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1028 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 58

em lugar de, como seria aconselhável, gerar políticas protecciomstas das actividades agrícolas, reformas de fundo com vista à fixação daquele nos meios rurais, pelo contrário parece não estar a ser prezado nas suas consequências mediatas, permitindo-se que a terra se vá desguarnecendo, a lavoura se vá esgotando, arruinando e desfalcando dos valores que lhe são necessários e ancestralmente lhe dedicaram todo um labor em cuja base assenta o êxito de qualquer ordenamento económico e social.
Alheados, andam os governos acorrentados à técnica e, em lugar de se procurar tornar a terra mais produto a e compensador o trabalho dos que a servem, estudam-se métodos para contrariar a Natureza e impedir a multiplicação dos homens. Aos poucos, a técnica vai absolvendo e desumanizando o homem, sacrificado ao seu império, no delírio da industrialização, que a tudo se sobrepõe, porém, sem pão, espiritualizado ou não o homem, este não poderá sobreviver, não poderá sequer servir aquela, e a máquina, por mais perfeita que seja, não o dispensará como peça fundamental da engrenagem que a materializa. A máquina nunca funcionará sem o homem, porque este, mesmo que só interesse como peça, elemento adjuvante daquela, é imprescindível ao seu trabalho e eficiência.
E sem pão não há homens sem homens não havei á máquinas, bem máquinas, consequentemente sem pão, não haverá indústrias, não haver á segurança, ordem, paz social, não poderá haver mesmo nações.
O homem precisa de comer.
Tal realidade impõe-nos um volver de olhos para a sua tradicional fonte de sustento, a teu a, de que há-de brotar o essencial da na alimentação, a força motriz do potencial necessário ao cumprimento das tarefas por que se reparte e das quais é sempre elemento fundamental, seja qual for o ramo da actividade em que se integre.
Ora, entro nós, de há muito que a economia se vem estruturando nas actividades agrícolas e a nossa própria consciência de povo se foi afeiçoando a ideia - hoje considerada obsoleta- de que éramos um país essencialmente agrícola. O conceito, fortemente arreigado, fez carreira, tornou a teria em objecto de ávida procura, a bua posse tornou-se sonho de muitos e em alvo de inveja de outros, a tal ponto que a sua distribuição se preconizava como motivo de propagandas políticas com vista à adesão das massas, apresentando-se a sua detenção como um criminoso privilégio de classe gerador de perturbações sociais.
Todos a desejavam como símbolo de riqueza, era nela que se procurava a tranquilidade e conforto da velhice, a estabilidade dos patrimónios familiares, dedicando-se-lhe em todas as legislações uma regulamentação jurídica especial no reconhecimento de, que ela era um valor a salvaguardar, o fulcro das próprias sociedades humanas.
Assim, os caracter se, finam afeiçoando à terra e esta, insensivelmente foi moldando a alma do povo.
E como a alma dos povos se não arranca nem se muda de um momento pata o outro ao sabor de concepções novas ou mesmo por imperativo das necessidades de determinado momento, daqui o continuarmos sendo ainda, por impulso de uma tradição que do longe nos comanda, quer se queira, quer não, um povo essencialmente agrícola, fortemente emaizado na teria, de que ainda vivem milhões que, se empobrecerem ou sucumbirem, inexorável e fatalmente empobrecerão e farão sucumbir as indústrias a que fornecem o braço robusto e de que são mercado valioso, mercado necessário, no seu revigoramento e expansão.
Não obstante.
A terra vai estando cada dia mais abandonada e despojada de braços válidos, mercê de razões valias, entre as quais a todas sobreleva a manifesta impossibilidade de aquela poder proporcionar níveis compatíveis com as exigências crescentes do modo de viver dos nossos tempos e de poder concorrer na retribuição do trabalho que em mitras actividades se paga por melhores preços que a lavoura não pode acompanhar por deficiente valorização dos seus produtos, muito aquém do custo da produção.
O facto favorece e incita a velha tendência das gentes dos campos, mais acentuadamente nas que se fixam no Norte, de se deslocarem em busca de melhores condições de vida, seduzidos pela oferta de melhores salários, uns, outros na mira de melhores possibilidades de educação e colocação dos filhos, outros ainda atraídos pelo aliciante dos grandes meios Na terra, nos meios rurais, não se podem educar nem colocar os filhos, não se enriquece, não se passa da «cepa torta», nem só goza. As facilidades de comunicação, a procura de mão-de-obra pelo estrangeiro, acrescentaram aos males do urbanismo o mal maior da emigração a processar-se em volumes aterradores.
Urbanismo e emigração, numa autêntica sangria, estão despojando, aos poucos, a terra do potencial humano que a vivificava e sustinha. O mal foi crescendo sem que nada se fizesse para o entravar. Permitiu-se, pelo contrário, num alheamento evidente do fenómeno rural em que se não criavam condições de fixação, a deslocação e a saída de muitos, sempre dos melhores, na ideia de que a falta de concorrência nos trabalhos da lavoura contribuísse para a melhoria dos salários dos que ficavam. Assim, num desconhecimento incrível das realidades da terra, criou-se a mentalidade de que a lavoura podia, estava próspera, e por isso lhe cumpria a elevação do nível de vida dos que a serviam E porque o proprietário da terra, numa atávica tendência, está sempre disposto a dar por cia a última gota do seu sangue, deixou-se-lhe o encargo de por si só resolver o problema da melhoria dos salários dos seus servidores sem que correlativamente se promovessse a valorização dos produtos que haveriam de permitir-lhe os investimentos e a melhor retribuição daqueles.
Aquele tem quintas no Douro, aqueloutro tem herdades no Alentejo podem, que repartam com os trabalhadores a riqueza que guardam e acumulam com ofensa dos direitos de todos, num jeito tradicional do olhar o detentor dos chamados «bens ao luar» como usurpador a quem é legítimo sugar o suor e o próprio sangue.
Evoluíram os tempos O agravamento das condições de vida na terra afugentou os que a serviam, e, muito legitimamente, começaram n olhá-la com hostilidade, a tal ponto que nem a preconizada e reclamada sua distribuição serviu os fins de apaziguamento social que a determinou, pois as massas não desejavam a terra para a trabalhar e fazer produza como instrumento de vida económica, mas sim para a usufruir como senhores na posição dos que a desfrutavam e em quem, dentro do entendimento que se generalizou, não descobriam como razão fundamental do seu apego o amor, a ti adição, que lhes impunha conservá-la e continuá-la. E, deste modo, na teimosia daqueles que o sentimento, e quase sempre só este, prende às terras que foram de seus pais e avós, aos poucos se foi empenhando e afundando, hipotecada, maltratada, a resvalar para o abandono.
Num autêntico suicídio, luta na esperança de melhores dias, vai suportando os maus anos, paga preços mais elevados em troca de menos horas de trabalho e aos piores Paga os adubos mais caros, as alfaias, os géneros alimentícios e tudo de quanto carece para a manutenção do giro da sua actividade Paga pontualmente as férias.