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I SÉRIE -- NÚMERO 49

O Sr. Silva Marques (PSD): -- Muito bem!

O Orador: -- Que fique, pois, muito claro: o Governo tem o mais profundo desacordo por certas hipóteses de alteração à proposta de lei do Orçamento do Estado para 1986, hipóteses essas que têm sido ventiladas por órgãos da comunicação social ou que existem
mesmo materializadas em documentos de grupos parlamentares.
Entre os casos mais salientes, destacarei os respeitantes aos preços de combustíveis, aos impostos profissional e complementar e ao imposto de capitais.
Quanto aos preços dos combustíveis, há, desde logo, uma distinção primária que é ao mesmo tempo uma questão de princípio. Uma coisa é a fixação de componentes fiscais dos preços, outra coisa é a própria administração dos preços. A primeira cabe exclusivamente
à Assembleia da República. A segunda compete, indiscutivelmente, ao Governo, ou, se este assim o entender, às empresas e ao mercado.
O Governo não quer prolongar o erro de administrar matéria fiscal sem autorização da Assembleia da República - pecado que, aliás, foi cometido por todos os Governos anteriores e tacitamente consentido pelas composições parlamentares contemporâneas. Nem a Assembleia da República deve invadir uma área típica do Executivo, como o é a gestão dos preços.
Seria a primeira vez que isto acontecia; constituiria um precedente perigosíssimo (poderiam seguir-se os preços do leite, do pão, dos transportes, a taxa de juro, a taxa de câmbio!). Onde iríamos parar, Srs. Deputados? Uma tal atitude só poderia ter uma leitura: interferência e obstrução parlamentar à acção do Governo.
Se o Governo não serve, mude-se o Governo. Se o Governo serve, respeite-se o que compete ao Governo. Não aceitamos ser um governo anónimo de responsabilidade limitada. Só aceitamos ser um governo por inteiro, sem limites ocasionais, nem reduções arbitrárias.

O Sr. António Capucho (PSD): -- Muito bem!

O Orador: -- Para além desta questão de princípio, que sempre se poria mesmo que houvesse uma perfeita concordância do Governo relativamente à proposta ventilada de mexida dos preços de combustíveis, acontece, Srs. Deputados, que estamos perante uma hipótese que carece de triagem técnica e de avaliação rigorosa e
demorada das consequências. É matéria complexa, que se tem arrastado em Governos anteriores sem solução; o Governo está a estudar o assunto e há-de fazer à Assembleia da República uma proposta de lei, tecnicamente ponderada, sobre a componente fiscal dos preços dos combustíveis -- em articulação, aliás, com a extinção já decretada do Fundo de Abastecimento.
Não é possível, com segurança, fazer isto em poucas semanas, muito menos em poucos dias. Ninguém
pode garantir que, por este caminho, a Assembleia da República não estaria, além de invadir a esfera do Governo, a consagrar uma solução gravemente inadequada no domínio da pura técnica da fixação de preços. Os especialistas da matéria mostram-se perplexos e classificam uma tal atitude como sendo, de todo em todo, desaconselhável.
Mas, mesmo que não se pusesse a questão de princípio sobre as esferas de competência, nem houvesse riscos técnicos quanto à estrutura dos preços dos combustíveis, sempre restariam duas questões essenciais que têm a ver com o papel dos preços na orientação da política energética e com o peso da dívida que vem do passado. A primeira insere-se na problemática da afectação dos recursos, das poupanças energéticas e do estímulo ao consumo e dos custos de produção, e é uma problemática fundamental que me absteria de desenvolver. A segunda reclama algo tão simples como um juízo em que intervenha o bom senso e a sabedoria do povo português: o que deve fazer uma família endividada a quem sai o prémio da lotaria?
Comprar um carro, mudar o televisor e passear no estrangeiro, ou pagar dívidas e investir na educação dos filhos? É este segundo caminho o apontado pelo Sr. Primeiro-Ministro no discurso que fez perante VV. Exas.

Vozes do PSD: -- Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, permitam-me que passe aos outros dois casos citados de hipotéticas alterações à proposta do Orçamento do Estado do Governo.
Quanto ao imposto profissional, conjugado com o ex-Fundo de Desemprego, propôs o Governo uma redução das taxas em dois pontos percentuais. Não é uma redução sensacional, certamente que não é, mas é a redução possível tendo em devida conta as projecções macroeconómicas para 1986. Ao que parece, existe uma hipótese de a Assembleia da República ir mais longe em matéria do imposto profissional, acumulado com o imposto complementar, atingindo-se, assim, a maior explosão dos salários líquidos de que há memória. Que saibamos, nunca houve uma conjunção deste tipo, com os impostos drasticamente reduzidos e, ao mesmo tempo, os salários nominais a subir bastante acima da inflação (três a quatro pontos segundo a política de rendimentos do Governo). Teremos consciência plena do que isto poderá vir a representar em termos de consumo privado e de ilusões de nível de vida que não serão sustentáveis em anos seguintes?
Teremos consciência dos riscos que o País corre quanto à necessidade de em 1987 ou 1988 vir a submeter-se, mais uma vez, às severidades de uma política de estabilização tutelada pelo exterior? Quem vai, então, responder pelos excessos de agora? Quem vai, então, enfrentar o desprezo dos cidadãos desiludidos e o desdém sobranceiro dos parceiros europeus? Mas alguém duvida de que, se assim pudesse ser, não teria o Governo proposto, desde logo, ou depois, a qualquer momento, um maior e mais cativante desagravamento fiscal?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): -- O Governo é que sabe!

O Orador: -- A solução que expus na Comissão de Economia, Finanças e Plano é a mais recomendável na presente situação do País, quando os salários nominais estão já a evoluir significativamente acima da inflação esperada: aguardar pelo Outono, fazer uma avaliação da conjuntura e das principais variáveis macro-económicas (salários, consumo, inflação, défice externo, competitividade) e decidir, então, se for caso disso, por um novo desagravamento fiscal por acordo responsável e altamente meritório entre os dois órgãos de soberania.

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