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14 DE MARÇO DE 1969 3499

acção fiscalizadora dá Inspecção-Geral das Actividades Económicas.
Esta actuação originou um clima de angústia, vivido pela generalidade dos comerciantes. Não foi apenas no Porto ou em Castelo Branco que as reacções existiram. Elas vieram de todos os pontos do País, do Norte ao Sul do continente, da Madeira e dos Açores, de grémios, sindicatos, uniões e federações, de câmaras municipais e de simples comerciantes.
Entidades e pessoas que não tenho ainda o prazer de conhecer pessoalmente enviaram mais de três centenas de cartas e telegramas, em representação de muitos milhares de comerciantes, apoiando calorosamente os pontos de vista que tive a honra de defender nesta Assembleia e, ao mesmo tempo, pedir do que continuasse a lutar pela justiça dos seus legítimos direitos.
Não há o perigo de qualquer prejuízo para o consumidor quando o comércio apenas procura que lhe sejam asseguradas as condições necessárias à sua existência.
Os interesses do consumidor também não são apenas defendidos com preços baixos, pois também é indispensável um abastecimento regular de bens e serviços postos à disposição daquele nos locais onde são necessários.
Um preço que não cubra todos os custos de um produto só pode ser temporariamente praticado pelo comerciante ou então se lhe for possível obter compensação noutros produtos que vende.
Há, portanto, ainda que considerar se valerá ou não a pena permitir a marcação de preços de venda com bases diferentes para os artigos essenciais e não essenciais ao consumidor economicamente mais débil.
E não se diga que os consumidores estão geralmente desprovidos de qualquer defesa, a não ser a acção fiscalizadora.
O Prof. Robert Dorfmam, da Universidade de Harvard, em livro publicado nos Estados Unidos em 1964 e em Portugal no ano passado, dizia o seguinte:

Adam Smith tinha razão. O mercado força o homem a responder rigorosamente pela qualidade da sua empresa, sem ter em conta os seus eventuais protestos. Nenhuma outra instituição social age com uma firmeza tão implacável; nenhuma outra é tão difícil de iludir. O balanço põe a descoberto a falta de eficiência, e ao obstante os maiores esforços dos consultores encarregados das «relações públicas», e os concorrentes cobiçosos encarregam-se de desmascarar a mercadoria falsificada e minam os preços exagerados. A pressão em direcção ao equilíbrio é demasiado implacável para que se possa resistir.

Há, pois, que ponderar com todo o cuidado e desapaixonadamente os interesses em causa.
Não deve continuar a fomentar-se qualquer clima de ódio ou de reserva do consumidor relativamente ao comerciante, o que só poderá contribuir para a desunião do povo português, tão inconveniente em qualquer circunstância e, sobretudo, na época em que vivemos.
Não podem pessoas responsáveis deixar tentar-se por declarações tendenciosas e, talvez, mesmo demagógicas.
O homem do povo é sensato, mas necessita de ser esclarecido que se pretende apenas defender uma forma de equilíbrio e um princípio de justiça que não obrigue o justo a ter de demonstrar no tribunal que não é injusto, apenas porque a lei o não defende suficientemente.
O caso em apreciação já tem, porém, demasiada repercussão pública e, talvez, não deva ser resolvido simplesmente «em família», como foi preconizado na recente reunião efectuada na União de Grémios dos Comerciantes do Porto.
Além disso, confirma ser necessária a definição de princípios que possam realizar o equilíbrio entre todos os interesses, e justiça para todos os cidadãos. E seja-me ainda permitido recordar alguns pontos de vista essenciais à apreciação do problema que tive a honra de expor a esta Assembleia no passado dia 5.
Afirmou-se então que a actuação em curso dos fiscais da Inspecção-Geral das Actividades Económicas tinha como fundamento legal o artigo 24.º- do Decreto-Lei n.º 41 204, datado de 1957, que nunca teve aplicação generalizada quanto à caracterização de crimes de especulação, pela impossibilidade logo verificada, após a sua publicação, de conter dentro das margens previstas todas as despesas inerentes ao exercício regular do comércio na generalidade dos estabelecimentos comerciais então existentes no País.
Deve ainda referir-se que este artigo 24.º é, praticamente, a reprodução do artigo 1.º e seu § único do Decreto n.º 8724, de 21 de Março de 1923, onde, porém, se não encontra qualquer disposição que presuma que as despesas não excedem 7 por cento da soma do preço de aquisição ou de reposição e do custo do transporte.
Sobre este assunto o Exmo. Sr. Inspector-Geral das Actividades Económicas declarou aos jornais, em 6 de Fevereiro, que se obrigaria o comércio retalhista a cumprir as percentagens de lucro legal, mais a de encargos gerais, esta nos termos da lei, sempre possível de ser ilidida pelo comerciante, mediante prova conveniente a submeter ao prudente arbítrio do julgador.
Porém, no passado dia 11, na reunião efectuada na União de Grémios dos Comerciantes do Porto, o mesmo Exmo. Sr. Inspector declarou que «desde o começo da intensificação da campanha fiscalizadora foram ciadas instruções para que não se levantassem autos aos comerciantes que estivessem a levar percentagens inferiores a 36 por cento, quando as da lei eram apenas de 23,5 por cento.
Ora, perante estas duas declarações opostas sobre o mesmo assunto, acabo por não saber quais foram realmente as instruções inicialmente dadas à fiscalização se esta usou desde o início de medidas contemporizadoras, como ainda se afirmou.
Também na minha anterior intervenção preconizei a revisão do Decreto-Lei n.º 41 204 ou, em alternativa, a fixação, pelo Governo, de um critério especial para determinações do limite de despesas a considerar para efeito de lucro líquido, conforme se encontra previsto no n.º 3 do artigo 24.º daquele decreto-lei.
Sobre este assunto a imprensa noticiou que o Exmo. Sr. Inspector-Geral não é de opinião que se proceda a uma revisão de lei, uma vez que o comerciante pode, em caso de qualquer processo, apresentar nos tribunais documentos justificativos de que os 7 por cento são incompatíveis com os encargos da firma.
Fico realmente espantado que se possa preconizar que o comerciante continue permanentemente com as espadas da lei e da fiscalização assentes sobre o seu estabelecimento, prontas a cair em qualquer altura que um fiscal se lembre de levantar um auto, para justificar o ordenado que recebe no fim do mês.
Estas afirmações causam-me a maior apreensão, por recear que não seja praticável continuar o diálogo entre o comércio e a Inspecção-Geral, enquanto este não revelar uma disposição sincera de estudar uma solução, a partir de bases justas, com realismo e actualidade.
Poderá utilizar-se o Decreto-Lei n.º 41 204 - mas devidamente regulamentado -, pois continua a ser indispensável que o comerciante possa exercer a sua actividade sem receio de tribunais, desde que cumpra a lei.