2032 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 108
Por ser ainda cedo para se colherem os resultados deste diploma ou por outras causas, o certo é que, mesmo nos trabalhos preparatórios e no próprio projecto do Plano, bem como em estudos e declarações vindos a público, continuam a registar-se deficiências e erros estatísticos susceptíveis de originar convicções e interpretações falseadas.
As lacunas existentes agravam-se pela falta de cuidado que, tantas vezes, caracteriza a publicação de elementos estatísticos não procedentes do Instituto Nacional de Estatística. Defeituosa, inadequada, incompleta ou errada, por vezes, a sua apresentação está a causar perturbações em espíritos cultos e na opinião pública.
Para esta situação contribui também a propensão quase doentia de alguns para minimizarem ou negarem os progressos do País, nas suas diferentes actividades, e para procurarem, nas estatísticas, números que, de qualquer maneira, ajudem a fundamentar as suas opiniões negativistas.
Por outro lado, até individualidades e funcionários qualificados e organismos responsáveis sentem uma tentação irresistível para manipularem ou manejarem as estatísticas com uma volúpia e um desembaraço que só encontrarão paralelo na leviandade de que, inequivocamente, dão testemunho.
Temos, para nosso mal, muitas e grandes lacunas no domínio económico, social e educativo, que devem ser apontadas com verdade e desassombro, a fim de se instaurar ambiente propício à sua colmatação - passe o italianismo de sabor jurídico. Não se descortina, todavia, a menor vantagem - bem pelo contrário - em distorcer a realidade ou cair em exegeses precipitadas, como quem se compraz em descobrir apenas os aspectos negativos, ou em exagerá-los ou idealizá-los para se tentar provar que, em tudo, somos dos países mais atrasados. Velha pecha esta de nos denegrirmos e diminuirmos aos nossos olhos e aos alheios! Perigosa ingenuidade, ou maldade, a de se aceitarem ou difundirem, sem o menor exame crítico, números estatísticos e comentários sobre eles, inexactos ou incompletos, provenientes, por vezes, de sectores e pessoas sem idoneidade científica ou maturidade de espírito, quando não ao serviço de ideias e políticas antinacionais.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - À confusão em que a este respeito nos debatemos nem sequer escapam textos oficiais ou oficiosos de que constam, não raras vezes, elementos estatísticos deformadores da verdade das situações ou dos factos.
No decurso das reuniões da Comissão Eventual, foi este um dos assuntos mais ventilados, e apontaram-se então múltiplos exemplos comprovativos da necessidade de se redobrarem os esforços e cautelas para obviar a tais anomalias. Urge se confiem, de modo efectivo, ao Instituto Nacional de Estatística os poderes e os meios indispensáveis ao cumprimento das complexas e melindrosas tarefas que lhe pertencem, e se submetam, na matéria, à sua disciplina coordenadora e correctiva, os diferentes sectores, que, ao menos, deviam ser mais prudentes na recolha dos dados estatísticos e abster-se de os publicar sem a autorização expressa daquele organismo.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Uma falha, um erro ou uma simples desatenção, neste terreno tão delicado do ponto de vista técnico e político, podem ocasionar - e têm ocasionado - inconvenientes lamentáveis e deturpar as próprias previsões e objectivos da acção governativa e do planeamento económico e social. Para comprovar a asserção, aludirei a uma inadvertência - e muitas outras poderia mencionar - que foi causa de um lapso do Plano Intercalar e, segundo penso, se reflecte ainda no projecto do III Plano. A ele me referi já, nesta Assembleia, na minha intervenção de 14 e 15 de Dezembro de 1965, quando, ao apreciar o problema habitacional, procurei determinar as carências de alojamento.
Na verdade, é corrente confundir-se o número de moradias construídas com o número de licenças de construção ou de utilização de fogos passadas pelos municípios. Os elementos do Instituto Nacional de Estatística traduzem apenas este último número, no qual não se inclui, por isso, o dos fogos, cujo licenciamento não é obrigatório. Assim, o Instituto Nacional de Estatística, partindo, sobretudo, do número de habitantes das zonas em que as construções não ficam sujeitas a licença, tem feito intervir, como se impunha, o coeficiente de correcção de 38 por cento no número apurado das moradias cuja construção ou cuja ocupação depende de autorização camarária. E isto sem tomar em conta, sequer, o volume da chamada construção clandestina, que deveria tornar bem mais expressivo aquele coeficiente.
Daqui adveio que, nos estudos preparatórios do Plano Intercalar de Fomento, os números relativos à construção de casas foram inferiores aos reais em 38 por cento, pelo menos 1 Havemos de concordar que não se trata de pequena falha. O Plano Intercalar inseriu, entre os objectivos de edificação de casas pelos sectores público, semipúblico e privado, a construção de 34 000 fogos anuais. Repare-se que o projecto do III Plano prevê a construção de 41 000 fogos anuais, isto é, de 250 000 fogos no sexénio, o que leva a crer ter-se caído de novo no mesmo equívoco.
Com efeito, nos dois primeiros anos do Plano Intercalar - 1965 e 1966 - construíram-se, segundo elementos obtidos no Instituto Nacional de Estatística, pelo menos 46 700 e 48 600 moradias e, em 1967, não deve esta actividade baixar de ritmo, apesar de o sector público e semipúblico não ter podido atingir, como, aliás, logo seria de prever, a estimativa de construção feita no mesmo Plano. Dir-se-á agora que a execução do Plano Intercalar foi além da estimativa que no capítulo de construção de habitações constituiu o seu objectivo. Mas sabia-se que essa previsão pecava por defeito em, pelo menos, 38 por cento, como aqui na Assembleia se disse e agora volta a dizer-se relativamente ao projecto do III Plano de Fomento. Na verdade, se se tiver em conta a taxa anual de acréscimo entre 1960 e 1966 (4,6 por cento), na construção habitacional, deverá prever-se a edificação no período do III Plano - 1968-1973 - de 350 000 fogos, aproximadamente. Ora, o Governo insere como objectivo do Plano a construção de 250 000 fogos, o que se deve, segundo é de presumir, a ter-se cometido novamente o mesmo erro de partida na interpretação dos elementos apurados, calculados e publicados pelo Instituto Nacional de Estatística.
Imagine-se a repercussão que o facto poderá ter nos aspectos financeiros e nas próprias medidas de política do planeamento no capítulo da habitação!
Além disso, se, com base em tais previsões, se fizerem confrontos com os objectivos inscritos nos programas habitacionais de outros países, hão-de suscitar-se conclusões desfavoráveis para nós contrárias à realidade das situações, mas autorizadas pelas deficiências da notação ou interpretação estatísticas.
Refiro ainda outro exemplo, embora de origem e de índole diversa, extraído da estatística referente à mortali-