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2262 I SÉRIE - NÚMERO 66

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n.ºs 54 a 57 do Diário.

Pausa.

Como não há oposição, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, antes de continuarmos com o processo de Revisão Constitucional, informo que se encontra na galeria um grupo de alunos da Escola Secundária de Peniche.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, vamos prosseguir a discussão da revisão constitucional com o artigo 16.º-A.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta apresentada pelo Grupo Parlamentar do PCP, de criação de um artigo que expresse, explicitamente, um regime dos deveres fundamentais, propiciou, no quadro da Comissão Eventual de Revisão Constitucional, um debate de assinalável importância sobre as dificuldades que o texto actual da Constituição suscita quanto ao enquadramento da criação de deveres aplicáveis aos cidadãos.
É facto que há dificuldades de enquadramento; todos reconheceram que essas dificuldades existem e que não era fácil obter uma redacção que colmatasse a actual lacuna ou dificuldade de definição constitucional. No entanto, não foi possível obter uma solução que acolhesse o consenso dos dois terços necessários para resolver a questão que está suscitada.
O PCP não considerou fundadas as argumentações tendentes a ver na proposta que apresentou uma forma negativa de criação de restrições aos direitos dos cidadãos ou uma forma perversa de enquadramento da imposição de deveres aos cidadãos.
Há um problema, todos reconheceram que esse problema existe e ninguém adiantou uma solução melhor do que aquela que o PCP apresentou. Isto quer dizer que, a não haver consenso para uma solução positiva, tudo continuará como até agora, ou seja, a imposição de deveres jurídicos públicos aos cidadãos não deixará de ter de obedecer a certas restrições e ninguém admite a imposição livre e arbitrária de deveres aos cidadãos.
Por outro lado, haverá que buscar-se a «estrela-polar» para imposição desse deveres nos elementos que a Constituição continuará a definir originando, todavia, algumas dificuldades hermenêuticas.
Não havendo consenso para uma solução positiva e demitindo-se o PSD e o PS, em concreto, de contribuir activamente para uma solução melhor do que aquela que foi adiantada pelo PCP, não levaremos à votação esta proposta porque de forma alguma queremos que se originem interpretações perversas na base de uma rejeição que seria, no fundo, um sinal de impotência por parte do PSD e do PS.
Assim se ilustra também quem procura contribuir activamente para colmatar lacunas constitucionais e quem está preocupado apenas com restringir direitos ou com assistir, de maneira passiva, ao fluir dos acontecimentos, mesmo em matérias em que se justificava uma acção positiva.
Lamentamos que assim aconteça e, na altura própria, Sr. Presidente, tomaremos as providências necessárias para evitar que, por inacção dos outros, esta nossa iniciativa possa redundar em efeitos preversos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Esteves.

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com algum interesse que vemos o PCP desistir desta proposta de acrescentamento do artigo 16.º-A.

Na verdade, apesar da sua boa intenção - da qual não duvidamos - o artigo 16.º-A viria inserir na Constituição uma confusão e provocar, eventualmente, efeitos preversos que se não pretendem, em primeiro lugar, porque a própria Constituição consagra o princípio geral indúbio pró libertate - aliás, já referido em sede de Comissão Eventual de Revisão Constitucional aquando do debate deste número. Assim, dada a esfera de autonomia que é, no fundo, um dos pontos em que assenta a própria legitimidade do sistema, a Constituição consagra, em todo o seu articulado, o princípio de uma presunção geral de liberdade e, por isso, as ablações ou ingerências na esfera dos particulares são sempre excepcionais.
Daí que o problema da inserção de um novo artigo relativo aos deveres públicos fundamentais pudesse causar confusões. E poderia causá-las, em primeiro lugar, porque este problema não é autónomo do que diz respeito à restrição dos direitos fundamentais.
Na verdade, a restrição dos direitos fundamentais tanto pode cifrar-se numa proibição como na imposição de um dever público. Por outras palavras, um dever público, quando legislativamente instituído, implica sempre a constrição dos direitos no espaço em que se conforma.
Uma vez que não há autonomia teórica e prática do problema da imposição dos deveres públicos e da restrição dos direitos fundamentais põe-se, então, a questão de saber se a Constituição consagraria já, correcta e suficientemente, as cautelas necessárias para que o legislador ordinário só pudesse invadir a esfera dos particulares de modo vinculado, excepcional, através de lei geral e abstracta, como consagra o artigo 18.º
Esse artigo faz o regime completo de todas as cautelas necessárias no que se refere à ingerência na liberdade dos cidadãos e fá-lo com toda a suficiência.
Mas, ainda que assim se não considerasse, a própria Declaração Universal dos Direitos do Homem, à qual se refere o artigo 16.º, contém, no seu artigo 29.º, uma disposição que é, de certo modo, decalcada da pretensão do PCP. Fala do problema da imposição de deveres ou da restrição de direitos, desde que se verifiquem os requisitos de necessidade e de proporcionalidade, bem como todos os demais requisitos para que, afinal, aponta também o artigo 18.º
Admitida que é a plena suficiência da salvaguarda de garantias dos direitos dos cidadãos contra ingerências ablatórias do Estado, quer através de um sistema de proibição, isto é, de restrição stricto senso, quer através do sistema de imposição de deveres públicos que, em si, comportam a constrição de direitos, como acabei de dizer, põe-se o problema de saber qual seria a função que desempenharia o aditamento proposto pelo PCP.
Ora essa função só poderia ser negativa, malgrado as boas intenções de que vinha impregnada.