2808 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 154
O Orador: - De que assim será nos deu precioso aval o Chefe do Estado, aval que confiada e seguramente subscreveu o Sr. Prof. Marcelo Caetano ao tomar posse da Presidência do Conselho, e amplamente ratificou na lúcida e condensada exposição programática com que há dias quis esclarecer e honrar esta Assembleia.
Bem hajam por isso os dois!
A propósito da ansiedade provocada pela doença física de Salazar, ocorre-me referir aqui uma exclamação famosa de Maurras, quando, nos primórdios da Action Française, lhe noticiaram a morte de um dos seus mais esperançosos jovens camaradas de propaganda doutrinária; esta cena, presenciada por Bainville, lê-se no recente n.º 27 dos Cahiers de Charles Maurras. Isto, já se vê, com a diferença, a favor de Salazar, de se tratar tão-só do afastatamento da vila pública, que não da vida. Quando, dizíamos, foi comunicada a Maurras aquela notícia, este, com voz surda ï punhos cerrados de raivosa dor, exclamou: On ne meurt pas!
Efectivamente, quando se anda empenhado numa exultante obra do espírito, como o mestre francês de contra-revolução nacionalista e o homem público português da afim restauração nacional, aquele, o espírito, vencendo a matéria, empresta à obra o selo da permanência. Até em passos decisivos da história pátria este aspecto realça em concreto, lustrativamente. O melhor da obra ultramarina de D. João II desabrocha perene mediante a constância zele sã de D. Manuel e de D. João III. Foram homens saídos do pombalismo, na sequência da correspondente orientação reformista, embora mais temperada de humanidade, que fizeram a prosperidade do reinado de D. Maria I, tal como Caetano Beirão no-lo pôs em destaque. Pina Manique, Pascoal de Melo, Acúrsio das Neves ... Até na história de França vemos ao génio de Richelieu suceder a eficiência de Mazarino, ambos a preparar a glória do «Rei Sol».
On ne meurt pas!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Na sessão de 8 de Março último, a propósito da aprovação das contas públicas do ano de 1967, socorrendo-me da minha experiência e da alheia, chamei a atenção desta Câmara ser a da aprovação de contas a altura óptima para, construtivamente, formularem os Srs. Deputados sugestões sobre casos concretos que pudessem vir a ser eventualmente aceites pelo Governo como viáveis. Nesta qualidade se considerariam os respectivos encargos entre as verbas de futuros orçamentos, encaminhando tais casos à efectiva realização. Em contrapartida, dissemos então não ser antes na altura da aprovação da Lei de Moios, como a pura lógica solicitava, a ocasião mais oportuna para o efeito de tal formulação, já por o reclamado não ser possível introduzir-se na economia de um orçamento adiantadamente confeccionado, se não pronto, já, se com vista ao do ano seguinte, por propender ao esquecimento pela distância no tempo. Parece, por is? o. que de forma alguma aqui se nos figura como despropósito tratar de implicações políticas interferentes na Lei de Meios. Política infra-estrutura permanente das finanças: «Dai-me boa política, dar-vos-ei boas finanças», proclamava, o barão Louis, famoso financeiro da Restauração. Equivalentes considerações tivemos o prazer de ouvir ontem da boca autorizada do ilustre Deputado e antigo Ministro Sr. Águedo de Oliveira.
Já que, se por considerações políticas começamos estas regras u pressa alinhavadas, nos seja assim lícito prosseguir nelas.
Como atrás lembrámos, a confiança do País na continuação da obra salazariana assaz ficou garantida pelo aval do Chefe do Estado, seguido do aval do Sr. Presidente do Conselho. Convém recordar que os fundamentos da orientação política e administrativa desta obra foram limiarmente definidos, sobretudo nos célebres discursos de 28 de Maio de 1930, realizado na Sala do Risco, e de 30 de Julho seguinte, realizado na Sala de Conselho de Estado, quando o Doutor Salazar era ainda apenas Ministro das Finanças. Mais tarde, quando já Presidente do Conselho, teve ocasião de concretizar essas directrizes em reformas importantes, entre as quais sobressaem, pela sua novidade ao tempo e importância, as de carácter social corporativo e as de índole constitucional.
Nos referidos discursos se postulou, como ponto de partida indispensável à regeneração e progresso da Nação, a resolução do problema financeiro com o extermínio do déficit crónico e a realização de um equilíbrio que com felicidade se tem vindo corporizando em substancioso superavit. Já então os dois anos de gerência consequente às reformas fiscais de 1928 vinham dando os seus benéficos frutos.
Este ponto fundamental da estabilidade financeira tem, por isso, de prosseguir como até aqui c não obstante o aumento de despesas ocasionadas pela mobilização militar. A proposta de lei que temos sobre a Mesa, no seu artigo 3.º, fortalecido pelo disposto no artigo 15.º, n.º 1, confirma-nos na convicção de que este princípio basilar continuará a ser respeitado. Ainda bem que tão claras prescrições venham a servir para contrabater as tentações políticas sobretudo instantes em períodos eleitorais; e estamos à beira de um deles.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Não me alargarei em matéria delineada nos citados documentos por Salazar, que no campo económico hoje se verifica em processo de expansão, como vem referenciado rios termos expressos do capítulo II do relatório ministerial precedendo a presente proposta; expansão que, quanto ao sector público, se estrutura sobretudo através do vigente Plano de Fomento. A informação que nos foi adiantada pelo Sr. Presidente do Conselho no seu discurso de 27 do mês passado, quanto à protecção a dedicar à lavoura e às instituições de previdência em benefício das classes rurais, tão desvalidas até hoje, só pode merecer, em princípio, o nosso aplauso. Aguardemos, contudo, a definição dos termos com que serão fixadas, e que com que venham a inserir-se no reformismo social corporativo vigente.
Detenhamo-nos agora um tanto na resolução do problema político, tal qual adivinhava Salazar, em 1930, no discurso da Sala do Risco. Visava-se então à transição do regime ditatorial para o de um estatuto constitucional. Insistia, então, este grande homem público em que o Exército instituíra o governo ditatorial para se lançar mão à obra de regeneração pátria, que carecia de paz e colaboração nacional, afastando o espírito de luta entre facções. Que essa obra teria de começar pelo saneamento financeiro, cujos resultados já começavam a frutificar. Deles brotaria progressivamente o rejuvenescimento económico e social do País. Ulteriormente se institucionalizaria o regime político adequado às novas circunstâncias. Sabemos, pela história vivida, ao que tem correspondido essa reforma constitucional com a manutenção de um executivo-legislativo forte, esboço de corporativização progressiva e representação nacional sem facções, cuja parte somos, e ao abrigo da qual aqui nos encontramos perorando. Comporta o estatuto, deste regime a virtude expressa de periódica-