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682 I SÉRIE - NÚMERO 21

Nestes termos, penso que não deveríamos tardar e correr o risco de ficar paralisados por preocupações de perfeccionismo que sempre têm sido as causas das nossas paralisações e paralisias e que, desta vez, procedêssemos, sem delongas, à extinção das extinções a fazer.
O nosso projecto de lei salvaguarda todos os aspectos que merecem protecção e atenção. Com efeito, salvaguarda o princípio da necessária publicidade dos arquivos, embora num prazo razoável, salvaguardando, ao mesmo tempo, os interesses da investigação científica, pois mantém-se o regime actual. No entanto, salvaguarda ainda, dentro de termos de razoabilidade, os interesses do pessoal há vários anos a trabalhar nesse serviço de extinção.
Por conseguinte, com toda a franqueza, julgo que não deveríamos voltar a repetir aquilo que aconteceu há seis ou sete anos, isto é, extinguir aquilo que já carecia de extinção e continuar na mesma situação. Na realidade, isso seria lastimável, um mau exemplo, e julgo que, se tal acontecesse, apenas demonstraria que aquilo a que chamei os nossos fantasmas continuaria por extinguir.
Srs. Deputados, queria terminar esta minha intervenção, dizendo que foi difícil pôr fim à ditadura, e, afinal, o acontecimento teve lugar com alguma facilidade, vindo de onde jamais se esperaria, isto é, pela mão dos oficiais do quadro permanente das forças armadas. No entanto, esse acto libertador que cometeram não representou apenas uma libertação política, mas uma libertação em sentido amplo, ou seja, o grande acto libertador de uma parte dos fantasmas.
Portanto, devemos proceder agora ao segundo assalto ao Quartel do Carmo. E que a queda do Quartel do Carmo representou a queda política e física de quase SÓ anos de ditadura. Porém, há outra fortaleza que devemos assaltar e destruir: a fortaleza dos fantasmas!
Abaixo essa masmorra dos fantasmas da direita e da esquerda que tanto nos têm acorrentado e paralisado! Viva a liberdade!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Alexandre Manuel, Pacheco Pereira e Raul Rego.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Manuel.

O Sr. Alexandre Manuel (PRD):-Sr. Deputado Silva Marques, também eu, como V. Ex.ª, penso que alguma coisa deve ser feita em relação aos arquivos da PIDE. Também eu estou de acordo com alguns dos princípios do projecto de que V. Ex.ª é o primeiro subscritor. O mesmo, no entanto, já não poderei dizer em relação a boa parte da sua intervenção.
A propósito do projecto de lei, que é o que aqui está em causa, queria perguntar-lhe se, sabe que, neste momento, estão a decorrer investigações destinadas a teses de doutoramento e de mestrado que poderão ser postas em causa com esta transferência. Sobretudo porque o projecto está a ser discutido sem que antes se tenha aprovado o projecto do Prof. José Mattoso, ou outro similar, sobre o acesso aos arquivos. Com efeito, tal projecto devia, pelo menos, ser discutido e aprovado em simultâneo.
Por outro lado, diz V. Ex.ª que se vai manter, exactamente como até agora, o acesso a esses arquivos. Porém, «como até agora» significa quase o não acesso!... É que, ultimamente, tal acesso tem sido muito dificultado ou até não tem mesmo existido.
Refere ainda o projecto de lei em apreço 25 anos para a abertura dos arquivos. Esses 25 anos dizem respeito à data da extinção da PIDE ou aos diferentes acontecimentos relacionados com essa organização? É que, neste caso, uma pessoa, vítima da PIDE, que tenha morrido há 40 ou 50 anos estaria em situação igual à que, por exemplo, foi libertada no dia 26 de Abril de 1974!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Deputado Silva Marques, sei que não são habituais estes pedidos de esclarecimento vindos da mesma bancada, mas há pelo menos uma questão no projecto de lei apresentado que penso que mereceria maior atenção e que tem a ver com a data de abertura dos arquivos.
O problema que se coloca em relação aos arquivos da ex-PIDE/DGS reveste, como sabemos, alguma delicadeza. Porém, devo já dizer que a mais abstrusa das propostas que apareceram sobre esta matéria foi a de queimar parte dos arquivos.
Não compreendo que num regime democrático se façam propostas deste género. Só os regimes totalitários é que pretendem alterar a história, queimando os documentos que dela se herdam.
Felizmente que essa proposta que surgiu não teve tradução legislativa, pois, efectivamente, mostra uma relação muito pouco saudável com a nossa história.
Ora, é exactamente em nome da relação que devemos ter com a nossa história imediata que a data de abertura dos arquivos tem relevância. Nesse sentido, discordo da data apresentada pelo Sr. Deputado Silva Marques, ou seja, 1999, e penso que, por exemplo, a data de 1994, proposta no projecto de lei do PCP, que, aliás, correspondia à data apresentada no anterior projecto sobre esta mesma matéria, é muito mais razoável, até por razões de carácter essencialmente político.
Tal como o Sr. Deputado e outros Srs. Deputados nesta Assembleia, eu tenho ficha nos arquivos da PIDE e estou inteiramente à vontade em relação a ela. Assim, devo dizer-lhe que uma das coisas mais saudáveis que se podem fazer para a vida pública portuguesa é abrir os arquivos da PIDE. Isto para que não aconteça em Portugal aquilo que, de alguma maneira, aconteceu em outros países como a França, que ainda hoje, 45 anos depois do final da II Guerra Mundial, anda às voltas com a sua história da resistência, da colaboração e da depuração, envenenando a vida pública actual.
Não devemos ter medo do nosso passado, quer no que diz respeito à descolonização, quer no que concerne ao regime autoritário. A melhor maneira de os portugueses fazerem as suas pazes interiores e interiorizarem aquilo que aconteceu antes de 1974 é colocar-se ao acesso público os documentos e os arquivos existentes, dando-lhes o único tratamento que, 20 anos depois do 25 de Abril, é útil para esses arquivos: o da investigação histórica.
Por conseguinte, é em nome dessa normalização dos portugueses em relação ao seu passado e em vista a terminar com os fantasmas herdados desse mesmo passado, que lhe fazia um apelo no sentido de aceitar uma diminuição da data de abertura dos arquivos, de modo que eles pudessem ser acessíveis a todos os que os quiserem consultar numa data que faça com que a nossa geração - a última que, de algum modo, passou pelos arquivos da PIDE - possa ter um conhecimento e uma assumpção integrais da sua história