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1050 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 59

cer, em todo o caso, que outros, muito melhor do que eu, o saberiam fazer)) exactamente o de se ir pensando na solene celebração do centenário do nascimento de Calouste Gulbenkian, a ocorrer, como já disse, no próximo ano de 1968.
Sem ser intenção do conselho de administração da Fundação de Calouste Gulbenkian promover a elaboração de "uma biografia com o nível e a dignidade que uma obra de tal natureza deve ter paia não diminuir ou até ofender a memória do biografado" Vou mais longe não é apenas intenção, mas também preocupação. Louváveis intenção e preocupação, e louvável atitude. E, certamente estarão algumas atenções já voltadas para a tarefa - uma tarefa que deverá ser levada a cabo por inteligência não traída pelo coração e por coração não traído pela inteligência mesmo porque a personalidade do biografado suportará bem a cobertura que lhe seja dada na biografia pela incondicional imparcialidade dos juízos da história. Uma tarefa que deverá, pois, ser bafejada pela virtude exornante dos historiadores dignos de transportar o passado para o presente - e o passado e o presente para o futuro -, em termos de a verdade surgir diáfana, pura, sem exageros de espécie nenhuma que perturbem as perspectivas exactas a que deve ser observado hoje e vindouramente esse que todos temos como enorme vulto humano, vulto para o qual, em todos os casos, desejaremos que o veredicto da história dê a palavra de conformidade homenageante sobretudo porque justa.
É que prezados colegas Calouste Gulbenkian é detentor de um nome que lhe deu honra por herança, o que ele honrou por sua vez- o que tudo se confirma pelo que fizeram seus pais, Sarkis e Dnouhi, que a Arménia venera como que em termos de santos, e pelo que Calouste fez, no prosseguimento da obra paterna, tornando-se, como filho mais velho do casal ilustre, herdeiro da tradição familiar - uma tradição de gente abastadíssima que encontrava o seu melhor prazer em fazer bem pelas mais variadas formas.
E que a tradição familiar Gulbenkian, no capitulo filantrópico tem um impressionante fascínio, disso se tua testemunho do que disse um biógrafo dos pais de Calouste.

A sua modéstia só era igualada pela sua infinita bondade, levavam uma vida toda devoção e abnegação

arkis, o pai, era de uma simplicidade exemplar Homem de fortuna, tinha horror à vaidade e à ostentação, não obstante o calor de Constantinopla e o rigor dos seus Invernos, ele ia tranquilamente a pé, com qualquer tempo, paia os seus escritórios.
Ao meio-dia fazia, no próprio gabinete, uma refeição simples, quase sempre composta de um pouco de queijo, de um pouco de pão e de um cacho de uvas.
Não era por avareza que ele levava esta existência de uma simplicidade legendária, pois não recusava nada às pessoas que o cercavam - e era só ele que se privava de todo o supérfluo.
Dir-se-ia um enviado do céu que se consagrava inteiramente à sua missão de benfeitor, sacrificando-se completamente à obra que havia empreendido.
A morte desta nobre figura e de sua santa esposa foi para o povo arménio um luto, cuja memória se conserva no coração de todos em reconhecimento e bênçãos.

Foi assim que um biógrafo sintetizou em beleza o perfil daqueles de que Calouste nasceu, tudo a dizer-nos que aqui se dá a magnífica circunstância de o detentor
de um nome pleno de nobreza - detentor que se chamou Calouste- ter sido honrado por havê-lo herdado, e tê-lo honrado pulo lustre que lhe foi juntando, nisso residindo sem dúvida o mais belo traço que pode desejar-se na ligação do nome familiar de quem deu a herança e de quem a recebeu.
Isto é Calouste Gulbenkian com ter herdado um nome cheio de nobreza, honrou-se amplamente com isso mas acrescentou a esse nome novas e preciosas pedras de enobrecimento.
Os limites morais e materiais de uma biografia dedicada à figura enorme de Calouste Gulbenkian não abrangerão apenas a vida deste. Terão de demonstrar pelo menos à vida dos seus progenitores. E porque a essencialização das vidas que se continuam terá os seus tempos de pesquisa e de lançamento à letra de forma para completa edificação dos espíritos daqueles que se debrucem sobre tal essencialização - a fim de o próprio pormenor não destruir a visão larga de condutas humanas que se marcam por se ter o pé em tema e os olhos no céu-, porque assim é, bem me parece que não teremos essa biografia de Calouste Gulbenkian tão cedo, talvez nem menino em 1968, o que se é louvável pelo carácter que a ela se pretende imprimir, tal não deva constituir impedimento a que nesse ano de 1968 - e em comemoração do centenário do nascimento do patrono da Fundação - apareça, mesmo em forma sinóptica, o que poderíamos desde já chamai "A história maravilhosa de um homem grato às virtudes da hospitalidade" a que se juntaria outra que poderia chamar-se "A história maravilhosa das virtudes da hospitalidade"
Duas histórias maravilhosas que em volume pequeno, sugestivo e posto ao alcance de todos os portugueses, no País e nos vários núcleos dos portugueses radicados no estrangeiro (tão portugueses, eles, como nós cá de dentro), dissessem como tudo se passou desde que por alvores de 1942, quando, estando praticamente toda a Europa em fúria, chegou aos arredores de Lisboa, sem alardes -talvez com o espanto no rosto e na alma - um casal que finalmente repousava dos tormentos que faziam estremecer as terras donde vinham fugindo o casal Calouste e Nevarte Gulbenkian.
São esses os votos que formulo, a par de formular a minha homenagem ao nome de Calouste Gulbenkian, à sua Fundação e a todos os que estão cumprindo religiosamente as determinações testamentarias daquele vulto que está continuando a ser legenda de benemerência da mais fina estupe!
Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Satúrio Pires:-Sr. Presidente. Ao iniciar as minhas intervenções no presente período legislativo, quero renovar a V. Ex.ª os mais respeitosos cumprimentos aos meus ilustres colegas as mais cordiais saudações e formular as preces mais sentidas paia que Deus continue a proteger Portugal e a iluminar os Portugueses nesta caminhada cheia de perigos, mas também de certezas, que todos estamos empreendendo de olhos fixos no futuro.
Não nos desconcertam os desvarios do Mundo mergulhado no selvático jogo de
interesses materiais, ou na fraqueza, ou no desânimo, ou na ignorância, ou no ódio cego, ou na inveja, ou na fome de espírito ou de pão.
Somos de novo guias de justiça e humanismo