O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

8 DE JANEIRO DE 1971 1279

A lavoura também merece e espera, resposta pronta e oportuna a esta pergunta, que há algum tempo vem fazendo.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Costa Ramos: - Sr. Presidente: Na sessão de 10 do Dezembro teve a Câmara ensejo de ouvir as oportunas e judiciosas considerações do Sr. Deputado Maximiliano Demandes sobre o que em matéria de fomento pecuário se observa na província de Moçambique, em particular quanto à produção de carne, de leite e de lacticínios.

O quadro que desenhou é pouco animador. Com efeito, bastava atentar no seguinte:

No que se refere à carne, se o efectivo bovino não aumentar a sua taxa anual de crescimento (situada entre 2 a 8 por cento), é de prever que a curto prazo a produção não possa sequer satisfazer as necessidades do consumo interno, a evoluir muito rapidamente, na resultante, tanto do aumento da população como da melhoria do seu nível de vida. E, no que respeita ao leite e aos lacticínios, não poderá ser mais tranquilizadora essa previsão, porquanto, incidindo as mesmas motivações sobre uma produção que se tem mantido praticamente estacionária no último quinquénio - e já só cobre uma quarta parte da procura interna -, as vultosas importações hoje efectuadas para colmatar o déficit verificado tenderão forçosamente a elevar-se, com os consequentes reflexos na balança de pagamentos e na economia das explorações leiteiras da província.

Sabendo-se que Moçambique tem confirmadas potencialidades para a produção de carne e de leite, que os factores agro-climáticos limitantes são susceptíveis de serem dominados e controlados, que a situação sanitária da província em doenças infecto-contagiosas, parasitárias e de infestação glossínica, embora ainda não completamente resolvida, apresenta perspectivas de uma solução favorável, que o País dispõe de técnica capaz de pôr em marcha qualquer empreendimento de exploração animal com vista à criação racional de bovinos de carne e de leite, que a província é um mercado potencial para a absorção de mais carne e mais leite, que o mundo "esfomeado" de carne poderá absorver toda a produção excedentária do consumo interno a preços compensadores, e que o desenvolvimento pecuário é uma das melhores formas de alargar o povoamento, fixando as populações á terra e garantindo-lhes melhor e mais rápida promoção social, poderá perguntar-se por que é que se chegou ao estado de coisas referido, que já custa, e mais poderá custar, algumas centenas de milhares de contos á economia moçambicana?

Da intervenção do ilustre Deputado pelo ciclo de Moçambique e da leitura de algumas publicações de entidades ligadas à actividade pecuária ultramarina extrai-se que os factores responsáveis por tal situação serão essencialmente os seguintes:

Uma política de preços de carne que se afasta das realidades e das tendências do contexto económico em que se insere, não retribuindo suficientemente os factores de produção, de modo a estimular os investimentos;

Uma política pautal que no domínio do leite e dos lacticínios só tem contribuído para a estagnação da produção e para o desencorajamento das iniciativas tendentes a criar condições de auto-suficiência, consentindo, liberalmente, a entrada de lacticínios já em estado de adiantada transformação sob a designação de "matérias-primas", aliás colocadas na província em condições que legitimam forte suspeita de dumping;

Uma política de terras que, além das incidências desfavoráveis sobre o povoamento, limita o recurso ao crédito, na medida em que para fins pecuários apenas consente no regime de arrendamento de terrenos, e ainda com a inexplicável condição de nas concessões não poderem ser incluídas lagoas ou pequenos cursos de água, que poderiam valorizar esses arrendamentos;

Uma política de crédito que assenta bastante no conceito de que este se deve basear sur des hipoteques et par sur des hipotèses, isto é, uma política excessivamente exigente no tocante a garantias e da qual o crédito de capacidade se encontra arredado:

Uma política tributária - refiro-me ao imposto de rendimento sobre as explorações agrícolas - que teria a sua justificação se a pecuária da província se encontrasse numa fase mais adiantada de desenvolvimento, mas que na fase actual só poderá contribuir para dificultar a sua promoção; e ainda

Uma política de infra-estruturas (ensino, formação de mão-de-obra qualificada, assistência técnica, divulgação e investigação) a carecer de uma reestruturação imediata, como condição indispensável para se obter com a rapidez desejável a valorização zootécnica e económica do armentio, e na qual se deve assinalar como defeito relevante a insuficiência dos quadros dos serviços provinciais ligados à pecuária e a sua má retribuição.

Ao que se acaba de referir sobre Moçambique poderá acrescentar-se que em Angola, território que não oferece menos condições para a produção pecuária, por motivações quase idênticas, as coisas se passam semelhantemente.

Na verdade, aqui, como em Moçambique, sobre a pressão de uma explosão demográfica que atinge taxas bastante elevadas, e na resultante de uma crescente melhoria de poder de compra - fruto inquestionável do surto de progresso económico registado -, corre-se o risco de em pouco tempo a província poder passar da posição de exportadora de carne para a metrópole para a de importadora, e de as importações de lacticínios, que se têm continuado a acentuar, apesar dos aumentos ultimamente verificados na produção, virem a atingir volumes susceptíveis de pesarem de forma expressivamente desfavorável no comércio externo da província, quadro este onde pesa, como agravante não despicienda, a circunstância de 80 por cento do efectivo bovino se encontrarem nas mãos de criadores tradicionais, dos quais, pelo seu estado de desenvolvimento, não é de esperar, em futuro próximo, uma resposta àquilo que deles se desejaria, com vista á integrar as suas explorações numa política harmónica de desenvolvimento pecuário.

Não cabe numa intervenção desta natureza uma análise mais aprofundada, que poderia fazer, das motivações apontadas e de outras que estão na base deste delicado problema, mas julgo ter dito o suficiente para legitimar agora algumas perguntas.

Ter-se-á o Governo apercebido das consequências que o atraso verificado no sector poderá trazer para o sustento das populações tradicionais naquilo de que eles estão mais carecidas - as proteínas de origem animal - e para o abastecimento do espaço português em carne e leite?

Terá o Governo pensado que a incapacidade para expandir a oferta de alimentos ao ritmo do crescimento da procura pode constituir um sério obstáculo ao cresci-