17 DE JUNHO DE 1971 2045
Continuaremos com aprumo e tenacidade a árdua tarefa que sobre nós pesa, na confiança e na esperança de construirmos, dia a dia, um futuro melhor para toda a comunidade portuguesa, na profunda convicção de que as nossas instituições, renovadas quando necessário, mantidas quando não careçam de adequação, são aquelas que, brotando do génio nacional e da nossa experiência secular, procuram traduzir e defender no decurso dos tempos os interesses superiores do País, único objectivo que também agora dita e orienta a acção de quem o serve com a maior nobreza e com a mais alta dedicação.
Na devida oportunidade desenvolverei, Sr. Presidente, a matéria de que nos estamos a ocupar.
Neste momento desejaria apenas acrescentar o seguinte: a indispensável e profícua colaboração entre os órgãos da soberania, índice seguro da harmonia e da eficácia do sistema, não só na sua construção doutrinária, mas ainda na prática corrente da vida política e administrativa do Estado, materializa-se e realiza-se naturalmente, ia a dizer habitualmente, por força das suas virtualidades próprias, oferecendo o Governo agora mais um exemplo altamente significativo dessa harmonia funcional, ao dar a sua concordância às conclusões propostas pela comissão eventual, que nela obtiveram vencimento.
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Neto Miranda:-Sr. Presidente: O Sr. Presidente do Conselho veio em 2 de Dezembro último a esta Casa para apresentar a proposta de lei sobre a revisão constitucional. E fê-lo usando uma forma introdutória do maior alcance político, já que se tratava de apreciarmos o texto constitucional nas modificações ou alterações de conteúdo ou de forma, incontestavelmente relevantes para o conhecimento político do Governo, institucionalizando-o na Nação.
Usou o Sr. Presidente do Conselho de uma linguagem simples, porque nada desejava que ficasse por esclarecer. E quem, na quietude da sua independência e nos votos da sua boa fé, quis ouvir e meditar, encontrou estímulo, apoios de segurança e motivos renovados de esperança.
Tudo simples, tudo claro, tudo transparente, tudo compreensivelmente esclarecedor das razões que se indicam convenientes às modificações sugeridas pelo Governo como determinantes de uma actuação mais condizente com os estádios político-económicos, com os fins da melhoria social em que todos estamos e devemos continuar empenhados em ver atingidos. O Presidente Salazar - que tanto pugnou pelo progresso, prestígio e dignificação da Nação -, sempre que julgou oportuno, não deixou de movimentar os órgãos da acção governativa para que todos compreendessem, fosse qual fosse a latitude em que se encontravam, como era indispensável que essa movimentação se apoiasse numa acção política.
Sr. Presidente: Entrou em discussão na generalidade a proposta de lei da revisão constitucional.
Já em 16 de Dezembro do ano findo tive ocasião de deixar nesta Assembleia um apontamento sobre o conteúdo ida proposta e das suas incidências no estatuto político-administrativo das províncias ultramarinas e signifiquei, então, que as alterações introduzidas buscavam uma autonomia melhor definida, uma descentralização menos confusa e uma desconcentrarão de poderes mais significativa.
Pois, decorridos alguns meses, não vejo grandes razões para alterar o pensamento que me guiou numa linha de integração ide natureza política, aquela que melhor serve o conjunto de interesses da Nação.
Quem, por razões que não é necessário apontar, vive no ultramar durante anos e se afeiçoou à terra e às gentes, sendo parte daquela família que tem como acanhados limites largos horizontes e a imensidade do coração humano, impende-lhe a obrigação de sabei- como se encontra devidamente acautelado o interesse público, a definição dos direitos que cabem aos poderes autárquicos, o limite das competências dos órgãos gestores, as garantias individuais indispensáveis à dignificação humana, em suma, a obrigação de saber se o imperativo jurídico que comanda o ser Estado considera, na estrutura política e administrativa das parcelas que o compõem, o índice de gestão que forma uma nação.
Ora, é precisamente esta análise que eu desejo fazer, ao ter presente que a revisão constitucional visou, relativamente ao ultramar, definia princípios essenciais, limitá-los para defesa da integridade da soberania do Estado, da unidade da Nação e da solidariedade das suas parcelas.
Sabendo-se que no capítulo VII da actual Constituição as disposições constitucionais relativas ao ultramar se compreendem em 42 artigos e agora na proposta- de lei se limitam a 4, é natural a surpresa da diferença e a curiosidade em indagar-se do que falta ou do porquê da redução.
Ora vejamos:
No artigo ,5.º da proposta de lei, que só em parte corresponde ao actual artigo 5.º da Constituição, afirma-se um princípio, ou melhor, reafirma-se que a autonomia das províncias ultramarinas se exerce através de uma organização político-administrativa adequada à situação geográfica e às condições do meio social, como o artigo 134.º da Constituição vigente tão significativamente já considera esse comando jurídico da gestão ultramarina.
Mas este princípio, que não perturbava os sentidos e encarava realidades de ordem administrativa e mesmo política, tem hoje uma limitação indispensável, aliás para defesa precisamente do seu próprio conteúdo e das ligações que a própria natureza da soberania do Estado deve acautelar.
Por outro lado, e analisando a disposição proposta no contexto dos princípios constitucionais que cogulam o poder do Estado, quando no artigo 5.º se diz que a unidade do Estado compreende regiões autónomas com organização política e administrativa adequada à sua situação geográfica e às condições do respectivo meio social (à semelhança do artigo 134.º da Constituição vigente), significa-se que a Nação constitui um Estado independente com soberania una e indivisível, para logo nos artigos 134.º a 136.º se frisar que essa soberania se exerce por forma adequada, com desconcentração de poderes, descentralização administrativa, autonomia financeira, competência legislativa própria à definição da sua gestão. Tudo sem prejuízo de os órgãos de soberania manterem os poderes indispensáveis à defesa da sua integridade e unidade da Nação, da superintendência na administração das regiões autónomas, da fiscalização da sua gestão financeira, da integração da economia de cada província na economia geral da Nação e da revogação das leis quando contrariem os interesses nacionais ou ofendam as normas da Constituição ou as provenientes do Governo Central.
Quando no artigo 135.º se refere que a autonomia das províncias ultramarinas compreende o direito de legislar, através de órgãos próprios, o direito de assegurar a execução das leis na administração interna, o direito de dispor das suas receitas, o direito de possuir ou dispor do seu património, o direito de «possuir regime económico