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114 I SÉRIE - NÚMERO 4

dívida oculta, até ao atraso sistemático na apresentação das contas públicas.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que este quadro é negro e necessariamente triste. No entanto, ele tem para todos nós hoje, aqui e agora, a vantagem de relativizar as nossas questões. Em primeiro lugar, porque ele nos leva a assumir com alguma seriedade, com profundidade e com rigor, uma situação que não é de maneira nenhuma possível de ser encarada com triunfalismo, com falsas escapatórias ou com medidas de ocasião. Em segundo lugar, porque ele nos leva a pensar que há problemas estruturais que importa resolver e sem os quais corremos o risco de não fazermos mais do que operações de cosmética.
Mas se quisermos ir a tempos mais recentes, poderia invocar o que há 1 ano disse - e esta referência consta do Diário da Assembleia da República, de 15 de Novembro de 1983 -, ou seja, que valeria a pena recordar que todos temos do Orçamento a ideia de que ele é uma previsão. Porém, quando nos são apresentadas propostas de alteração do Orçamento nesta altura, não é normalmente de uma previsão que se trata, mas da verificação de uma situação adquirida. E, pior do que isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, aquilo que normalmente nos é apresentado sob a forma de proposta de lei de alteração do Orçamento não corresponde nem aos princípios orçamentais de rigor nem à disciplina constitucional orçamental.
No caso presente, gostaria de lembrar apenas uma dificuldade de tomo: é que nos termos constitucionais o Orçamento segue-se ao Plano e reproduz o Plano, e a Assembleia da República não dispõe de uma lei do Plano para 1984.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, esta alteração orçamental que deveria estar submetida a um plano não tem qualquer espécie de possibilidade de cumprir esta obrigação constitucional, e a culpa não é da Assembleia da República.
Porque não se trata de uma previsão, mas de um facto que é apresentado como consumado à Assembleia da República, é falso o dilema ontem aqui colocado ao Sr. Deputado Bagão Félix por parte da bancada do Governo: a alternativa não é diminuir o défice ou vender o ouro. A alternativa só se pode colocar nestes termos porque na proposta orçamental foi contada como receita a venda do ouro, porque ao abrigo dessa possibilidade de receita foram praticadas despesas no valor de, pelo menos, 45 milhões de contos e que já não oferecem à Assembleia da República nenhuma possibilidade de serem eliminadas. Ou seja, o que acontece é que existe um défice criado porque na proposta governamental se partiu de uma situação errada e não verificável.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque as situações são sérias, porque as situações são graves, elas fazem a todos nós, sem excepção, particulares exigências. Por isso, não creio que seja este o lugar e o momento apropriado para que, pura e simplesmente, fiquemos pela lamentação destas circunstâncias. Pelo contrário, creio que se exige de todos nós que sejamos capazes de encontrar os meios adequados para que situações desta natureza não se possam repetir.
O esforço que de nós é exigido, a confiança que nos pode ser pedida - porque a confiança é exigente, porque a responsabilidade é conjunta - é que colaboremos no enquadrar de medidas de controle e de acompanhamento da execução orçamental que não permitam a nenhum governo, qualquer que ele seja, poder confrontar-se com situações desta natureza.
O que está em causa é, por exemplo, o facto de continuarmos - e não sei por mais quanto tempo será, mas creio que não pode ser por mais tempo - a ter o mesmo serviço do Ministério das Finanças a fazer duas coisas: o controle da execução orçamental e a elaboração do Orçamento e das suas previsões. A Direcção-Geral de Contabilidade Pública não pode acumular duas funções inteiramente diversas porque, tal como se está a verificar, não realiza com eficácia nenhuma das duas missões que lhe são atribuídas. Creio que não está em causa o esforço dedicado das pessoas que trabalham nessa Direcção-Geral. Porém, está em causa a impossibilidade funcional de fazer previsão orçamental e acompanhamento do Orçamento.
Não é possível que o Sr. Ministro das Finanças nos possa vir dizer que na véspera teve notícias do Banco de Portugal sobre o comportamento da nossa dívida externa. O Sr. Ministro criou no seu próprio Ministério um grupo para acompanhar a evolução da dívida externa, conhecida a sua repercussão. Portanto, tem de ter elementos de gestão que lhe possibilitem essa informação atempada, tem de ter um esquema de relações com o Banco de Portugal que lhe permita dispor de informações a tempo e horas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O mal do acompanhamento orçamental é sério e obriga esta Assembleia da República a que no Orçamento de 1985 se tomem disposições para que esse controle se possa traduzir numa realidade, sem a qual todos os orçamentos não serão mais do que vagos enunciados de pias intenções. Ou então nós estaremos a fugir a uma responsabilidade que é de todos.
Em relação aos instrumentos que fazem parte do próprio Orçamento, creio que também não será possível continuar a acreditar que o simples voluntarismo verbal traduzido numa disposição orçamental significa só por si que a realidade se lhe conforma.
Não é possível dizer-se que as despesas com a saúde ou com a educação se conformam com limites que todos sabemos serem irrealistas para, meses depois, se vir verificar essa previsão irrealista. Isto é também uma exigência de rigor, é também o ter um conhecimento adequado das realidades e não esperar que aconteçam soluções por mero milagre, pelo simples facto de inscrevermos uma verba muito aquém daquilo que todos sabemos ser indispensável.
Em relação a uma reflexão para o Orçamento de 1985, importa ainda fixar outro quadro de actuação. Ora, esse quadro de actuação tem a ver com o próprio facto que é o quadro global traçado por este Orçamento. Não é possível - e creio que todos temos consciência disso - aumentar mais a carga fiscal. Assim sendo, os grandes equilíbrios terão de se ir encontrar ao lado das despesas.
Creio que daqui não há que fugir! E também não haverá que fugir na escolha das despesas mais eficazes e mais rentáveis. Isso é, com certeza, um esforço de imaginação e também um esforço de vontade. Mas creio que, sob pena de assistirmos a este deslizar progressivo das situações, de tentarmos de algum modo camuflá-las, de nos desviarmos dos autênticos proble-