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2166 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 107

Daí as preocupações tantas vezes expressas em termos que chegam a ser alarmantes.
Reconheçamos que tais preocupações são ditadas por um nobre patriotismo, mas .não deixemos também de reconhecer, a frio, que o cobiçoso inimigo que nos espreita contará sempre anais com a nossa firme determinação de lutar pela integridade do nosso património nacional do que com a legislação constitucional do nosso país. Essa servirá, essencialmente, a orgânica político-administrativa e a sensibilidade dos Portugueses.
Sensíveis às qualificações honoríficas numa linha tradicional, os portugueses do ultramar poderão procurar «no progresso social e na complexidade da Administração» merecimento para uma honraria em que mais acarinhados se sintam pela Mãe-Pátria.
Não haverá motivo para preocupações se tudo se processar com esta boa fé e simplicidade. E a complexidade deste problema não pode deixar de ditar um voto de confiança a quem está colocado numa posição que domina os superiores interesses da Pátria em todas as coordenadas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Carlos Ivo: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Para todos e qualquer um dos representantes do povo português que tomam assento nesta Assembleia, o assunto sobre o qual temos de nos pronunciar reveste-se de tal importância e de tão magna responsabilidade que difícil se torna não nos sentirmos pequenos perante a tarefa a cumprir.
Somos chamados, na verdade, a estabelecer princípios, a definir conceitos e a traçar rumos pelos quais a Nação se regerá nos anos vindouros, e não será inoportuno tomarmos consciência de que a margem de erro, que a delicadeza da conjuntura actual nos concede, é absolutamente mínima. De facto, as alterações propostas incidem sobre uma diversidade de temas, cujo alcance se estende desde o âmbito além-fronteiras do estatuto dos brasileiros em Portugal até à competência da Assembleia Nacional, à defesa da Constituição, à situação constitucional das províncias ultramarinas e à definição dos direitos, liberdades e garantias individuais do cidadão.
Que honra a Nação nos concede ao permitir-nos contribuir para a escolha destes caminhos a seguir!
Que honra, mas que responsabilidade!
Sr. Presidente: As conclusões a que vamos chegar e as decisões que se vierem a tomar terão de, necessariamente, ficar exaradas em palavras, que, na frieza da letra da lei, no «preto no branco», nunca serão tão exactas e cuidadas que se situem além das tendenciosas e más interpretações que lhes queiram atribuir. E precisamente por isso, Srs. Deputados, que considero indispensável apoiarmos as fórmulas finais a que chegarmos com declarações de intenção e de espiritualidade que sirvam de esclarecimento para afastar quaisquer dúvidas de interpretação que possam surgir no futuro.
Esta tribuna concede-nos, certamente, a oportunidade de imprimir à lei em revisão o espírito latente de que ela carece para ter vida e para poder servir os objectivos para que foi enunciada.
E é dentro desta ideia e intenção que me permito tecer algumas breves considerações acerca da proposta de lei que se encontra perante esta Assembleia.
Não só por me faltarem conhecimentos para apreciar as facetas de timbre mais técnico e jurídico da proposta, mas principalmente por ser um dos representantes do círculo eleitoral de Moçambique, limitar-me-ei a comentar apenas os aspectos que referem em particular às relações do nosso ultramar com a parcela metropolitana do todo, uno e indivisível que é a Nação Portuguesa.
O conceito de estatutos especiais para a organização político-administrativa das várias províncias ultramarinas encontrava-se definido desde a revisão constitucional de 1951, e até anteriormente se baseava no princípio de que esses estatutos seriam adequados à situação geográfica e às condições do meio social dessas diversas parcelas do território nacional.
Por outro lado, o texto actual do artigo 134.º refere que «a organização político-administrativa deverá tender para a integração no regime geral de administração dos outros territórios nacionais».
A meu ver, e perante a imagem que por certos sectores é hoje dada à palavra «integração», este texto é dos que de forma mais premente necessita de revisão e de definição. Pois se a integração puramente política foi, continua a ser e será sempre uma realidade que se traduz pela unidade nacional, e dela constitui um substrato indiscutível, já a ideia de uma integração administrativa parece estar em franca contradição com o conceito da diferenciação exigida pelas situações geográficas e condições do meio social das várias parcelas do território nacional.
Assim, torna-se clara a intenção e a razão de ser da nova redacção do artigo 134.º na proposta de lei apresentada pelo Governo, à qual desde já dou o meu aplauso.
Paralelamente, surge pela primeira vez a palavra «autonomia» no seu sentido mais lato, quando anteriormente o termo era usado apenas quanto à autonomia financeira das províncias ultramarinas, conforme está consignada no artigo 148.º da Constituição.
Eis-nos, portanto, perante um exemplo frisante de uma má interpretação a que a letra da lei, só por si e como já referi, se pode expor. Não é segredo para ninguém que a palavra «autonomia» tem provocado sérias dúvidas e apreensões em certos espíritos.
Na declaração de voto de um digno procurador à Câmara Corporativa afirma-se que a referência à autonomia das províncias ultramarinas «tira vigor à declaração de unidade e é inútil na medida em que esta autonomia nada tem que ver com unidade nacional». Em que ficamos então?
Se nada tem que ver com a unidade nacional, como é que tira vigor à declaração dessa mesma unidade nacional? E será tão inútil como se quer fazer crer?
Não é verdade que já no artigo 148.º estava garantida às províncias ultramarinas a descentralização administrativa?
O que resultou dessa garantia?
Pouco ou muito, não sei. O que sei é que esse pouco ou muito não foi o suficiente para facilitar o desenvolvimento cada vez mais vigoroso do nosso ultramar. Urge pois a adopção de uma nova fórmula que encerre os meios indispensáveis à criação de estruturas à altura das necessidades administrativas das províncias ultramarinas; uma nova fórmula que coloque, além da burocracia tradicional, agravada pela distância, o desejo de progredir; uma nova fórmula que permita, sempre dentro dos superiores interesses da Nação, um certo grau de autodefesa legislativa contra os interesses egoístas de certos sectores, normalmente comandados à distância.
Enfim, uma mais racional distribuição de competências.