3484 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 176
áreas marinhas, forçoso é reconhecer que a probabilidade de ocorrências de alta gravidade é, afinal, relativamente pequena.
Não conseguiram sossegar-me totalmente as informações que me foram fornecidas e agora apresentadas, e assim, tendo em atenção os muito elevados investimentos turísticos levados u efeito no Algarve - cerca de l 300 000 contos, dos quais 435 000 foram financiados pelo Fundo do Turismo ou com o seu aval, citando somente os que tiveram apoio estatal -, solicito ao Governo a máxima atenção para o risco de poluição, agora pelas possíveis prospecções petrolíferas, que deverá ser evitada, e, quando ocorrida, possa ser rapidamente detectada e atacada por todos os meios que a técnica de hoje permite.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem! O orador foi cumprimentado.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados: Vamos passar a
Ordem do dia
Continuação da discussão na generalidade da proposta de lei de fomento industrial. Tem a palavra o Sr. Deputado Correia da Cunha.
O Sr. Corroía da Cunha: - Sr. Presidente: Ao procurar, com a melhor das intenções, alinhar duas ideias sobre a proposta de lei que contempla o fomento industrial, não me pude furtar a um sentimento de quase frustração perante o esforço que é pedido a um. Deputado, qualquer que seja, quando pretende pronunciar-se em consciência sobre documentos desta importância. Trata-se, na realidade, de assumir a tremenda responsabilidade de avalizar, estudando um por um e em sequência que nem sempre é a melhor, os textos legais que vão servir de base à estruturação de uma nova, economia e, (por que não, à definição de um país novo.
Atento à evolução sectorial ou ao pormenor que em cada momento o solicita, o Deputado perde facilmente a linha de rumo que deve estar subjacente a todo este processo legiferador; na dificuldade em atar as pontas dos fios para (poder compreender, com alguma antecipação, sonde leva a meada, reside neste momento a minha maior preocupação. Não se estranhará, por isso, que renuncie ao propósito de ser exaustivo na apreciação que vou fazer, limitando-me a glosar alguns pontos que porventura tenham sido menos focados em anteriores discursos.
Meus senhores: A intenção do Governo ao elaborar esta proposta de lei é dará e meritória. Dá continuidade a doutrina expressa no III Plano de Fomento e, pelo menos, nas últimas leis de meios. Depois de um longo período em que vigorou uma política industrial paternalista, condicionante das iniciativas, mas apadrinhadora de múltiplas inépcias empresariais, o Governo aparece a afirmar o principio da liberdade da iniciativa privada, reservando no Estado apenas uma função supletiva de orientação. Não poderia ser mais drástica a mudança de atitude face aos problemas levantados pelo regime vigente. Esse facto bastaria, por si só, para concitar a minha simpatia, tanta vez tenho apregoado a necessidade de se ser corajoso e oportuno nas medidas reformadoras que ponham em causa situações reconhecidamente inconvenientes.
Neste ponto creio que estaremos todos de acordo. Do esforço programado através dos planos de fomento nos últimos vinte anos não se colheram, neste como noutros sectores, os resultados a que legitimamente se poderia aspirar. Durante este período a indústria portuguesa desenvolveu-se, é inegável; mas fê-lo de uma forma declaradamente parasitária, jogando com, salários baixos, matérias-primas baratas e um mercado interno disposto (ou obrigado) a colaborar, em face das medidas proteccionistas adoptadas.
Estou certo que nunca se concebeu um desenvolvimento equilibrado, em termos de. conciliar os interesses de uma agricultura desfavorecida com os da indústria nascente. Esta última beneficiou sempre de um tratamento privilegiado, sem ter sabido retirar dele todos os benefícios possíveis. Na verdade, não obstante o sacrifício durante muito tempo suportado pelas actividades primárias, a indústria não conseguiu ganhar a capacidade e organização suficientes para transpor, com êxito, os obstáculos levantados pela concorrência internacional e o seu próprio crescimento.
O País sabe agora que se errou e espera, como nós, que se não insista no erro. Tem que se passar da fase do amadorismo e da protecção mais ou menos velada, conseguida através de conselhos de administração escolhidos a dedo, para a da plena responsabilização. Este raciocínio deve ser válido não só para a actividade industrial stricto scnau, mas para qualquer outra cujo nível de investimentos justifique maioridade nos processos usados. Neste momento estou a pensar no turismo, por exemplo. Tratando-se de uma das poucas actividades em que podemos competir com êxito, interessa cuidar bem da gestão dos empreendimentos, não permitindo que a intromissão de amadores venha a criar problemas que se reflectem não só no sector como em toda a economia nacional. Esta referência permite-me fazer eco da preocupação de eficácia que deve estar subjacente a todo este processo. Ela envolve tanto os patrões como os operários, a orgânica privada como a administração pública.
Bem definidos os objectivos, estruturados os planos, atribuídas responsabilidades, criados os meios de trabalho, espera-se apenas que os homens cumpram, qualquer que seja a missão que a cada um compete. E o interesse nacional que está em causa e a ele se devem subordinar todos os outros.
Evidenciados a necessidade, oportunidade e espírito da proposta de lei, julgo de interesse salientar quanto a sua aprovação pode vir a contribuir para abalar a anquilose de certas estruturas sociais. O fomento das indústrias não dispensa uma forte mutação no estatuto profissional e na própria distribuição du mão-de-obra disponível. A transformação de uma economia de índole rural numa outra alicerçada no desenvolvimento industrial implica necessariamente a criação de uma nova mentalidade por parte da massa trabalhadora, bem como a adaptação a um ambiente de vida e de trabalho totalmente diferentes. E a urbanização acelerada, a despersonalizarão de cada um, a preponderância de um ritmo e vontade novas. As relações entre o capital e o trabalho processam-se em campo mais adequado ao confronto. A consciência dos direitos e dos deveres da colectividade assume nova expressão, à medida que se esbate o individualismo característico do homem do campo. Quero significar com isto não julgar possível levar por diante uma política industrial sem ajustar as estruturas sociais de forma a transformar rurais desenraizados em operários conscientes. Não vejo a proposta muito preocupada com este aspecto, mas é importante que se pense nele.
Como se diz algures no parecer da Câmara Corporativa: "Vão-se apagando os ecos do agrarianismo saudosista ..." A emigração, a guerra e a própria evolução da economia