14 DE DEZEMBRO DE 1972 4103
(...) e essencialidade, têm o maior peso nos orçamentos das famílias. Quanto aos produtos alimentares, tem a Administração procurado assegurar a satisfação das necessidades, pelo recurso à importação na parte correspondente ao déficit da produção interna. Assim, no período entre Janeiro e Agosto, dos anos de 1970, 1971 e 1972, os valores foram de 3084, 3757 e 5446 milhares de contos, o que representa 12,9, 14,3 e 16,4 por cento dos totais importados.
Como se vê, estamos portanto perante um movimento de importações regulamente crescente, não só em valor absoluto mas também relativo, o que não pode deixar de causar sérias preocupações. E dentro dos produtos importados salientam-se este ano, pela sua importância, o milho, com 697 000 contos até Agosto, o bacalhau, com 700 000 contos, e a carne de bovino, com 522 000 contos. Este facto levou certo comentador da imprensa a afirmar, com amarga ironia, que «se lembrará melancolicamente que Portugal foi classificado (e até enaltecido) durante longos anos como país essencialmente agrícola e tradicionalmente marinheiro para pagar agora, como duro resgate, as enormes carências de produtos agrícolas e piscatórios que tem de receber de outros países sem tão acarinhadas tradições».
Mas as importações de produtos alimentares não podem ser senão um paliativo para remediar situações a curto prazo. Há que empreender acções de fomento enérgicas para libertar a nossa tão sobrecarregada balança comercial do peso daquilo que podemos e devamos produzir. No sector da agricultura, nada, porém, se poderá fazer de significativo e duradouro sem se atacar a fundo a nossa defeituosa estrutura fundiária.
Todos reconhecemos tratar-se de tarefa de extrema delicadeza e enorme dimensão e, por isso, não se podem esperar legitimamente efeitos senão a longo prazo. Mas o que se tem realizado, e refiro-me apenas à região do Norte, para aumentar a dimensão das explorações agrícolas de molde a torná-las economicamente viáveis, por meio das acções de emparcelamento, agricultura de grupo ou fomentando arrendamentos estáveis, é demasiado tímido para ter tido até agora significado. Não se poderia também acompanhar com uma política fiscal que forçasse a maior rendimento propriedades insuficientemente aproveitadas por proprietários ausentes ou desinteressados através da fixação de rendimentos potenciais realistas? Evidentemente que seria necessário acompanhar estas medidas com esquemas apropriados de apoio financeiro eficiente e barato e premiar com isenções ou reduções fiscais os que adoptassem convenientes esquemas de reconversão e fomento.
No capítulo da habitação também se requerem medidas adequadas de promoção, sobretudo no campo das construções económicas. Das estatísticas da O. C. D. E. se verifica que a nossa posição é, relativamente ao contexto europeu, muito fraca. Assim, enquanto que em 1969 se construíram na vizinha Espanha 8,2 habitações por 1000 habitantes, 14,7 na Grécia, 8,5 na França e 8,2 na Alemanha, construíram-se apenas 4,6 em Portugal. Dos países que figuram no quadro, somente a Turquia apresentava valores inferiores aos nossos, com 8,3 habitações construídas por 1000 habitantes. E temos de atender ainda, no caso português, a que estamos a viver forte movimento de transferência de populações de zonas rurais para zonas urbanas e isso deforma ainda a nosso favor as comparações com países que se encontram em mais avançado estádio de desenvolvimento. O censo de 1970 mostra bem a intensidade dessa transferencia.
É, pois, necessário empreender um grande esforço de fomento e, no capítulo da habitação económica, como a iniciativa privada obviamente não acorre, esse esforço pertence ao Estado e autarquias locais.
Por outro lado, é indispensável fazer uma actualização das técnicas de construção, para acompanhar o aumento do valor da mão-de-obra, muito mais intenso do que se tem feito até agora. Temos assistido a um forte ritmo de crescimento dos custos de construção, em grande parte por esse motivo.
A circunstância de o Estado poder lançar grandes volumes de obra poderia permitir exactamente um grande contributo neste aspecto, pela maior possibilidade de modulação no projecto e de estandardização de elementos e pelo recurso mais generalizado à prefabricação.
Confio em que a recentemente criada Secretaria de Estado do Urbanismo e Habitação venha a exercer forte acção coordenadora das actividades já existentes e dar vigorosa, e tão necessária, aceleração da habitação económica.
E não queria alongar-me mais. Concentrei-me quase exclusivamente na alta dos preços, dada a grande importância que tem assumido, o que não significa que outros problemas não mereçam também a maior atenção.
Um deles é o da situação do funcionalismo público. Promete o Governo para 1973 providências para a melhorar, a que o Sr. Presidente do Conselho se referiu em recente comunicação ao País. Com a subida do custo de vida tornam-se imperiosas melhorias de vencimento que evitem a degradação progressiva da máquina administrativa do Estado a que temos assistido. Mas era absolutamente indispensável uma reforma contínua dos métodos e um repensar das estruturas para dar à administração a produtividade de trabalho e a celeridade de processos exigidas nos tempos em que vivemos.
Não queria terminar sem uma breve referência ao acordo estabelecido com o Mercado Comum, cuja ratificação a Assembleia vai discutir nos próximos dias. É uma nova perspectiva que se abre e que vai, sem sombra de dúvida, influenciar fortemente o nosso futuro. Encaro-a com muita esperança, apenas ensombrada pela dúvida de se saberemos aproveitar devidamente os anos de adaptação, e que não são muitos, que nos restam. É um esforço colectivo que se impõe, mas ele exigirá, antes de tudo, uma informação intensa e completa aos Portugueses, para que a Nação se mobilize conscientemente para a enorme e urgente tarefa que é necessário realizar.
O Sr. Ribeiro Veloso:-Sr. Presidente: Diz-se na introdução à proposta de lei de autorização para 1973 que se está ainda longe da apresentação de um quadro completo da acção governativa projectada para cada ano em matéria de política económica e financeira: E diz-se ainda que se tem afirmado ser necessária a apresentação de um diploma único que contenha as leis de autorização das receitas e despesas e o programa anual da execução do Plano de Fomento, com o enunciado completo das providências a adoptar pelo Governo no próximo ano.
Ora, como o Plano de Fomento foi aprovado pela Assembleia, não seria passível de discussão o programa anual de execução, pois, a dar-se, viria a conduzir à alteração do próprio Plano. Não me parece assim de muito interesse a do programa anual de execução do Plano de Fomento, mas o que me parece que tem verdadeiro interesse é a afirmação categórica de que se vai respeitar a ordem de precedência com os investimentos públicos previstos na parte prioritária do III Plano de Fomento. E, como essa afirmação é feita, parece-me isso o suficiente, mas, naturalmente, o mesmo não aconteceria se não houvesse qualquer plano aprovado pela Assembleia.