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I SÉRIE -NÚMERO 84 2756

a ama que defende é boa, excelsa, escorreita, que foi afagada por uma tramitação democrática intocável e sem quaisquer oposições dignas de crédito.
Todavia, a realidade é outra. Como o filho da duquesa de Brabante, o Acordo é feio, excêntrico e malquisto.
Nasceu no conúbio obscuro e vastamente contrariado, com justeza, por quantos o observaram sem prejuízos. Surgiu desamparado de providências indispensáveis a um devir frutuoso.
Mais: perante a Câmara, apareceu à revelia de um debate que deveria ter sido feito em todas as vertentes e se quedou pela componente estritamente parlamentar, com laivos de magreza intolerável, uma vez que o Sr. Secretário de Estado primou pela ausência reiterada e ostensiva nos locais onde deveria dar mostras do seu conhecimento, há pouco histríonizado de forma ostentatória.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Acresce que, insisto, foi afirmado e ficou nas actas, se pretende uma votação assente na distinção entre a questão política da aprovação do acordo e a matéria técnica que lhe subjaz.
Rebelamo-nos inteiramente contra tal concepção.

O Sr. José Magalhães (Indep.): - Exacto!

O Orador: - Qualquer que seja a qualificação que se busque, os deputados não podem votar o Acordo Ortográfico sem conhecer o quadro das referencias em que se plasmou e os resultados a que conduzirá.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Uma língua é um corpo vivo, cuja biologia deve conhecer-se profundamente, em movimento, cuja aceleração, por agentes exógenos, das transformações a empreender, deve ser analisada em todas as suas consequências. Não é, pois, concebível que se aprove um documento com a natureza deste sem uma exegese aturada de cada uma das bases que nos são sujeitas e sem dar ouvidos a todos quantos, no decurso do tempo, que já é longo, foram podendo observar a realidade concreta e emitir juízos cuja idoneidade se não porá em causa. Refiro-me, antes de tudo, a conceituados especialistas, e, de entre eles, os que, na CNALP, a começar pelo seu presidente, Professor Aguiar e Silva, não regatearam um contributo justificado e, a meu ver, decisivo.
O que acontece é que, enquanto tudo se pretende centrar na adopção atrabiliária de um Acordo Ortográfico imperfeito, se vão esquecendo medidas concretas de políticas que se desejaria estivessem a ser adoptadas, nuns casos, e que já o deviam ter sido há muito tempo, noutros casos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador:-Enquanto se centra tudo no panegírico, por vezes um pouco farisaico, da magnitude, como veículo unificador do espaço de lusofonia, de um acordo como este, está a afundar-se no vazio a consideração das sensatas objecções levantadas pelos editores e livreiros, pelos utentes qualificados da língua, pelos escritores, por todos quantos, no jornalismo ou onde quer que seja, quotidianamente, se exprimem no idioma comum.
Nós, PCP, somos a favor de um acordo ortográfico
- dissemo-lo, de modo claro, desde a primeira hora - e adoptámos, em consonância, um atitude de abertura e de grande ponderação: promovemos - fomos o único partido que, enquanto partido, o fez! -, no- âmbito desta Assembleia, dois colóquios com prestigiadas personalidades para o estudo minudente, momento a momento, de cada uma das incidências dos sucessivos articulados conhecidos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: -Procurámos, em todas as circunstâncias, adequar o nosso juízo, a nossa postura, àquele que poderia ser o melhor contributo para um bom trabalho final. Por isso, antes de mais ninguém, desde há meses, defendemos a reequacionação das bases, que o Sr. Secretário de Estado da Cultura assinou, e a renegociação do Acordo. Por isso, antes de mais ninguém, pugnámos para que se aprovasse um acordo apto a servir o espaço da lusofonia, a dar projecção à língua portuguesa no mundo, tanto como às culturas que ela mediatiza E se esta questão de princípio é, para nós, vital, não menos vitais são as questões de metodologia para atingir um fagueiro desiderato.
Importa, desde já, acentuar que o Governo não poderia ter seguido pior tramitologia. Nós ainda aceitaremos que a Academia das Ciências de Lisboa procurasse laborar no sossego dos gabinetes, com incidência numa base meramente linguística, de alguma forma científica e técnica, mas o que nunca poderíamos ter admitido, e não admitimos, foi que o Governo subtraísse ao debate generalizado as delicadas questões com as quais estamos a operar.
Proclamámos que esta não é a sede de apreciação de algo cuja índole seja ontológica mas gnosiológica. É curial levar o conhecimento a todos os limites. Aprofundar, de toda a maneira, o quadro das problemáticas que se envolvem. A inexistência desse apurar de opiniões, tempestivamente realizável, inquina, de maneira indubitável, a malha normativa a que se chegar, a malha normativa a que se chegou. Não deixaremos, pois, de afirmar, dianteiramente, a nossa frontal oposição às metodologias negociais seguidas.
Por outro lado, entendemos inaceitável - reitere-se! - a postura da Secretaria de Estado da Cultura, não apenas por se haver, sistematicamente, eximido ao confronto de pontos de vista com os deputados e os agentes culturais, mas por ter adoptado, efectivamente, uma política de sigilo, que nem por se travestir, em algumas instâncias, de uma vaga habilidade, se dissociou de gravosos constrangimentos ao natural e aviventador contraditório que urgia.
Acentuámos, na hora própria, que a ausência de uma política da língua, concebida como um elenco de medidas indispensáveis, concomitantemente - se não mesmo com carácter prévio- ao acto da assinatura de um acordo ortográfico sério, foi dos actos lastimáveis de que se revestiu todo o processo que aqui culmina. Não se estranhará, a tal luz, a génese da já por mim condenada perspectiva do Sr. Secretário de Estado da Cultura, Dr. Santana Lopes: a de que nós podemos aprovar o articulado em agenda- admitindo que nele se incluem incongruências e erros -, dado o carácter não imutável, transitório, do que estabelecemos, dado o carácter livremente revisível do que ratificarmos. A mesma leviandade explica tudo. Preconizamos, pelo contrário, que somos obrigados a produzir, nos limites do nosso conhecimento, em cada patamar histórico, o mais perfeito que formos capazes.