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14 DE MARÇO DE 1969 3505

exposto a ser iludido pela fraude. Sabemos, outrossim, que o tecnicismo frio dos serviços, muito embora prestantes e afinados, não supre a falta de consciência do interesse próprio por parte dos beneficiários; só o calor de uma instituição viva e próxima pode ajudar a formá-la.
Resultam do texto, com apoio tanto do explícito relatório que o antecede quanto do magnífico parecer da Câmara Corporativa, as coordenadas do sistema. Assentam nitidamente em termos de estreita colaboração entre os serviços da previdência e a organização corporativa rural; visam a utilização do muito ou pouco com que ambos os sectores possam contribuir para benefício mútuo e para o proveito comum.
Tal perspectiva atenuará a surpresa com que observadores desprevenidos encaram uma virtual incongruência do texto; que o texto aqui avolume a posição das Casas do Povo, quando além, em idêntica matéria, pronunciadamente a restringe.
Trata-se, afinal, de dois planos inconfundíveis. Onde a instituição tende a ser desapossada da competência de acção directa; onde a natureza essencial a conduz a avocar influência crescente como intermediário entre serviços, distantes e viciados em actuação uniforme, e os meios rurais, próximos e diversificados, que devem tornar-se-lhes acessíveis, no múltiplo significado que a palavra comporta. De facto, em sazão dialogante, bem vai que dialoguem os relógios da cidade e os da aldeia; e já agora, para evitar o perturbador desencontro das horas, que aprendam a lição do apólogo e reciprocamente «se vejam os jogos, como bons parceiros ...».
O seu objecto, a poder incidir no que mais convém, excederá o intercâmbio das relações burocráticas, para se ajustar à revelação dos segredos das implicações regulamentares e, na recíproca, ao escancarar das realidades mais ou menos agradáveis com que terão de conviver os que as imponham.
Suponho, Sr. Presidente, que o caminho é praticável. Assim o caminhemos com prudência, mas dispostos a não retroceder. Bem podem então esfumar-se todos os legítimos receios inerentes ao abandono de uma tradição. E obter-se, não direi simultaneamente, digo conjuntamente: o princípio de seguro rural em que o Governo põe o melhor empenho e a que dá reconhecível prioridade; a cobertura pela previdência da população activa em toda a área metropolitana; a valorização da Casa do Povo enquanto organismo de cooperação social, como a viu o legislador de 1933.
E com isto retorno às minhas afirmações iniciais, mas já desprendido das duvidais que continham.
Sr. Presidente: Condição necessária do êxito relativo do sistema proposto será o equilíbrio com que, em termos absolutos, lhe medirmos as ambições.
Diminuídas, conseguiríamos desmobilizar a soma de vontades despertas pela expectativa que justificadamente se criou no País. Mas se as exagerássemos, poderíamos forjar desajeitadamente incómodos contratempos.
A proposta de lei, até porque é um documento sério, merece a justiça de ser bem compreendida: no que garante a curto ou médio prazo e no que reserva para mais tarde.
A leitura do relatório, tal-qualmente a do parecer da Câmara Corporativa, ajuda, aliás, a delimitar-lhe os propósitos, advertindo de que o seguro dos trabalhadores rurais será efectivado em três fases e de que por agora cuida tão-só de contemplar a primeira.
Chegam, nos primeiros embates, para desafiar toda a argúcia, firmeza e generosidade acumuladas, as dificuldades de montagem e funcionamento do regime de abono de família, num meio em que a situação profissional é fluida, a identificação dos beneficiários trabalhosa, contestada a solidez económica de uns tantos contribuintes.
Estas e análogas dificuldades estimularão, entretanto, a pertinácia e a prudência, o desembaraço e o bom senso. A proposta enquadra-se no desiderato de proceder à extensão gradual da previdência aos trabalhadores agrícolas. Tenderá ela para o esquema da dos mais trabalhadores portugueses, o que não significa que venha a equiparar-se-lhe de todo.
Sem embargo dos ajustamentos, das rectificações de pormenor que a prática aconselhe, o ritmo de progressão não comporta oscilações (quero dizer, retrocessos muito ou pouco acentuados), cujos efeitos psicológicos seriam desastrosos. Os eventuais passos em falso impediriam inclusivamente o que, em escorreita terminologia militar, se intitula exploração do sucesso.
Apenas mais duas notas, muito ligeiras, à margem da proposta.
A questão em debate não pode ser isolada do problema mais vasto, e profundo, e preocupante, que é universalmente o da transformação da sociedade rural e da crise da economia agrária.
A carência de protecção social eficaz constitui uma causa da depressão do sector, mas também o efeito da situação geral, que na ordem lógica a precede e na ordem dos factos a transcende. Em consequência da solução feliz que lhe demos, algo virá por acréscimo; não teremos de uma assentada satisfação cabal a tudo o mais. Há outras palavras a dizer.
E as incidências políticas da aprovação e da execução da lei? Pois esperemos que contrabalancem o desagrado de quem se julgue mal onerado com encargos, ou mal excluído de benefícios, a gratidão de quem recebe justiça e o aplauso do desinteressado de quem sempre se regozija quando justiça foi feita. Será, decerto, a grande maioria dos portugueses.
Sr. Presidente: Não sei se nalgum ponto as minhas palavras, por excesso ou por defeito, desmereceram das conveniências da discussão. Procurei, em todo o caso, circunscrever-me, que não por escrupuloso respeito, respeito excessivo das injunções regimentais, ao exame das linhas dominantes da proposta.
Confio em que, ao passar de tão largo por um articulado denso de conteúdo e digno, por isso, de levantar inúmeras questões de especialidade, tenha conseguido dar fundamento bastante ao meu voto, que é a aprovação na generalidade do texto que nos foi presente.
Possam as normas legais aqui decretadas servir a justiça devida ao homem da terra e à «terra humilde», que nos momentos cruciais, como escreveu Salazar, sobem «à culminância dos heroísmos desconhecidos e dos valores inestimáveis».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Melo Geraldes: - Sr. Presidente, Srs.. Deputados: A proposta de lei em discussão deveria merecer o meu inteiro apoio, porque o contacto, já dei certo modo longo e directo, com as Casas do Povo não me deixava dúvidas sobre a necessidade de uma reorganização destes organismos que os aproximasse mais das realidades e os tornasse capazes de desenvolver e alargar de entre as suas muitas e ambiciosas aspirações aquelas que são realizáveis e compatíveis com as possibilidades do meio rural e porque a extensão da previdência aos trabalhadores agrícolas se me afigura de há muito, conforme já tive ocasião de