16 DE NOVEMBRO DE 1967 1727
Efectivamente, as considerações então produzidas, associadas às que soube terem sido anteriormente feitas nesta Assembleia sobre o mesmo assunto, mas em sessão a que não assisti, e as que li na imprensa no princípio deste ano fizeram-me nascer a ideia da oportunidade de uma intervenção para desfazer algumas ideias erradas e corrigir conceitos defeituosos, apenas com o único intuito de tentar esclarecer melhor uma situação que tem sido fortemente atacada e por vezes através de linguagem puramente demagógica.
É evidente que para o consumidor, seja de que artigo for, é sempre, bastante, desagradável verificar um aumento no preço do que compra, e bom seria que essa situação não tivesse de se registar, como se regista, com os mais diversos e variados produtos. Quer se trate de comércio, de indústria, ou de simples prestação de serviços, sempre que há alteração, ou pelo menos alteração sensível, nas componentes que formam o preço de custo, só por milagre o correspondente preço de venda não teria de vir proporcionalmente alterado.
É uma verdade evidente que não deixa de se aplicar à actividade seguradora, seja ela considerada como comércio, indústria ou prestação de serviços, pois em qualquer desses grupos a sua inclusão encontra razões defensáveis. E não parece de forma alguma aceitável uma discriminação colocando o negócio da venda de segurança em pé diferente do das restantes actividades.
Dentro do caso específico dos seguros de automóveis, que tanta celeuma levantou neste ano de 1967, parece pretender ignorar-se que constituem uma autêntica tragédia para os seguradores, tomados mesmo ao nível internacional, e em consequência do maior peso das incidências que provocam a sinistralidade como, por exemplo, a crescente graduação das indemnizações de responsabilidade civil, o aumento da densidade de tráfego, a construção de melhores estradas convidativas às altas velocidades, a construção de carros cada vez mais velozes e mais leves, o alargamento da utilização das viaturas automóveis às mais diversas camadas da população sem contrapartida num aumento sensível da sua educação cívica, além, quando se trata da fase das reparações, do aumento que tem incidido no custo da mão-de-obra das oficinas, dos materiais a utilizar e dos acessórios a substituir.
A ideia generalizada de que as seguradoras são ricas e que a exploração dos ramos lucrativos pode ou deve contrabalançar a exploração do ramos deficitários é inteiramente errada, e o que na realidade se verifica é que as mesmas se encontram até a trabalhar em condições marginais insustentáveis. Para documentar esta afirmação bastará referir que na província de Angola, onde a rentabilidade tem sido melhor do que na metrópole, no exercício de 1965 os resultados líquidos, tomado o conjunto das 30 seguradoras ali existentes, significaram apenas 6 por cento das receitas global do prémios, enquanto no ano seguinte, em ]966 não ultrapassaram 3.9 por cento.
Em valor absoluto, posso referir que a situação se traduziu, números redondos, pelo lucro líquido de 9000 contos numa venda global de 225 000 contos, números altamente desencorajantes para qualquer comércio, indústria ou prestação de serviços. Sei que mi metrópole os resultados industriais da actividade seguradora geral foram de 0,47 por cento no ano de 1965 e negativos em 1966.
Suponho que aquela ideia de as sociedades de seguros arrecadarem grandes lucros provém, em grande parte, da confusão existente entre liquidez financeira e lucros propriamente ditos.
Pela natureza especial da sua actividade, as seguradoras têm grande movimento de tesouraria, podendo acumular fortes valores financeiros, os quais, porém, não são lucros de que possam dispor, mas apenas representam um elemento patrimonial activo. E através do mesmo que mantêm o indispensável desafogo de caixa e podem constituir, ano sobre ano, as necessárias reservas técnicas para garantir o futuro pagamento de obrigações contratualmente diferidas no tempo.
Acontece, por isso, frequentemente, uma seguradora dispor no seu activo de milhares de contos e, no entanto, se ver impossibilitada de distribuir qualquer dividendo aos seus accionistas por não ter lucros na conta de resultados.
Ainda por idêntico erro de interpretação, a maioria das pessoas que, a cada passo, encontram por Lisboa fora placas assinalando grandes prédios como propriedade das diversas 80 companhias de seguros que actuam no escasso mercado nacional formam a mesma errada ideia de enorme prosperidade dessas companhias. E que essas pessoas não se lembram ou ignoram as enormes responsabilidades que as sociedades de seguros contraem diariamente sobre o futuro, no que, respeita em especial ao pagamento de capitais de seguros de vida, rendas vitalícias, e pensões. Poderá, assim, fundamentalmente, dizer-se que tais prédios não são património das seguradoras, mas sim dos segurados, pois significam a representação material das reservas constituídas precisamente para salvaguardar a solvência e possibilidade futura de, no prazo marcado, as sociedades de seguros cumprirem o pagamento devido aos beneficiários indicados nas respectivas apólices.
Por isso essas reservas são do constituição obrigatória e aplicação determinada, não lhes servindo quaisquer valores e ficando sujeitas à prévia aprovação do Governo, através da Inspeccão-Geral de Crédito e Seguros. E assim, como se pode até verificar através da leitura do III Plano de Fomento, em apreciação nesta Câmara, que as companhias de seguros se manifestam como elemento muito válido no crescimento económico do País, pela subscrição de títulos de crédito e tomada de obrigações da dívida pública do Estado. Provavelmente, o conhecimento generalizado de que são compradores habituais destes títulos tem também contribuído para a formação da errada ideia sobre a sua prosperidade, não se atentando que tais compras não são feitas em função de lucros, mas da constituição obrigatória de reservas a caucionar responsabilidades assumidas.
Por todas estas razões, a actividade seguradora está envolvida por diversos condicionalismos legais, apresentando a característica extraordinária de os seus preços de venda serem tabelados oficialmente como preços mínimos, como preços que a própria lei condena se forem diminuídos. Trata-se de uma actividade tão específica que o legislador, na defesa dos segurados, não permite que uma concorrência desregrada leve as seguradoras a praticar preços inferiores a um mínimo tecnicamente estabelecido, evitando, assim, que uma ânsia de procura de negócios a qualquer preço conduza afinal à impossibilidade futura, quando os prazos dos contratos findarem, de os beneficiários poderem receber o que lhes foi garantido aquando da emissão das correspondentes apólices de seguro.
No que respeita aos seguros do ramo "Automóveis", embora bastante diferentes, não deixam de actuar as mesmas características e condicionalismos que apontei, em especial, para os seguros pessoais, e que têm aqui também inteira justificação.
Não se pode assim dizer que as seguradoras gozam de protecção, pois a única protecção que existe respeita