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792 I SÉRIE-NÚMERO 22

Na verdade, os partidos comunistas europeus, com excepção do italiano, do português, do cipriota e do grego já de há muito eram grupúsculos irrelevantes para a vida política da maioria dos países da Europa. Partidos como o inglês, o norueguês, o alemão, o belga e o holandês não tinham qualquer expressão ou significado. Apenas nas zonas da Europa mais arcaicas, do ponto de vista económico-social, ou em cada país, nas regiões mais atrasadas, o comunismo resistia à sua desaparição como movimento social.
O comunismo europeu sobrevive, na década de 80, nos campos do Alentejo, nas zonas rurais da França, na Andaluzia, nas montanhas gregas ou entre os lenhadores finlandeses; para partidos que se reivindicam do futuro não é uma situação brilhante. Envelhecidos etariamente, isolados da juventude, associados a grupos sociais sem qualquer mobilidade, presos em situações de estagnação, os partidos comunistas constituem hoje uma força de regressão no plano social e um grupo de pressão política a favor dos interesses geo-estratégicos soviéticos.
Nesta última função também os partidos comunistas têm vindo a perder terreno. De há muito que para a União Soviética os partidos comunistas são cada vez menos importantes como instrumentos de política externa e substituídos por movimentos de outro tipo ou pela influência em partidos ou em individualidades de outras áreas.
O Partido Comunista não escapa a este processo. Isolado socialmente e privado, desde a independência das colónias, de grande parte do seu interesse geo-estratégico, o Partido Comunista Português sobrevive em estado de orfandade. Nestas circunstâncias, será sempre dominado por uma lógica de pura sobrevivência, mantendo, essencialmente na sua intervenção na sociedade portuguesa, as suas características de partido da reacção social, portador de uma cultura de conflito. Essa função será potenciada pela política de alianças do Partido Socialista, que dá ao Partido Comunista um tempo de vida e uma influência que não teria pelas suas próprias forças e meios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas a crise do comunismo afecta também a esquerda e o socialismo. Os modelos existentes nos países do Leste eram uma variante da vasta árvore dos modelos de engenharia social do socialismo, e não há qualquer critério segundo o qual se possa, nessa árvore, separar, de entre os ramos, os pervertidos e os sãos. Se o comunismo à luz da democracia é uma perversão, não é líquido que o seja à luz do socialismo. Os socialistas portugueses, enquanto democratas, podem, de facto, regozijar-se pelos acontecimentos, mas enquanto socialistas serão também eles próprios apanhados pelas crises dos modelos ideológicos de génese comum. A incomodidade socialista revela-se nos apelos para que no Leste se permaneça sob qualquer forma residual de socialismo, mesmo que meramente nominal, enquanto que a vontade visível das populações e os óbvios modelos para que aponta o seu comportamento é o das democracias ocidentais, das economias de mercado, mesmo das sociedades de consumo.
Os socialistas não têm tanta autoridade quanto aparentam ter, salvo raras excepções, para falar da luta dos povos da Europa do Leste. Convém não esquecer que os socialistas, como, aliás, muitos dos intelectuais de esquerda - e de novo, salvo raras excepções - manifestaram sempre bastante desprezo por todas as tentativas de conduzir acções políticas práticas de critica aos regimes do Leste. Parecia-lhes, sempre, ter um conteúdo excessivo, em relação às acções que eram tomadas contra os regimes e partidos de direita. Faziam manifestações contra Pinochet, mas não contra Brejnev. Não é preciso ir mais longe do que lembrarmo-nos da sobranceria e do escámeo com que muitos intelectuais de esquerda portugueses trataram iniciativas, como as audiências Sakharov ou os protestos públicos, contra o «golpe de Estado interior» da Polónia, que se realizaram em Portugal por iniciativa sindical, inclusive por iniciativa de alguns sindicalistas do Partido Socialista.
Quantos desses intelectuais socialistas participaram em qualquer das escassas manifestações que se realizaram junto das embaixadas dos países do Leste, aquando dos acontecimentos do Afeganistão ou da Polónia? Aliás, esta hipocrisia substancial permanece para muitos deles. Quantos, hoje, protestariam contra regimes como o da Nicarágua ou o de Cuba, tratando-os como ditaduras que efectivamente são?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A maioria dos intelectuais da esquerda incorreu sempre no vício da dupla linguagem e da indignação selectiva: não chamavam às ditaduras ditaduras; não tratavam nem tratam os regimes por aquilo que são, mas pelos rótulos que assumem.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não tem sentido reivindicar paternidades ou autorias para o grande processo de transformação que está em curso, mas podem afirmar-se sentimentos de natural partilha e comunhão de ideias. Na verdade, diferentemente do que acontece com outros partidos, não é o PSD que tem problemas de crise de legitimidade, devido aos acontecimentos do Leste. O PSD constituiu-se à margem das grandes correntes partidárias internacionais, à margem do modelo internacional, que é ele próprio de raiz marxista.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tal não significa, nem significou, que não procurasse afinidades internacionais. No entanto, contrariamente ao que pensa o Partido Socialista e o Partido Comunista, as afinidades internacionais não são, pela sua própria natureza, fonte de legitimidade política.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Pelo contrário, são fontes de ilegitimidade!

O Orador: - Por isso, o PSD assumindo embora as diversas heranças, que partilha com outros partidos democráticos, que eram comuns às tradições da democracia ocidental - o património do primado do direito e dos direitos do homem, a tradição liberal do pensamento inglês e francês, o reformismo, a doutrina social da Igreja -, caracterizou-se mais pela postura que assumiu face à sociedade e à política portuguesa nos anos conturbados de 1974 a 1980, verdadeiro período genético, mais do que pela reverência a modelos ideológicos definidos. Podemos definir essa postura como sendo o resultado de uma dialéctica entre uma tensão social e uma pressão liberal. A tensão social, que faz do PSD um partido de homens de trabalho, tem a ver com as carac-