O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

744 I SÉRIE-NÚMERO 22

Em segundo lugar, porque a reforma de mentalidades é fundamental para poder ganhar a população para a democracia e para a liberdade. E, como sabemos, existiu também na União Soviética, antes do comunismo, uma coisa a que se chamou czarísmo, que não primou propriamente pela defesa destes princípios.
Finalmente, as reformas económicas, que são múltiplas e vão do sistema de preços à reforma fiscal, do regime de propriedade ao papel do mercado e à própria convertibilidade do rublo, são reformas lentas, difíceis e complexas, que produzem indiscutivelmente alguma inflação não controlada, desemprego e abaixamento do nível de vida. Para além disso, verificam-se já rupturas no abastecimento, em parte devido à greve nos transportes, e uma procura excedentária, equivalente a cerca de nove salários mensais em média.
Perante este quadro, o apoio externo, tal como noutras economias socialistas, é neste momento fundamental e passa, do meu ponto de vista, por dois aspectos: um político, que impõe ou pressupõe a aceitação tácita no Ocidente de alguns recuos tácticos na União Soviética, no que diz respeito a algumas liberdades fundamentais (direito à greve, direito de propriedade, direito de circulação...) e, no plano económico, por uma ajuda de emergência, principalmente ao reabastecimento de bens essenciais e de alguns produtos de consumo; facilidades comerciais, particularmente nos mercados com maior capacidade de aquisição (Estados Unidos e Comunidade Europeia) e a realização de joint-ventures de investimento e gestão com grandes empresas europeias.
Este quadro, naturalmente sintético, e que encontrarão um pouco mais desenvolvido no tal texto que referi, traça, como disse, o pano de fundo soviético, que, como referi, foi o instigador, o catalizador ou o inspirador de algumas evoluções no Leste.
Falemos da Polónia, onde a evolução passou por um confronto institucionalizado entre, por um lado, o Partido Comunista e, por outro, por duas instituições bem arreigadas na sociedade polaca - a Igreja Católica e o Solidariedade. E assim é que a evolução do processo conduziu à união das duas últimas e, mais tarde, à inclusão da parte mais sã ou com maior capacidade de reforma do Partido Comunista, de modo que fosse uma evolução assente nestes três pilares, portanto, uma mudança institucional e, de algum modo, controlada.
E curioso assinalar a subtileza desta evolução, subtileza marcante no discurso do Ministro dos Negócios Estrangeiros polaco à Assembleia Geral das Nações Unidas, no passado mês de Setembro, quando faz a diferença subtil entre «áreas de influência» e «áreas de segurança», procurando retirar o debate da segurança europeia de cima da questão polaca. É, quanto a mim, uma visão importante do ministro polaco, que mostra um grande realismo e um grande sentido prospectivo do futuro.
Já na Hungria a evolução começou também sob a condução do Partido Comunista; porém, rapidamente, o próprio partido sofreu uma tal evolução que se diluiu e se aniquilou. Viram-se avanços, que penso que, de algum modo, serão parecidos com alguns que tivemos a seguir ao 25 de Abril, no sentido de uma euforia pela liberdade, em avanços fulgurantes em todos os domínios, designadamente no dos direitos do homem e da democracia pluralista, numa aproximação imediata ao Conselho da Europa e, até, à própria Comunidade Europeia, pondo a hipótese, inclusive, da saída do Pacto de Varsóvia.
Em qualquer dos três casos, especialmente nos dois últimos, houve, de algum modo, ou efectiva ou virtualmente, algum controlo do Partido Comunista.
O mesmo se não passou na RDA ou na Checoslováquia. Aqui, foi, claramente, um grito expontâneo da população. No caso da RDA, face à influência diária de uma televisão e de órgãos de comunicação vizinhos, que lhes mostravam a prosperidade e a liberdade, mostravam, inclusive, o que se passava nos outros vizinhos, na Polónia e na Hungria, e há toda uma erupção expontânea que ultrapassa, claramente, todas as instituições formais do Estado e assiste-se a um recuo sistemático do Partido Comunista, tentando, de algum modo, salvar o próprio partido ou a sociedade socialista.
Só que enquanto nos outros casos os problemas eram essencialmente político-económicos, no caso da RDA, como sabem, as implicações são tremendas, quer sobre a reunificação alemã, naturalmente, quer sobre os equilíbrios e a arquitectura da Europa e a segurança europeia.
Também na Bulgária começa a haver uma tímida perestroika, em torno de uma mudança de um líder eterno, de 40 anos, que é noticiado em não sei quantos jornais na terceira página, o que é uma coisa extraordinária. Mas também aqui alguns ecologistas têm vindo a empunhar a chama da perestroika.
O mesmo se passa na Jugoslávia, fora do Pacto de Varsóvia, com grandes problemas e dificuldades internas nas suas repúblicas e que, não obstante, na carta de intenções do Ministro Lockar, feita há alguns dias, mostra, claramente, uma opção no sentido húngaro.
Resta falar de duas aberrações: a Roménia, para que não consigo encontrar outra expressão que não seja a do «orgulhosamente só» na defesa de um regime opressivo, totalitário, o chamado «comunismo bórico», puro e duro, em que sucessivas démarches dos Doze, démarches de diferentes embaixadores, no sentido de conseguir o respeito por alguns «dissidentes» do regime, se viram votadas a um total silencio por parte das autoridades romenas.
Foi nesse sentido que, aliás, todos os Doze decidiram diminuir a sua representação diplomática, e Portugal, face aos fracos laços políticos, económicos e culturais e à fraca expectativa da sua evolução, decidiu encerrar a sua embaixada.
O outro caso é o da Albânia, um museu vivo do que pode ser o comunismo ortodoxo aplicado ao isolamento e à penúria de um povo.
Voltemos à questão alemã, porque essa é, de facto, a questão central. Desde logo, interessa saber se esta palavra ou se este conceito da reunificação é um conceito pertinente ou impertinente, isto é, se deve ser um conceito entendido como algo que deva ser aceite, eu diria quase naturalmente, ou se deve ser combatido e como.
Em minha opinião e na do Governo (e a história nos ensina) a evolução na Alemanha foi sempre tendente à reunificação dos alemães. Já desde os tempos dos romanos, passando pelo Tratado Westefália, mais recente, houve sempre uma tentativa de separação e uma tendência para a reunificação.
E é esta percepção histórica desta tendência inata nos alemães que, do meu ponto de vista, aconselha a que os intervenientes procurem, relativamente ao processo, ter uma «gestão controlada» do mesmo (já explicarei o que quero dizer com isso).
Uma coisa é certa: todos os intervenientes emendem que este processo deve assentar numa sucessão de estados