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1364 I SÉRIE-NÚMERO 39

do PS, somos contra toda a espécie de crueldade que seja praticada em relação a todas as espécies de animais. Não há dúvida de que a bicharada está entregue ao homem e é sobre o homem que devem incidir regras!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep.): - E nós estamos entregues "à bicharada"!...

O Orador: - Na realidade, a bicharada está entregue ao homem até pelos poderes extraordinários que a civilização foi desenvolvendo no homem e que o permite dominar toda a bicharada.
Mas esta minha introdução, se é para mostrar que estou totalmente de acordo contra todas as práticas cruéis em relação aos animais e que é necessário protegê-los, também é para justificar um pouco a excepção que vou recordar.
As directivas da CEE tentam harmonizar as leis dos diversos países membros nesta matéria. No entanto, há um dos artigos desta directiva que nos parece um pouco radical e que diz taxativamente que "os animais vadios de espécies domésticas não devem ser utilizados em ensaios e, sempre que possível, devem ser utilizados animais de criação especial". Refiro-me à investigação científica e à utilização de animais nessa investigação.
Sabemos que talvez possa ser uma crueldade, mas a investigação científica depende muitas vezes do aproveitamento dos animais para essas experiências. O que é indispensável é que isso seja feito com o mínimo de sofrimento para essas espécies animais.
Como todos sabemos, a maior parte dos nossos laboratórios de investigação são alimentados para estas experiências por cães vadios que são recolhidos pelas câmaras municipais.
Como uma repercussão no nosso país desta directiva da CEE, certas câmaras municipais, nomeadamente a de Lisboa, tomaram já medidas no sentido de suprimir o fornecimento de cães vadios aos laboratórios de investigação portugueses. Eu próprio recebi uma carta de um responsável do Instituto de Fisiologia chamando a atenção para esse facto, dizendo estar convicto de que não serão fáceis ou mesmo possíveis modificações da directiva da CEE.
Ora, não posso deixar de fazer um comentário estritamente pessoal: suo abatidos anualmente milhares de animais vadios em todos os países europeus. Quer dizer, os animais que se estão a recusar aos laboratórios de investigação científica não deixam de ser abatidos e às vezes são-no até com mais crueldade do que as técnicas utilizadas na investigação.
Por outro lado -o que também é uma contradição -, a própria directiva admite que sejam utilizados animais produzidos em estabelecimentos especiais para esse fim, isto é, montam-se empresas, engrenagens que produzam animais que depois serão vendidos aos laboratórios de investigação com esta finalidade!...
Ora, é neste sentido que pergunto a V. Ex.ª se está ou não disposto a introduzir no projecto de lei uma disposição que permita a utilização dos animais abandonados na investigação científica, desde que a prática dessa investigação seja devidamente regulamentada no sentido de evitar toda a espécie de sofrimento aos animais.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Deputado António Maria Pereira, gostaria de dizer que damos o nosso voto favorável a ambos os projectos de lei em apreço, considerando, contudo, que deveriam merecer uma ulterior ponderação nos termos em que adiante me pronunciarei.
Em primeiro lugar, devo dizer que não me parece que a questão das touradas seja uma matéria para "terçar armas" -se assim se poderá dizer- entre os diferentes partidos, porque certamente que nas bancadas do PSD, do PS, do PCP, do CDS, de Os Verdes, do PRD e dos deputados independentes haverá deputados a favor e contra as touradas. Portanto, não creio que esta matéria seja correctamente colocada numa perspectiva partidária.
Porém, não deixarei de colocar uma questão. Apesar de já não estarmos na Idade da Pedra - a lide de touros remonta ao Paleolítico-, embora se possa falar de que as culturas se mudam, como referiu o Sr. Deputado André Martins, de alguma forma foram sobretudo ideologias civilizadoras que acompanharam a centralização do poder religioso na Igreja romana que lançaram o processo contra as touradas.
Ora, o Sr. Deputado não acha que, de uma certa maneira, estamos a ser dominados culturalmente? Portanto, até que ponto é que, quando reagimos contra a questão das touradas, não estamos a ir atrás, no caso vertente e da actualidade, de um domínio cultural que afasta a nossa própria tradição?
Isto não significa tomar posição sobre a questão das touradas - reservar-me-ei para quando for discutida essa questão, pois creio que não é este o local para o fazer - mas significa colocar a questão de saber até que ponto é legítimo a outra cultura impor o seu padrão à cultura da qual nós provimos.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Mota.

O Sr. António Mota (PCP): - Sr. Deputado António Maria Pereira, depois de ter ouvido com muita atenção a intervenção de V. Ex.ª e lido o seu projecto de lei, devo dizer que não estamos de acordo com boa parte da matéria contida neste diploma. No entanto, temos algumas reservas e apresentaremos, aquando da discussão na especialidade, propostas no sentido de introduzir algumas alterações a essa matéria.
Quero referir-me directamente a uma questão ressaltada por V. Ex.ª na intervenção que fez, que é o problema das touradas. Ficou a Câmara a saber que o Sr. Deputado é um grande contestatário das touradas - está no seu direito de gostar ou não, como nós temos o direito de gostar ou não de outras coisas. Mas depois fiquei algo confuso ao ler o artigo 115.º, respeitante às sanções. Se o que aqui está é o que interpretei, concluo que o Sr. Deputado ainda é muito benevolente em relação às touradas. No n.º 3 do artigo 115.º, por exemplo, diz-se que "o abandono de um animal de companhia é punido com pena de prisão até dois anos e multa correspondente". O n.º 4, curiosamente, diz que "a violação do disposto no artigo 22.º, n.º 2, quanto à proibição da morte do louro na arena e da sorte de varas, será punida com pena de prisão até seis meses e multa correspondente". Não haverá aqui, Sr. Deputado, uma grande contradição?
Por um lado, o Sr. Deputado opõe-se terminantemente às touradas, mas, por outro, a pena que atribui à morte de um touro na arena é muito mais pequena do que a do simples abandono de um animal de companhia. Não haverá também aqui uma contradição?