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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 179 3208

Em presença de um processo que dia a dia se vai avolumando, mercê da elevação da média de vida do homem - resultante do progresso da medicina preventiva e curativa e do progresso social -, há que - entre nós, aliás, como se processa em diversos outros países atentos ao bem-estar da população -, há que, entre nós, dizia, procurar soluções viáveis, tendentes a estruturar uma orgânica adequado às exigências de uma tão vasta problemática.
Até há pouco, psicóloga e sociólogos vêm focando este problema, mais vincadamente no meio urbano, convictos de que no meio rural, não só pelo carácter acentuadamente familiar que o caracteriza, como pela ajuda mútua que entre as gentes das pequenas povoações se verifica, e, ainda, pelo facto de cada um se sentir na obrigação de cuidar dos seus velhos, para não ser pelos vizinhos criticado, tal problema se revestia de menor gravidade.
Porém, é grande a percentagem da população idosa do meio rural, condicionada pela atracção dos jovens para os grandes centros industriais e urbanos, pelo impressionante movimento emigratório (tão acentuado no nosso país), pela mecanização agrícola e pelo regresso dos que, após a aposentação, preferem a tranquilidade do seu torrão natal. Como elemento determinante de uma maior longevidade no meio rural é de notar o afastamento dos miasmas do meio urbano, assim como da ausência dos ruídos, das poeiras e dos fumos que os grandes centros industriais ocasionam e que tão nocivos se manifestam. O ritmo mais lento da actividade rural apresenta-se como factor importante do equilíbrio nervoso, oferecendo ao homem do campo um ambiente naturalmente mais saudável no plano físico e mental.
Mais acentuada seria ainda a acção benéfica do ambiente rural na longevidade se certos factores, tais como a dureza do labor do camponês - sujeito às intempéries e às exigências de trabalhos inadiáveis em determinadas épocas do ano -, as deficiências que ainda suporta em alojamento e assistência médica, apesar de todos os esforços que têm sido realizados nesse sentido, e a acção agressiva de certos flagelos sociais (alcoolismo, cancro, etc.), a não contrariassem.
Apesar de tudo, a média da longevidade é mais elevada no meio rural o a percentagem da população idosa apresenta aí, actualmente, uma maior incidência, aliás, de tendência progressiva.
Impõe-se, pois, que para o sector rural se voltem, também, as atenções esclarecidas dos planificadores de tão instante assunto.
Uma percentagem importante das pessoas idosas do meio rural no nosso país vive em estado de equilíbrio instável, com baixo nível de vida, sem qualquer ajuda oficialmente determinada.
Os contactos permanentes que tenho mantido com o meio rural, na minha qualidade de médico de saúde pública, levam-mo a concluir que um inquérito médico-social válido às condições de vida da população idosa daquele sector forneceria uma panorâmica eloquente acerca das dificuldades com que luta grande parte daquela parcela populacional.
A habitação é normalmente mui adaptada, húmida e sombria, não possuindo na sua maioria abastecimento de água, a que torna obrigatória, em alguns casos, a utilização da água de poços, destituída de qualquer contrôle químico ou bacteriológico.
Não possui, tão-pouco, instalações sanitárias, nem mobiliário suficiente e adequado às necessidades dos velhos. Os minguados recursos de que dispõem as pessoas idosas não lhes permitem, a aquisição do vestuário indispensável, nem uma alimentação compatível com as suas necessidades nutritivas. Se totalmente incapacitadas, ei-las quase limitadas à tradicional malga de caldo, à dura enxerga e ao magro direito de se aquecerem ao sol.
Apreciando sob a mesma óptica a posição de uma importante percentagem da gente idosa do meio urbano, somos levados a concluir não ser esta menos contundente, precária e vulnerável, untes mais dolorosa e amarga, porque mais solitária, independentemente do nível económico que possa desfrutar.
A Incidência da concentração, e, portanto, a obrigatoriedade da vida colectiva que se verifica no meio urbano, e que é fruto da civilização industrial, fomenta, não poucas vezes, o aparecimento de deficiências e perturbações, não só físicas, como morais.
A presença de velhos - a crescente presença de velhos- na cidade determina problemas de carácter social, económico e até político.
Sob o ponto de vista social, quer viva isolado, num desconforto total, sujeito à caridade das instituições e dos vizinhos mais ou menos disponíveis, quer atravancando o lar já exíguo dos seus parentes (onde tantas vezes se amontoam três gerações com os seus problemas díspares), a vida do velho é sempre difícil, sem qualquer ajuda monetária que, ao menos sob esse aspecto, suavize o ambiente que o cerca. É, sem dúvida, neste meio que o problema económico adquire uma maior acuidade. Ai, o orçamento' terá de ser rigorosamente equilibrado em função das necessidades a enfrentar e a presença, a mais, do uma pessoa idosa perturbará infalivelmente a débil consistência do lar, desde que aquela não possua uma reforma ou pensão de invalidez susceptível de cobrir as despesas que ocasiona.
A consciencialização do velho - espontânea ou apontada - do encargo que constitui para os seus familiares é, psicologicamente, traumatizante e destrói brutalmente a esperança de uma velhice tranquila que sempre idealizara e à qual efectivamente tem direito. Também o contacto com pessoas da sua idade e extrafamiliares constitui elemento indispensável para a manutenção da sua higiene mental, impedindo-o de criar os complexos que as limitações da senescência facilmente proporcionam.
Apesar de todas estas deficiências, porém, o grande drama do velho do campo, como da cidade, reside ainda na doença, quer ela sobrevenha bruscamente, quer ela traduza a decadência progressiva da idade.
A debilidade económica, por um lado, e um certo pudor de desvendar a sua decadência física, por outro, impelem-no a adaptar-se aos seus achaques, só recorrendo ao médico tardiamente. Este estranho comportamento, porém, apenas traduz uma adaptação da sua condição às suas necessidades. A diminuição física, com a longa sequência de limitações que acarreta, constitui, para ele, uma fonte permanente de traumatismo psicológico.
Sempre, entre nós, se procurou suavizar os duros problemas da velhice, como o atestam a existência -a longa existência de vários séculos - dos Recolhimentos da Capital.
São eles:
O Recolhimento de Santos-o-Novo;
O das Merceeiras d'El-Rei;
O de S. Cristóvão;
O do Grilo:
O da Encarnação.
E, ainda, o Lar de Santo António e o Lar de Santa Clara, todos actualmente integrados no Instituto de Assistência aos Inválidos pelo Decreto-Lei n.° 35 108, de 7 de Novembro de 1945.