DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 146 2690
Refiro-me, evidentemente, quer ao sector público, quer ao sector privado, e refiro-me à capacidade de saber prever, de planear com lógica, de executar pêlos melhores métodos e de administrar com devoção e, sobretudo, com autenticidade.
Tem sido um lugar-comum dizer-se em Angola que nos falta dinheiro e técnicos, e com esse cómodo argumento tudo quanto é negativo se explica ou se justifica. Creio até que esse lugar-comum excede aquela província e constitui mesmo argumento aplicado mais ou menos em todo c território português. Pelo menos no que respeita a Angola, que conheço mais directamente, tenho a opinião de que não temos nem falta de dinheiro nem de técnicos.
Temos, sim, é falta de bons técnicos. Temos, sim, é falta de mentalidades conscientes, produtivas e profissionalmente honestas e cumpridoras.
Ë dessa falta que se proporcionou à capital da maior província portuguesa a presente situação de viver um problema angustiante de falta de água e de electricidade, com cortes e falhas que, além de incomodidade natural num clima fortemente quente e húmido, provoca enorme soma de dissabores e prejuízos nas mais diversas actividades. Não foi também a falta de dinheiro nem a de técnicos que provocou a actual situação caótica do sistema de telefones de Luanda, sistema que no próprio ano cia sua instalação - 1960 - já não tinha capacidade para atender às necessidades e solicitações locais.
Não obstante a situação favorável da balança comercial, com melhor saldo do que no ano anterior, a balança de pagamentos de Angola viu agravado o seu saldo, elevando-se o déficit acumulado dos anos anteriores. Não houve, consequentemente, qualquer melhoria nas persistentes dificuldades de transferências de Angola, aumentando o período de tempo entre a data da entrega dos fundos naquela província e o momento da entrega do correspondente valor na metrópole, e foram maiores as violações à letra e ao espírito da legislação que definiu e regulamentou o sistema de pagamentos interterritoriais.
Não me alongarei neste sector da balança de pagamentos e das transferências da Angola, a fim de não me repetir em conceitos e considerações constantes de anteriores intervenções minhas nesta Câmara, pois o problema permanece exactamente igual como no momento em que há dois anos o abordei pela primeira vez e iguais continuam a ser as minhas convicções sobre o mesmo. Não tenho, pois, motivo para ir além do natural reparo e da natural lamentação pela persistência e agravamento de uma situação que se não tem sabido dominar.
A Conta Geral do Estado de 1966 relativamente a Angola dá-nos a saber que as receitas públicas aumentaram de 7,8 por cento em relação ao ano anterior, tendo as receitas ordinárias passado ao dobro no curto espaço de quatro anos.
O aumento das receitas de um Estado, as quais têm por fonte a vida e a actividade da respectiva nação, tem uma importância fundamental, pêlos reflexos que provoca nessa vida e nessa actividade. Constituindo uma necessidade, para satisfação do bem comum, as receitas públicas podem, todavia, por exagero de tributação, proporcionar situações indesejáveis de atrofia e de recessão.
Uma desproporção no aumento das receitas sacadas pelo Estado, comparativamente ao aumento da riqueza interna, pode tornar esse Estado rico, mas torna com certeza a nação pobre.
Este aspecto não deixa de me preocupar na medida em que li recentemente na imprensa diária que no ano de 1967 a cobrança dos impostos indirectos em Angola atingiu os 2 milhões de contos. Efectivamente, se se considerar que as receitas públicas ordinárias já representavam em 1966 cerca do dobro do valor de apenas quatro anos antes e que nelas os impostos indirectos não iam além de l milhão de contos, o conhecimento de que em 1967 atingiram os 2 milhões pode pôr-nos perante a dúvida se a administração pública em Angola não estará a exigir de mais da capacidade contribuinte da vida e da actividade daquela província.
O aumento das receitas públicas compreende-se quando na proporção do crescimento económico do ambiente em que incidem. No citado período de quatro anos, de 1962 a 1966, ano cujas contas estão em apreço, enquanto o comércio de importação e o de exportação experimentaram um aumento do nível de 50 por cento, as receitas ordinárias arrecadadas pelo Governo da província aumentaram de cerca de 100 por cento. Se os valores da importação e da exportação podem servir, embora grosseiramente, de medida para avaliar a evolução da economia de Angola, não há dúvida de que a mesma foi vítima de um sensível agravamento das incidências tributárias. Dado que tudo indica ter sido o ano de 1967 especialmente produtivo no capítulo do encaixe de receitas públicas, maior terá sido, certamente, nesse ano, o desfasamento e o desequilíbrio entre a capacidade normal contribuinte da província e o que lhe foi retirado.
Que assim deve ser comprova-o o clima de inflação e de aumento do custo de vida que ali se regista, sem que se verifique em contrapartida um aumento de riqueza e de rendimento. Tem sido a excessiva carga tributária, sucessivamente agravada, a causadora do encarecimento do custo de vida em Angola, e não qualquer excesso de poder de compra da sua população.
É para este aspecto que não deixo de chamar a atenção do Governo, procurando evitar que o recurso a agravamentos fiscais frequentes e & criação de novas incidências tributárias, como forma simplista de fazer aumentar as receitas públicas da província, venha a degenerar afinal num processo de retraimento e de recessão económica, com todos os seus inconvenientes e perniciosos efeitos.
Enquanto as receitas públicas aumentarem por via do aumento natural da riqueza sobre que incidem, ou por uma maior fiscalização e melhor aplicação das incidências fiscais, "em agravamento das bases de incidência, a economia geral contribuinte não se ressentirá e poderá seguir o seu processo de crescimento e valorização num clima propicio de atracção e confiança pela estabilidade do sistema fiscal em que decorre.
O contrário provocará uma falta de confiança para a aplicação de capitais em Angola, criando o receio, que infelizmente em Angola a prática já legitima, de um empreendimento ser estudado dentro de uma conjuntura tributária e fiscal e ver-se depois em situação marginal ou até negativa, por virtude de surgir um agravamento nas incidências fiscais ou a criação de uma nova e não prevista imposição tributária.
Embora possa parecer um paradoxo, sempre entendi que a necessidade de maiores receitas públicas em Angola, em cada ano que vai passando, deveria ser conseguida através de um sensível desagravamento tributário. Sempre me pareceu, não obstante a sua aparência chocantemente absurda, que uma redução sensível do peso tributário em Angola permitiria ao Governo da província arrecadar afinal maiores receitas e atingir mais facilmente os mais prementes e urgentes imperativos daquela boa terra português", como é o caso do seu povoamento com os excedentes demográficos metropolitanos.
Seria uma forma muito importante de facilitar e fomentar a expansão das actividades e empreendimentos, de animar e acelerar o circuito económico, de se obter, em suma,