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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 170 3058

o ordinário, como entram tantas outras coisas perniciosas e deseducativas estranhas à nossa índole, sensibilidade e necessidade culturais".

E entram por tal forma, acrescento, que o motivo do escândalo e da indignação de muitos passa em breve a ser admitido por todos, suporta ainda uma ou outra crítica dos menos benevolentes, mas a reacção vai também diminuindo, até desaparecer na rotina frenética da vida de hoje.

E o Mundo continua a girar ...

E a língua fica mais pobre!

E que dizer da escrita o da pronúncia de certos toponímicos e locativos estrangeiros?

E da pronúncia errada de toponímicos e locativos portugueses, que tanto irritam, pela contumácia com que é usada, os naturais dos meios atingidos?

E o uso das letras minúsculas nas palavras começadas por maiúsculas, conforme as regra ortográficas vigentes e, o respeito por muitas coisas sérias?

A Liga Portuguesa de Profilaxia Social anda envolvida desde há anos, e para seu prestígio, numa persistente campanha contra essa moda, importada do estrangeiro, ao sabor de certas correntes artísticas.

Argumenta-se que é um problema de estética, de liberdade artística, muito discutível, mas pouco discutida, porque julgo não originar muita discussão ... E que assim é, a campanha não encontrou muitos opositores, antes os de boa fé e não menor gosto se vão deixando vencer e convencer.

Apontarei apenas, numa infinidade de casas, que o Secretariado Nacional da Informação reconheceu expressamente a verdade da campanha e uma conhecida revista de cultura literária e cientifica, que um determinada altura passara a escrever o seu nome com minúsculas, contra as regra da ortografia, emendou a mão e regressou à grafia correcta.

Por seu lado, a Inspecção Provincial do Educação de Angola enviou há pouco mais de um ano uma circular aos reitores e aos professores recomendando-lhes a melhor atenção no sentido de se evitarem os casos de desrespeito pelas normas ortográficas, particularmente os de uso reprovável das letras minúsculas na grafia dos nomes próprios ou naqueles em que devem ser usadas as maiúsculas, impedindo até a circulação de livros e cadernos escolares em que se manifeste tal tendência, "visto não estar de acordo, diz, com o estabelecido oficialmente e com o respeito devido à língua nacional".

Bom exemplo nos dá mais uma vez essa portuguesíssima província, que bom seria viesse a ser seguido sem demora pelos organismos responsáveis pela educação em todo o território do País.

E bom será que assim se faça depressa, pois, direi com o Dr. Carlos de Soveral, que, quando Subsecretário de Estado da Educação Nacional, se pronunciou doutamente sobre o ajunto, a nivelação das maiúsculas com as minúsculas "... afirma não apenas a falta de um indispensável sentido de hierarquias, o desrespeito por outras palavras, de categorias mentais e morais que se situam no cerne de um arcaboiço social psicológico multissecular, como também ofensivamente, um consciente, propósito de anarquização das coisas o dos espíritos ...". E a invasão, que continua, apesar da voz que nesta Assembleia se ouviu com superior autoridade, dessa inqualificável miniliteratura infantil, esse caldo de subcultura que são as histórias de quadradinhos, publicadas em certas revistas nacionais e estrangeiras, e as divulgadas fotonovelas, meio de se gastar o tempo deseducativamente nos ... transportes colectivos.

E as traduções de obras literárias estrangeiras?

Permita-se que sobre este importante assunto do desaprender da língua portuguesa cite uma nota publicada há tempos no Diário de Notícias, sob o titulo de "A asneira tem limites"

Escreve-se na referida nota:

Traduz-se à letra, tão rigorosamente que em vez de dicionário o tradutor profere a semelhança fonética e acontece, com uma frequência de arrepiar, por exemplo, vermos pourtant traduzido por "portanto", em vez de "contudo", ou canne por "cana", quando se está mesmo a ver que é uma bengala que o sujeito leva na mão.

E Génèvê traduz-se Génova.

O pior - conclui - é que vemos subscrever algumas traduções nomes cuja responsabilidade como escritores, ou como críticos, devia impor-lhes um pouco de respeito pelos leitores.

Isto quer dizer, também, que a falta du respeito pelos ouvintes ou pelos leitores, em todos os domínios da deturpação da língua, não tem como autores apenas a massa ignara ou os semiletrados, mas os próprios que blasonam de letrados.

Como ensinar estes ignorantes? Eis outro problema ... As medidas de polícia são sempre difíceis de tomar e muito mais de executar, sobretudo nos tempos que correm, Recordo a existência de um diploma legal que proibiu, e digo proibiu e não proíbe, o uso de expressões em línguas estrangeiras nas designações públicas dos estabelecimentos comerciais e industriais. Pois bem, Lisboa, por exemplo, está a perder muitos dos aspectos característicos do cidade portuguesa pelo uso e o abuso do estrangeiro e do estrangeirado que invadiu, de dia e de noite, as frontarias dos prédios, transformando-a em irmã gémea de muitas outras urbes do Mundo. O diploma, que deu origem aos três pontinhos da palavra "bar", foi já revogado por desuso, se alguma vez, porventura, teve aplicação séria.

Creio, todavia, na necessidade de só intervir por meios indirectos na desordem que por aí vai e sujeitar à acção vigilante dos organismos licenciadores de exposições públicas de palavras, frases ou designações todo esse estendal de atentados ao vernáculo, impulsionado pelas chamadas técnicas da publicidade, uma nova forma de servidão deseducativa das almas.

Mas, sobretudo, há que educar, educar, educar na escola e fora da escola.

Educar na escola, ensinando bem a língua portuguesa, estimulando o gosto pelo seu uso correcto, mostrando as maravilhas que ela contém nas páginas imortais dos prosadores e dos poetas, fazendo sentir a beleza e a força das ideias, quando transmitidas com elegância e propriedade.

Educar constantemente, não se consentindo que ela se perverta ao sabor dos responsáveis pela sua transmissão e divulgação.

Fomentar, fomentar o uso da boa linguagem falada e escrita, por mercê, de um plano de. fomento desse bom uso, sem necessidade do investimentos estrangeiros, salvo os de ouro de lei.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: O I Simpósio Luso-Brasileiro sobre a Língua Portuguesa Contemporânea, reunido em Maio de 1967, em Coimbra, por iniciativa da Faculdade de Letras da sua Universidade, aprovou a proposta da criação de um organismo de carácter permanente, com funções de consulta e de fomento de medidas concretas relativas ao estudo, cultivo e difusão da língua.