu pai lia-nos os discursos que V. Ex.ª proferia naquela tempestade em que aqui se debatia.
Só mais esta nota: ainda há pouco tempo um vizinho meu, a quem eu aconselhava a fazer a cultura dos milhos híbridos, dizia: «Pois é, mas eu não tenho dinheiro para pagar as sementes!». E fui eu que lhe paguei as sementes - perdoe-se-me a referência.