O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

24 DE JUNHO DE 1971 2167

Propôs o Governo que a esta nova fórmula se desse a designação de «autonomia». A sua virtude e os seus objectivos situam-se na sua definição, e não no rótulo que lhe é dado. Assim, e muito bem, entendeu o Governo ao desenvolver os artigos 135.º e 136.º, definindo direitos e assinalando obrigações, tudo dentro de um espírito prático e de uma noção das realidades correntes.
Mas esta sinceridade e realismo por parte do Governo nem por todos foi compreendida e aceite. Motivada por vários sentimentos, que podem ir desde o interesse particular até, concedamos, à convicção sincera que se apoia em conhecimentos escassos ou menos exactos, desenvolveu-se uma certa campanha de oposição contra a proposta de lei apresentada pelo Governo, campanha essa especialmente dirigida ao sector que diz respeito ao ultramar.
A situação obrigou o Sr. Presidente do Conselho a prestar à Nação o seguinte esclarecimento, que cito da «conversa em família», em 15 de Fevereiro deste ano:

Tem-me chegado aos ouvidos com certa insistência que em determinados meios o regime de autonomia das províncias ultramarinas é apresentado como significativo de uma intenção se não de abandono pelo menos de destruição da unidade e da integridade da Nação.
Esse pensamento não o tem a gente do ultramar, que sabe muito bem o que é que significa a sua autonomia.

Mas, como parece também que há pessoas que ainda não entenderam o que significa para nós, portugueses do ultramar, o conceito de autonomia, aproveito a oportunidade para, como um dos representantes das gentes moçambicanas, dar a essas pessoas um breve esclarecimento sobre o que esperamos dessa autonomia e como a compreendemos: partindo da aceitação, que será sempre disciplinada, das grandes directivas políticas ao nível nacional, e que têm de emanar do Governo Central, desejamos que, à medida que mostrarmos capacidade e maturidade para tal, os problemas de âmbito provincial possam ser resolvidos pelos órgãos de gestão pública que a proposta de lei pretende pôr ao nosso dispor.
Assim definimos a «crescente autonomia» que tanto receio infunde a alguns, e que se resume, ao fim e ao cabo, numa simples descentralização administrativa.
E, afinal, porque é que é tão simples como isto? Por causa de uma circunstância, de um estado de espírito, chamemos-lhe até uma mística, que pela sua singeleza e naturalidade nem merece ser avaliada e muito menos posta à prova: é o de sabermos que nenhum de nós pensa sequer em deixar de ser português!
O facto de não gostarmos de ser governados à distância nada tem que ver com a unidade nacional; direi mesmo que até dentro da província não gostamos de ser governados à distância. O desejo de progredir e as frustrações resultantes dos entraves de vária ordem que nos têm afligido ao longo de tantos anos não constituíram nunca motivo de revolta, mas sim, por vezes, de desânimo e de ressentimento; de desânimo quando se pressente falta de conhecimento dos interesses locais e de ressentimento quando se vislumbram manifestações e desinteresse por esses problemas; ou ainda, o que é mais grave, quando se adivinham mal disfarçadas e imerecidas protecções a interesses particulares.
Creio poder afirmar, em nome das gentes que aqui represento, e afirmá-lo com consciência e sinceridade, que o desenvolvimento e progresso das províncias ultramarinas só se poderá processar mediante uma efectiva e real descentralização administrativa que conduza ao bem comum das populações do ultramar no aspecto económico e social.
E que ninguém diga que o engrandecimento de qualquer parcela do nosso território vai prejudicar o conjunto nacional!
Nós, do ultramar, confiamos na nossa capacidade de iniciativa para contribuirmos para um Portugal melhor, para um Portugal maior; mas, para tal, necessitamos das condições de trabalho, que esperamos alcançar pelas vias que a proposta do Governo nos oferece e define.
Por isso dou o meu inteiro apoio na generalidade à proposta de lei que vamos discutia: e, ao terminar, Sr. Presidente, faço-o talvez de uma maneira pouco usual: termino com uma pequena oração - muito antiga e cheia de significado -, uma breve invocação na qual espero que todos me acompanhem, pedindo a Deus que nos conceda três dádivas:

A coragem para mudarmos aquelas coisas que podem e devem ser mudadas;
A paz de espírito para aceitarmos com serenidade aquelas coisas que não podem ser mudadas;
E a sabedoria para distinguirmos entre umas e outras.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

Orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão.
Os trabalhos prosseguirão na sessão da tarde, à hora regimental, com a mesma ordem do dia. Está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Agostinho Gabriel de Jesus Cardoso.
António de Sousa Vadre Castelino e Al vim.
Augusto Salazar Leite.
Camilo António de Almeida Gama Lemos de Mendonça
Carlos Eugênio Magro Ivo.
Delfim Linhares de Andrade.
Deodato Chaves de Magalhães Sousa.
Fernando David Laima.
Francisco Correia das Neves.
Francisco José Pereira Pinto Balsemão.
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro.
Henrique Veiga de Macedo.
João António Teixeira Canedo.
Joaquim Jorge Magalhães Saraiva da Mota.
José de Mira Nunes Mexia.
José Vicente Pizarro Xavier Montalvão Machado.
Júlio Dias das Neves.
Manuel Artur Cotta Agostinho Dias.
Manuel Joaquim Montanha Pinto.
Manuel José Archer Homem de Mello.
Manuel Martins da Cruz.
Maximiliano Isidoro Pio Fernandes.
Rafael Valadão dos Santos.
Raul da Silva e Cunha Araújo.
Ricardo Horta Júnior.
D. Sinclética Soares dos Santos Torres.
Tomás Duarte da Câmara Oliveira Dias.