DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 141 2560
Podem também fixar o intervalo de segurança, que é, nem mais nem menos, o espaço de tempo que deve existir entre a aplicação de um produto em determinada cultura e a sua colheita, garantindo assim que o nível dos resíduos seja, nessa altura, inferior à tolerância.
Cada país tem de fixar não só a tolerância. mas também o intervalo de segurança para cada pesticida, já que as condições do meio as fazem variar de país para país.
Pois o nosso país ainda não estabeleceu a tolerância! As que foram estabelecidas para outros países não nos servem, porque um dos factores importantes que as influenciam é o tipo de alimentação.
Quanto aos intervalos de segurança adoptados e difundidos pela Sociedade Portuguesa de Fitiartria e de Fito-marcologia, organizou-se uma lista baseada naqueles que foram fixados noutros países a que se julgou serem os mais adequados para o nosso, à luz de certa experiência nacional sobre a degradação de alguns deles. Se é certo que todos os produtos trazem a indicação do número de dias que deve mediar entre a aplicação e a colheita dos produtos, também é verdade que o nosso lavrador não está preparado para compreender essa necessidade, não tem consciência do perigo que resulta de não respeitar a indicação, e, com a preocupação de salvar, na última hora, as' suas culturas, põe muitas vezes em risco a saúde pública, por enviar para consumo produtos hortícolas e frutos indevidamente tratados. Muitos tem sido os quadros de intoxicação aguda que tal sistema tem originado. São necessários estes pesticidas?
Tem-se afirmado que eles são absolutamente indispensáveis para que a agricultura seja económica e rentável; que só com a aplicação de pesticidas será possível ter produtos alimentares em certas regiões; que, no que toca aos Estados Unidos da América, segundo cálculos que se têm por bem elaborados, a suspensão do uso dos pesticidas traria uma redução de 50 por conto na produção de batatas, de frutos e de algodão e. pelo menos, uma redução de 23 por cento na carne, no leite e na lã.
Numa época em que cerca de dois terços da população do Mundo sofre de subalimentação, não é lícito correr o risco daquela redução, e por isso não se poderá viver sem pesticidas! . . .
A nós interessa-nos sobremaneira fomentar por todos os meios a qualidade e a quantidade da produção agrícola, proceder ao estímulo da produção e acautelar devidamente os produtos; mas interessa-nos, ao mesmo tempo, defender a saúde pública, o próprio homem, a quem esses produtos se destinam.
No termo da Conferência sobre a Defesa Fitossanitária dos Produtos Armazenados, que em Dezembro último se reuniu no nosso país, promovida pela Organização Europeia e Mediterrânea para a Protecção das Plantas, o Sr. Secretário de Estado da Agricultura afirmou que os prejuízos causados em Portugal, nas culturas, pelas doenças e pragas são superiores a l 400 000 contos.
Não está, no entanto, segundo julgo, avaliado o montante de prejuízos causados pela maneira como são aplicados esses produtos, nem os prejuízos causados pelos seus resíduos persistentes. Seria do mais alto interesse saber a quanto monta o prejuízo causado pela mortandade das abelhas, dos peixes e da caça e pelas intoxicações agudas e crónicas dos animais domésticos e do próprio homem.
Por via da economia agrícola, do combate às pragas e da luta com certos agentes vectores de certas doenças e também dos interesses de certa indústria somos obrigados a viver em plena guerra química.
Esta atingirá, directa e indirectamente, o homem, se a condução desta guerra não for devidamente acautelada.
Meus senhores: A ecologia, isto é, as relações dos organismos vivos entre si e o meio que os rodeia, que os envolve e em que vivem, tem sido objecto, nos últimos tempos, de aturados estudos que também abrangem a difusão e a concentração dos pesticidas. O termo, que foi criado há um século, tem hoje uma muito maior amplitude do que a que inicialmente lhe foi atribuída.
Pelo facto de muitos produtos tóxicos terem na atmosfera envolvente, na chamada "troposfera", uma concentração infinitesimal, julgou-se até há pouco que o seu estudo era desprovido de interesse para a, saúde pública e mesmo para todos os seres.
As investigações dos últimos anos vieram demonstrar que esses tóxicos, mesmo nessas concentrações mínimas, não são destituídos de perigos. Porquê? Porque em certas condições podem atingir em certos organismos, por adições sucessivas, concentrações tais que alterem profundamente os seus fenómenos fisiológicos e ponham em risco a sua própria vida.
Abriram as portas deste sector da investigação as observações e os estudos realizados sobre as substâncias radioactivas; foi há dezoito anos que as poeiras radioactivas da bomba de hidrogénio de Bikini nos trouxeram a chave deste importante problema.
Foi sobre o Dragão Feliz, o barco de pesca japonês que se tornou tristemente célebre, que se precipitaram essas poeiras. Mas não foi somente ai que elas exerceram a sua deletéria acção: foram arrastadas pela água e pelo vento, estenderam-se por vários milhares de milhas quadradas do Pacífico, foram lixadas por plantas marinhas que serviam de alimento a pequenos animais e, através destes, passaram para os tecidos dos peixes que os devoraram, entre os quais, uma variedade de atum de que os Japoneses se alimentam em larga escala. Vasto foi o plano de investigação que daqui nasceu, envolvendo múltiplos aspectos, e que foi realizado através das comissões de energia atómica de diversos países.
Entretanto, outros investigadores apuravam que o que se passava com a disseminação, a fixação e a acumulação das poeiras radioactivas através dos vários elementos dos ciclos ecológicos também se verificava com partículas de iguais dimensões que nada têm que ver com elas. É o caso do pólen caído das corolas e dos cristais dos pesticidas lançados sobre as plantas ou na terra.
Uns e outros podem ser arrastados por correntes aéreas ou hídricas e transportados a grandes distâncias. Sobretudo por arrastamento hídrico, os resíduos dos pesticidas podem ser concentrados em doses tóxicas em locais muito distantes dos da sua aplicação.
Os elementos da cadeia populacional das espécies que constituem a comunidade no sentido ecológico podem ir fazendo acumulação de produtos tóxicos de elo para elo, uma vez que esses produtos não sejam eliminados nem metabolizados. O homem é o elo terminal de muitas dessas espécies, e, portanto, o que recebe maiores doses e acumula mais elevadas taxas. Há vários tipos de cadeias, compostas por número variável da elos, e como os tóxicos se vão acumulando do elo para elo, nunca se poderá dizer onde e em que medida é que as substâncias tóxicas libertadas no meio em que vivemos irão produzir os seus maléficos efeitos.
Nas poeiras radioactivas, de elo para elo, podem produzir-se concentrações duas a três vezes superiores. Quanto maior for o número de elementos da cadeia até chegar ao homem, tanto maior será o perigo.
O primeiro pesticida a ser estudado à luz destas ideias foi o D. D. T. Razões de preferência: a sua frequente utilização; a sua toxicidade para diversas espécies de animais; a sua estabilidade e a sua lenta transformação (a sua