22 DE SETEMBRO DE 1989 5241
dispensa no contexto geral de separação de poderes entre os vários agentes sociais.
É hoje claramente perceptível pelos portugueses o afã, o frenesim, a impaciência com que o Partido Socialista encara o seu continuado afastamento do poder. Poderia pensar-se que é um sentimento que nasce da sua segura convicção de que tem um melhor programa para a governação do País, de que entre os seus quadros, de que entre os seus múltiplos e loquazes ministros-sombra há um manancial de qualidade injustamente desaproveitado e que, quanto mais espaçado for esse divórcio do poder político, mais se empobrece o País, mais se aprofundam as feridas sociais e pior vivem os portugueses.
Conclui-se, no entanto, de uma análise séria e realista, da história nos nossos quinze anos de vida democrática e dos resultados da governação quando o PS foi chamado à sua liderança, que não são, seguramente, esses os argumentos que o PS pode brandir e que, muito mais provavelmente, estamos perante o nervosismo de uma liderança debilmente sustentada que encara a conquista e subsequente repartição do poder como .um travão ao aumento da desmotivação dos seus apaniguados ou à voracidade das lutas internas.
É a esta luz que vale tudo: já valeu propor a partilha do poder com um partido comunista que já não se usa na Europa democrática e de que a outra Europa começa, a espaços, a libertar-se; vale agora também protagonizar um processo de abastardamento do projecto sindical democrático consubstanciado na UGT, na origem do qual estão figuras como Sá Carneiro e Mário Soares, e que nasceu precisamente para esconjurar o vanguardismo sindical comunista.
Bem se percebe agora o porquê da actual liderança socialista só tão tarde ter conseguido conquistar a direcção partidária e num tempo que já não era o tempo daqueles que fizeram do PS um referencial insuspeito para barrar o avanço do projecto marxista-leninista para Portugal.
A denúncia que o Partido Social-Democrata vem fazendo aos portugueses desta «salada indigesta», onde comunistas e socialistas repartem condimentos os mais diversos, ontem nas autarquias, hoje no movimento sindical e na tentativa de desestabilização social, amanhã no Governo se os portugueses deixassem, não é um mero exercício de luta política no sentido estrito, mas a concretização de um sentimento de dever para com os portugueses, no plano político, e para com os trabalhadores, no plano sindical, num momento em que se joga muito do nosso futuro enquanto país moderno e desenvolvido.
E isto, porque, a vencer a tentativa comunista/socialista de, à míngua dos votos que os portugueses lhes não deram, colocar a reboque dós seus projectos de conquista do poder político o movimento sindical, o crescimento harmonioso do País sofreria um sério revés e, como em todos os projectos que os comunistas influenciam, os mais prejudicados seriam os trabalhadores e os portugueses mais desfavorecidos.
Que tudo isso é natural vindo da parte de um partido comunista como o PCP não surpreende ninguém. E é até porventura correcto afirmar-se que o PCP tem legitimidade perante o seu eleitorado para assim proceder porque os que nele votaram continuam provavelmente a rever-se numa linha política que se mantém estável desde o acto eleitoral. Duvidoso é afirmar-se que o PS tenha hoje idêntica legitimidade perante os seus eleitores quando o número de deputados que quantificam a sua força política foi conseguido por uma liderança partidária, então protagonizada pelo Dr. Vítor Constâncio, que fazia ponto de honra da separação de tais águas. A história dirá se ele não terá sido, afinal, a primeira vítima do projecto da Frente Popular para Portugal. Porque a verdade dos factos recorda-nos que até à actual liderança socialista era impensável uma aliança como a que está já formalizada para Lisboa, do mesmo modo como era insuspeitável este concubinato sindical entre a UGT e a CGTP.
O PSD tem denunciado esta nova realidade política e esclarecido a opinião pública, mas têmo-lo feito de modo a que as nossas posições transmitam aos portugueses uma grande serenidade e isto porque acreditamos no regulador insubstituível da vida democrática que é o voto e, principalmente, porque acreditamos que o sentido agudo do interesse nacional que os portugueses sempre têm demonstrado irá repudiar tal projecto e condenar politicamente os seus autores e protagonistas.
Coisa diferente é a que respeita ao movimento sindical, porque podemos estar a assistir ao desferir de golpes com consequências irreparáveis na sua credibilidade e no seu futuro. Tal como no plano político também no plano sindical, quanto aos comunistas, estamos conversados: quanto pior, melhor! A especial gravidade dos factos volta a ter que ver com o sector socialista que há cinco anos atrás, já então como agora, liderante na orientação da UGT, não vislumbrava razões de natureza social que justificassem uma aliança com o sindicalismo marxista-leninista, nem ao menos uma sugestão, ainda que sussurrada, de realização de greves gerais.
E aqueles, seguramente também a generalidade dos trabalhadores, que fizerem a comparação entre a situação que hoje se vive e aquela outra que então se vivia não podem deixar de interrogar-se sobre os estranhos conceitos de avaliação social por parte da UGT.
Era o tempo em que milhares de trabalhadores perdiam os seus empregos, na CTM, na Lisnave, no Tramagal, na Timex, na Torralta, um pouco por todo o lado; era o tempo em que os trabalhadores cercavam as agências bancárias na Marinha Grande exigindo os salários a que tinham direito e que se lhes negavam; era o tempo em que - contrariamente ao de hoje - mais de cem mil trabalhadores eram credores de meses de, salários sobre as suas empresas; era o tempo em que o desemprego não se cifrava em 5/6% como hoje, mas em 13%, isto é, qualquer coisa como cerca de 500 mil trabalhadores, dos quais quase metade era constituída por jovens que viam bloquear-se-lhe a esperança logo no início da vida activa; era o tempo em que os trabalhadores viam diminuir em 15% o seu poder real de compra e não como hoje em que os trabalhadores têm, desde 1985, visto aumentados os seus salários reais; era o tempo em que as pensões se mantinham inalteradas, e não o de hoje, em que sempre e por vezes mais que uma vez, sofrem actualização com ganhos reais; era o tempo, enfim, em que o governo de liderança e maioria socialista fazia recair sobre os trabalhadores o famoso imposto extraordinário retroactivo, porventura um dos instrumentos socialmente mais violentos suportado pelos trabalhadores. Era o tempo também em que uma grande descrença abalava o colectivo nacional, em que muitos empresários, pouco menos que na completa