10 DE JANEIRO DE 1968 2177
laboratórios ou das máquinas de escrever e mesas dos gabinetes, das secretarias e das contabilidades. Todos estes homens assim libertos permitirão a constituição de mais unidades combatentes, que irão facultar a substituição daquelas em primeira linha, que gozarão agora de mais frequente e necessário repouso, ou então maior facilidade na instrução e mobilização dessas unidades, porque os seus contingentes tornar-se-ão assim mais amplos.
O efeito moral será excelente, ninguém já se poderá queixar de que a guerra só existe para muitos, sim, mas não para todos, nem mesmo numa percentagem quase total; apagar-se-á então por completo toda a suspeita ou maledicência de ter havido protecções, que, a existirem, indiscutivelmente têm de ser consideradas desonestas, mesmo com a alegação de que àqueles serviços ou especialidades alguns terão de ser destinados.
Hospitais, enfermarias, laboratórios, podem, na sua quase totalidade, ser entregues ao serviço militar feminino. Isto é: grande parte do serviço de saúde, em todas as situações de retaguarda onde o perigo seja nulo. E o mesmo se poderá estabelecer no serviço de intendência, com contabilistas e escriturárias, e nas secretarias em geral, repartições dos Ministérios militares, estabelecimentos fabris, etc., e até parte das transmissões e dos transportes.
O Sr. António Santos da Cunha: - V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: - Faça favor.
O Sr. António Santos da Cunha: - Estou acompanhando com vivo interesse as considerações que V. Ex.ª está fazendo e de maneira especial o que acaba de dizer sobre a relevância do serviço das mulheres nas forças armadas. Perfeitamente de acordo.
Mas, se essa relevância é grande, pois pode dispensar de missões secundárias homens que noutros lugares serão sem dúvida úteis, pergunto eu:- não será o caso de se tornar obrigatória a prestação do serviço militar para o chamado sexo fraco? Aqui fica a nota, com o favor de V. Ex.ª
O Orador: - For agora é ir talvez depressa de mais. Quanto a mim, devemos caminhar por fases sucessivas. De qualquer maneira, agradeço a intervenção de V. Ex.ª
Ao criar-se uma lei que regula este serviço, não deverá esquecer-se aquilo que tem de ser tomado como fundamental, a protecção física e moral dos indivíduos que ingressarem nele. Não poderá ser tomado como origem de desinteresse o facto de o alistamento ser voluntário. Evidentemente que é a uma regulamentação justa, ponderada e honesta que pertence dar os fundamentos para a admissão da mulher portuguesa no seu contributo directo para a defesa da Pátria.
Numa apreciação de generalidade, só a mais três determinações constantes deste projecto desejo ainda referir-me. Uma delas, e que muito despertou a minha atenção, é a que consiste numa mais larga amplitude concedida para a obtenção de diplomas universitários. Evidentemente se torna importante impedir que o serviço militar possa prejudicar os alunos das escolas superiores na conclusão dos seus cursos. A margem que lhes é concedida é a suficiente para que um aluno universitário, normalmente aplicado, possa concluir a sua formatura. A nova lei reconhece assim quão importante é para o País a manutenção, desenvolvimento e aperfeiçoamento das suas elites, das quais hão-de sair a quase totalidade dos seus governantes, e mentores da futura intelectualidade nacional. E mais, nesta ordem de ideias, a nova lei não poderia esquecer a manutenção dos corpos docentes universitários; assim, concede mais alguns anos de adiamento das provas de classificação àqueles que tenham sido contratados como segundos-assistentes das Faculdades ou escolas superiores ou nelas preparem doutoramento. De entre estes assistentes e dos futuros doutorados é que hão-de ser escolhidos os novos professores, não só para recompletamento de vagas que se forem produzindo, mas ainda para desenvolvimento dos respectivos corpos docentes em harmonia com o crescente número de alunos que mais e mais vêm afluindo à frequência do ensino superior.
A outra disposição, conforme já antes salientei, desejo também referir-me:
Com frequência sucede haver mancebos que, apesar da sua pouca idade, são já o único meio de manutenção do seu agregado familiar, ou da pessoa que os criou e educou desde a infância. Pelas leis vigentes pode ser determinada, sem sujeição a pagamento de taxa, a antecipação da passagem à situação de disponibilidade dos indivíduos que, não tendo outros proventos além do seu trabalho, demonstrem ser o único amparo da mulher e dos filhos menores, ou dos pais ou irmãos menores, ou de mulher pobre e sexagenária que os tenha criado e educado desde a infância. Ficam ainda isentos da prestação de serviço no quadro permanente.
Uma disposição destas, que à primeira vista se afigura como humana, é imoral. É claro que não pode de forma alguma atirar para a maior das misérias as pessoas que, pela sua pouca idade, ainda não estão em condições de ganhar o seu sustento ou aquelas que, por muita velhice ou total incapacidade prematura, estão absolutamente inutilizadas, mas também não está certo que uma situação destas sirva a alguém de forma de se eximir ao seu contributo militar para com a Pátria.
Pelo projecto da proposta de lei agora em apreciação, em seu artigo 62.º, o qual a Comissão de Defesa Nacional considerou de mais justo efeito que o correspondente no parecer da Câmara Corporativa, virá moralizar esta situação, preceituando-se que o Estado concederá subsídios às famílias destes homens quando o seu agregado familiar ou a pessoa que os criou e educou desde a infância não disponha de outros meios para prover ao seu sustento.
A Câmara Corporativa, conquanto concorde que esta disposição tenha um largo alcance social - quanto a nós mais do que isso, também moral, pois que a prestação do serviço militar deve processar-se numa base de quanto possível igualdade -, receia que esse compromisso não possa ser integralmente cumprido pelo Estado, sugerindo que se proporcione haver outras formas de assistência que não sejam subsídios ou pensões. Evidentemente que pertence ao Estado salvaguardar os seus interesses, mas é inconcebível que, na situação em que o País presentemente se encontra, haja quem, por lhe ter cabido possuir pessoa de família única e exclusivamente a seu cargo que pela doença ou pela idade esteja totalmente inválida, possa ser dispensado de ir dar o seu esforço em defesa das províncias do ultramar português.
Verifica-se que esta nova Lei do Serviço Militar, além de pretender actualizar em harmonia com os ensinamentos adquiridos desde a publicação dos diplomas em vigor até ao momento presente e daqueles que têm resultado da experiência que nos vai dando a situação que vivemos, procura também um caminho de nítida orientação moral, o que se verifica também quando aborda a prestação do serviço militar em regime disciplinar especial.
Sabe-se que a tendência presente de todo o nosso sistema penal se orienta num sentido único, o da recuperação do delinquente. Foi já a querer-se caminhar para