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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 174 3116

honrar a sua memória e hão-de esforçar-se por prosseguir, sem desfalecimento, com o mesmo interesse e o mesmo desejo de colaborar fortemente no progresso da Madeira e de Porto Santo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua o debate sobre o aviso prévio acerca da defesa da língua portuguesa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte rio Amaral.

O Sr. Duarte do Amaral: - Sr. Presidente: A minha alegria por o ver sentado nessa cadeira só é diminuída pela tristeza sentida com a doença do Sr. Doutor Mário de Figueiredo. A ele desejo um rápido restabelecimento; a V. Ex.ª, que possa, entretanto, mostrar os altos méritos e as grandes qualidades que o fadaram para esta posição.
Uma sociedade portuguesa pós a funcionar um novo check-in. Todos nos regozijamos com o facto, do mesmo modo que anteriormente nos alegrámos com a inauguração por outra do um cracking, tal como nos dará satisfação assistir amanhã a um bem leccionado curso de marketing.
Conhecemos as razões por que no Cais do Sodré abriu mais um snack-bar e manifestamos n nosso contentamento por sabermos que os rotors e os staturs dos motores que encomendámos já estão fabricados e prontos para montagem.
Menos satisfação nos deu que pessoa das nossas relações, para nos aconselhar urgente visita a um deslumbrante roseiral em flor - que linda, esta expressão! - tivesse feito dizendo que não deixássemos de ir imediatamente ver tal roseraic.
Eis aqui, Sr. Presidente, algumas amostras diárias de como se abastarda a língua portuguesa, para nós a mais bela de todas: aquela em que ouvimos as primeiras palavras de nossas mães, aquela em que Camões cantou, aquela que é hoje prodigioso instrumento político falado já por muitas depenas de milhões de pessoas.
Suponho que todos estaremos de acordo: é preciso lutar contra o pedantismo que em pessoas de certa idade se exprime em francês e na gente nova, sobretudo, em inglês.
O mal não é nosso, ]á se vê, e há países, latinos que têm tido maiores dificuldades em nacionalizar expressões importadas do mundo anglo-saxónico do que nós. Assim, por exemplo, se aqui dizemos "fim de semana" e "parque de estacionamento", os franceses ainda empregam correntemente week-end e parking.
Mas, de qualquer modo, a língua é como uma flor, cuja beleza se não deve deixar macular, e por isso aqueles que a bem escrevem e bem falam não podem esmorecer na tarefa de velar pela pureza do idioma nacional. Cumpre estar atento e sor activo, para contrariar e superar as arremetidas da técnica que constantemente levam a introduzir escusados estrangeirismo e neologismo ou a adoptá-los sem critério. E importa ainda, por outro lado, não deixar empobrecer o nosso vocabulário, cuidando da sua permanente vivificação mediante, recolha e divulgação das ricas expressões que em toda a província o povo soube conservar e usar com tanta propriedade - o povo também faz língua.
Sei que o Estado c outras instituições tem lutado pela sua pureza, mas a verdade é que não se tem acompanhado o progresso técnico e o dinamismo industrial e comercial, nem a língua portuguesa - espelho da comunidade que a fala - se abriu ainda., generosa, à feliz introdução no nosso meio de novas indústrias, de novos processos de comerciar, com as suas técnicas e os seus falares: não é apenas Portugal, é também a língua portuguesa que precisa de aceitar o progresso.
Há empresas importantes que já se aperceberam disto e que para o efeito criaram comissões incumbidas da tradução permanente da linguagem técnica estrangeira. Mas o problema não deve ser entregue ao acaso das iniciativas isoladas, nem pode ser abandonado à dispersão das soluções descoordenadas.
É mister conceber um processo, rápido e eficaz, que permita aos serviços do Justado, civis e militares, às Universidades e às empresas obter da Academia das Ciências a definição precisa e oportuna das palavras portuguesas a adoptar, consoante os casos, para traduzir expressões estrangeiras ou designar ideias novas.
E é conveniente associar a este mecanismo uma ulterior acção fiscalizadora, tão ampla e maleável quanto possível, que vigie a aplicação do que for definido e que impeça, o se necessário, reprima a ofensa das regras em vigor neste domínio. Não é estranho que sejamos mais prontos a punir um estacionamento proibido que a evitar um erro de português?
Se o Estado quiser dar o exemplo, não lhe faltarão modelos já experimentados noutros países, onde têm sido criadas comissões nas Presidências do Conselho ou nos Ministérios da Educação, para velar pela pureza da língua nos diplomas e publicações oficiais.
Outro aspecto desejo pôr à consideração de V. Ex.ª, Sr. Presidente.
Em Portugal ensina-se razoavelmente a escrever: mas a falar quem nos ensina?
Não há, de facto, essa preocupação. Pois certamente nos ensinam a falar na família e na escola primária: mas não chega! Onde se encontra entre os Portugueses a espontaneidade dos Espanhóis, a fluência dos Brasileiros ou a precisão dos Franceses?
Pelo que respeita a pronúncia, também quem se importa com isso.
Quem procurou alguma vez por exemplo, que em certas províncias do Norte, onde a pronúncia é tão feia. Se falasse com mais harmonia, como em Coimbra, essa capital da língua portuguesa, onde o falar das tricanas tantas vezes envergonhou o dos galantes "doutores" do Porto, de Braga, de Guimarães?
Quem nos ensina a falar?
Que espectáculo tão triste o de algumas aulas das nossas escolas e de certas lamentáveis entrevistas da rádio e da televisão, onde toda a gente é tratada por você e onde os entrevistados, até alguns letrados, titubeiam e se engasgam, hesitando permanentemente . . .
E que dizer do confronto, quando recebemos a visita de brasileiros ilustres, entre a nossa oratória geralmente pobre e a fluência e riqueza do português em suas bocas.
Sr. Presidente: quero aflorar um último ponto nesta breve intervenção.
Disse de começo que a nossa língua é um extraordinário instrumento político, já falado por dezenas de milhões de homens, e não é novidade para ninguém que serão muitos mais a falar a língua de Fernando Pessoa daqui a dez, daqui a vinte, daqui a trinta anos.
Uma coisa me preocupa, porém: e os passos até agora dados -e foram muitos- para conseguir a unidade do português escrito levam-me a maior preocupação ainda.