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29 DE MAIO DE 1991 2759

vocabulários ortográficos e ortoépicos, vocabulário de terminologia técnica e científica-, se conseguirmos transformar os órgãos de comunicação social em verdadeiras escolas de promoção linguística, então, sim, teremos conseguido lançar sólidas bases de uma política linguística consequente.
Lançamos este repto ao Governo. E mais. Como 6 sabido, a difusão internacional de qualquer idioma obedece, nos nossos dias, a regras de promoção sobejamente conhecidas. «Exporta-se» a língua através de todos os veículos de cultura-o livro, o jornal, o filme, a exposição, a conferência, o teatro, o concerto, etc. -, mas também através do contacto com outros povos.
Unir e não separar deve ser o objectivo.
Unir os povos da lusofonia, em tomo deste fermento de cultura que é o idioma, é o objectivo primordial. Fomentar o intercâmbio cultural exige outro tipo de medidas. Desde a concessão de facilidades nas tarifas postais e alfandegárias, até à redução dos preços de viagens, muito pode ser feito. Muito deve ser feito.
Pela nossa parte, esperamos -quase me apetece dizer, exigimos- que o presente Acordo seja o primeiro passo de muitos e mais importantes passos que têm de ser dados para que a língua portuguesa «floreça, fale, cante, ouça-se e viva», como queria o poeta.
Esta é a grande opção. Não só do Governo, mas de todos nós, deputados, portugueses. Temos de saber o que queremos para a língua portuguesa no futuro.
Nós, socialistas, sabemos bem o que queremos e quais as estratégias para alcançar os objectivos de promoção e valorização da língua portuguesa.
Queremos que a língua portuguesa seja, no virar do segundo milénio, falada por mais de 200 milhões de pessoas e seja língua de grande prestígio internacional.
Finalmente, passando à análise dos aspectos técnicos do Acordo Ortográfico, não vou entrar em minúcia, pois esta não é a sede própria para uma discussão deste tipo.
A Assembleia da República é um órgão político e não uma roda de especialistas.
Acresce que não sobrevalorizo o facto de algumas soluções preconizadas não serem consensuais, mesmo entre os especialistas.
A longa história dramático-cómica da ortografia portuguesa, tecida mais de desacordos que de acordos, está recheada de desconcertos, desencontros, controvérsias e até de cenas hilariantes, como algumas a que, já hoje, aqui assistimos. Seriam cómicas se não fossem lamentáveis. É que a língua portuguesa exigiria mais elevação no debate e mais compostura na pose.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as. e Srs. Deputados: A ortografia é convencional, logo não pode ser perfeita. Segundo Vendryés, «a língua escrita nasceu, sem dúvida, de uma convenção estabelecida por alguns indivíduos». Por isso, as alterações ortográficas, quaisquer que elas sejam, são sempre provisórias e geram sempre contestação.
Como reconhece Cândido de Figueiredo, «se cada um de nós fosse árbitro de uma reforma, teríamos um labirinto». Ele, que fez parte da comissão responsável pela reforma ortográfica de 1911, confessa: «se, individualmente, fosse encarregado de propor a reforma, faria proposta que, nalguns pontos, embora secundários, divergiria da proposta que subscrevi».
Importa, por outro lado, recordar que, até ao fim do século XIX, reinou a anarquia ortográfica, misturando-se os mais variados critérios: sónicos, etimológicos e estéticos.
Enquanto Camões, Verney e Castilho adoptaram a escrita fonética, Herculano defendeu a escrita etimológica, Garrett submeteu-nos aos seus critérios estéticos e Camilo nem sequer se preocupava com ela, a ortografia.
Eça sabia que retórica se escrevia com h, só não sabia se era na primeira ou na segunda sílaba.
Com tais exemplos, convenhamos que não vale a pena sobrevalorizar o que é secundário. E a ortografia - como já disse- é a aparência de que a língua é a substância.
Mudam-se os tempos e as vontades, muda-se a ortografia. Assim tem sido. A ortografia vai acompanhando as mudanças a que vamos assistindo noutras áreas. Alterações pontuais ou sistémicas, de tira consoante ou põe acento, por decreto-lei ou por lei, de tudo isso se compõe a história da ortografia portuguesa.
Não há, pois, que objectar a que, periodicamente, se ajuste, simplifique e actualize a escrita das palavras. Muda-se a imagem, não o ser.
As reformas ortográficas não obrigam ninguém. Não estão previstas punições. As sanções são apenas de natureza social. Perante esta lei, tão livre é o indivíduo para acertar como para errar. E já houve quem, como Gonçalves Crespo, descobrisse encantos especiais nos erros de ortografia.
Reconheço que a oposição a qualquer reforma ortográfica é compreensível, é mesmo humana. Colide com os hábitos e com os olhos. E o homem é um animal de hábitos que tem mais olhos que barriga, dizem os entendidos.
Em geral, combate-se o Acordo Ortográfico pela razão - nem sempre confessada - de que contraria os hábitos ou fere a vista. A aceitarmos tais argumentos, a «ortografia ocular» prevaleceria no maré magnum da ignorância e a ortografia racional soçobraria nos escolhos da rotina inconsciente.
Há, todavia, preocupações fundamentadas a propósito das consequências do Acordo Ortográfico. São legítimas as reivindicações dos editores. Não é justo que esse sector profissional seja mais penalizado do que os restantes cidadãos. Tem o Governo de acautelar esta e outras situações, em diálogo com todos os interlocutores idóneos.

O Sr. Armando Vara (PS): - Muito bem!

A Oradora: - São igualmente legítimas as preocupações dos professores em geral e dos professores da língua materna em especial. É urgente, é necessário que o Ministério da Educação lhes explique como pensa ultrapassar todas as dificuldades.
Diálogo é preciso, designadamente para se aperfeiçoar nalguns aspectos o presente texto. Isso não só é possível como desejável e pode ser feito em qualquer momento.
Mais informação e ideias claras também são precisas.
Foi a falta de informação, a falta de debate e a falta de diálogo que geraram, em parte, a contestação, a suspeição, a rejeição do Acordo. Há custos inevitáveis, pessoais e sectoriais como sejam a aquisição de novos automatismos, a adaptação dos parques editoriais, a reciclagem de professores e outros profissionais da palavra. Mas era possível evitar algumas manifestações mais emocionais.
E para desdramatizar a «querela da ortografia», convoco a palavra do saudoso mestre Agostinho de Campos, a propósito da reforma brasileira de 1934: «Se, na Alemanha, fosse possível, como no Brasil, esta coisa maravilhosa a que se pode chamar guerra civil ortográfica, com certeza teriam sido fuziladas ali umas SOO pessoas, a propósito de decidir se o sclyster» possui maior