2106 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 111
que as fontes ocultas de uma história magnífica não secaram e continuarão a fluir para um futuro que olhamos com inabalável confiança.
Nele encontramos, entre outros capítulos essenciais e como grandes objectivos a atingir, a aceleração do ritmo de crescimento do produto nacional, a repartição mais equitativa dos rendimentos e correcção progressiva dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento, a promoção da educação e da saúde.
Para planear, coordenar e fomentar a investigação científica e tecnológica necessária foi criada a Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, adstrita à Presidência do Conselho, para centralizar o estudo e planificação de todos os complexos problemas implicados pela aceleração histórica do mundo actual.
Três sectores fundamentais vão beneficiar da prioridade da sua atenção: a Agricultura, o Ensino e investigação e a Saúde pública.
Mas, para além de planear, é preciso agir contra o tempo e sacudir todas as inércias que não são compatíveis com as duras responsabilidades e exigências da hora presente.
As leis que podem afeiçoar a novas formas o corpo da Pátria já existem; o que urge é que se tornem, efectivamente, fecundo instrumento de acção e de progresso.
Em intervenção que tive a honra de realizar nesta Assembleia, em 16 de Março de 1966, sobre problemas de medicina preventiva, higiene e segurança no trabalho, foi salientado o fundamental interesse de um vasto esquema de medicina do trabalho. E ela constitui necessária infra-estrutura para uma promoção humana e técnica mais eficiente e rentável, como exigem, não só a dignidade do trabalhador, como os superiores interesses da Nação, nas actuais condições de intensa competição característica da dureza do mundo actual.
O Decreto-Lei n.º 44308, de 27 de Abril de 1962, regulamentado posteriormente pelo Decreto-Lei n.º 44 537, publicado em Agosto do mesmo ano, estabelecia e regulava a obrigatoriedade dos serviços da medicina do trabalho, mas sómente para as actividades que, por natureza dos materiais movimentados, oferecem risco silicogéneo. Lembrámos então que o decreto, no seu artigo 36.º, tinha marcado um prazo de três anos para a organização dos serviços nas actividades susceptíveis de provocarem pneumoconioses, mas, apesar disso, a letárgica realidade permanecia serena, como lago sem ondulação, pela inaceitável inércia perante as construtivas exigências da lei.
Quero congratular-me, agora, porque o apontamento então formulado e valorativo da necessidade de estender a cobertura da medicina do trabalho e segurança social a toda a população activa do País se tornou realidade com a publicação do Decreto-Lei n.º 47 511 e do Decreto n.º 47 512, de 25 de Janeiro de 1967, que estabelecem e regulamentam a organização dos serviços médicos, destinados a servir também os interesses da saúde dos trabalhadores das empresas industriais e comerciais.
Mas, agora como então, volto a acentuar a urgente necessidade de encarar os problemas à escala nacional e não esquecer, portanto, as populações rurais, que não dispõem de cobertura mínima suficiente contra os riscos naturais da doença e invalidez, nem de protecção contra os acidentes e doenças profissionais.
Impõe-se a elaboração de uma cobertura de medicina do trabalho e de segurança social extensiva às populações rurais, como condição complementar, mas essencial, dos planos de fomento regional para revitalizar 3 meio agrário pela vinculação dos homens válidos à terra.
Mas para enfrentar mais resolutamente deliberações urgentes é preciso sondar a fundura dos males que ignoramos.
Assim, vamos analisar o panorama aproximado da sinistralidade em Portugal no ano de 1959.
Em cerca de 250 000 sinistros ocorreram 500 mortes, com o prejuízo para a economia nacional de cerca de 10 milhões de dias de trabalho perdidos, calculados no valor de 2 milhões de contos num só ano. Num cálculo a que me reporto, estes números correspondem aos de uma paralisação geral do trabalho, durante um ano, de 96 fábricas, empregando cada uma 300 operários. As actividades comerciais, industriais e agrícolas não constituem sómente fontes de riqueza e de progresso, pois, tal como a torrente que ao passar deixa as margens cobertas de destroços, também o trabalho multiplica inumeráveis perdas e desnecessárias tragédias.
Em discurso recente realizado pelo Sr. Ministro das Corporações, Prof. Gonçalves de Proença, na cerimónia da entrega de diplomas de curso de socorristas, foi afirmado que «o acidente laborai é mais mortífero do que a guerra e mais insidioso do que a doença».
Acontece mesmo que os números de sinistralidade subiram com o progresso da industrialização e, para 3 milhões de pessoas, há agora a registar, por ano, a ocorrência de mais de 500 000 acidentes, com 60 000 incapacitados, total ou parcialmente. E para além de todo o drama humano e familiar oculto pela frieza dos números surgem os prejuízos materiais resultantes dessa sinistralidade e que se cifram em cerca de 3 milhões de contos.
Abstraindo de todo o drama, que é em grande parte susceptível de ser evitado, facto de que resulta uma séria responsabilidade moral para a inobservância de eficazes e bem definidas atitudes preventivas, continuaremos a apontar sómente razões de ordem económica, para além das razões de ordem humana, que, só por si, deveriam ser definitivas.
Assim, as reservas matemáticas que as companhias de seguros e as instituições de previdência são obrigadas a imobilizar por ano, para garantia de indemnizações, correspondem à verba de 700 milhões de escudos, que poderia ser investida em empreendimentos reprodutivos se o índice da nossa sinistralidade fosse reduzido aos limites mínimos possíveis, e podem sê-lo em cerca de 40 por cento. E há ainda que pensar em todos os trabalhadores isolados, e não seguros, como largamente ocorre na agricultura, e cujo número de acidentes andou, em 1956, por cerca de 75 000.
Considerando o salário médio, para a totalidade do País, de 45$ por dia, os 10 milhões de dias de trabalho perdidos traduzem-se no prejuízo anual de 450 milhões de escudos de prejuízos directos. Acresce que as despesas indirectas resultantes dos acidentes são muito maiores que as directas e estão calculadas em número oito vezes superior.
Sendo assim, verificamos que a economia nacional é prejudicada cada ano em 4050 milhões de escudos.
Em 1965 os prejuízos com acidentes absorveram 78,17 por cento do rendimento das nossas principais indústrias de exportação: têxteis, cortiça e conservas. O turismo, que tantos investimentos requer, deixou em 1966 em Portugal 6000 milhões de escudos, mas esse benefício foi largamente absorvido pelos prejuízos resultantes dos acidentes de trabalho, como peso morto da nossa economia.
E o que se passa na indústria, igualmente se verifica na agricultura. Por exemplo: dos 13 500 acidentes mortais nos Estados Unidos durante um ano, cerca de 3300 foram vítimas de trabalhos rurais.