2972 I SERIE -NÚMERO 90
aquela o principal instrumento de modernização e transformação da sociedade, do desenvolvimento cultural e mudança dos comportamentos políticos, o mesmo é dizer do aprofundamento do processo democrático destinado a facilitar a participação dos indivíduos, dos grupos e das colectividades na vida pública e na tomada das decisões que a todos dizem respeito, ninguém melhor que o Chefe do Estado, a quem cabe zelar pelo regular funcionamento das instituições democráticas, estaria em condições de expressar juízo ou opinião sobre o que se pode chamar «o estado da Nação no domínio da informação».
A Constituição da República é bem clara nas garantias de pluralismo e independência que exige quanto à liberdade de informação. Sucede que encontram-se já constituídos entre nós os órgãos de controlo previstos na Constituição, após a última revisão, para velar por essas garantias, muito embora tenhamos sempre manifestado as nossas sérias reservas quanto à própria composição e critérios adoptados nalgumas das suas controversas deliberações pela Alta Autoridade para a Comunicação Social; através do desmantelamento do sector público estatal no domínio da propriedade dos órgãos de comunicação social, caminha--se para a criação de um espaço aberto ao exercício efectivo do direito de informar e ser informado, proporcionando um campo aberto ao debate e ao confronto das opiniões. Como noutros países, a imprensa realiza hoje aquilo que Edgar Morin chama a bipolaridade dos mass média, tornando público aquilo que até há pouco tempo era considerado privado e que explica neste termos: «As informações não são dadas apenas como uma série de instantâneos, puramente factuais, simplesmente justapostos uns aos outros; elas surgem como as ilustrações de uma verdadeira 'teoria' que tanto é obra do destinatário da comunicação como daquele que a envia.» A dramatização das situações, a vedetização de tudo o que é emocionante e sensacional, o aparecimento das chamadas notícias políticas, a divulgação dos elementos anedóticos da vida privada dos políticos, tudo isto faz hoje pane do quotidiano da nossa comunicação social escrita. Isto não obstante as críticas que, por exemplo, em 1988, Manuel Teixeira, do Comércio do Porto, fazia à imprensa estatizada nestes precisos termos: «os jornalistas portugueses não ignoram que a esmagadora maioria, senão a totalidade, dos órgãos da comunicação social pertencentes ao sector do Estado ou entidades públicas são empresas mal dimensionadas, com pesadíssimos encargos de mão-de-obra, estruturalmente concebidas numa perspectiva tecnologicamente ultrapassadas, financeiramente asfixiadas, economicamente desequilibradas.» E acrescentava: «Quer isto dizer que estamos perante alguns pequenos monstros que não poderão continuar, de forma alguma, por muito mais tempo a viver como sempre viveram.»
A falência de algumas iniciativas que pareciam arrojadas, a penúria da quase clandestinidade em que vegetam alguns títulos a caminho do encerramento, a ameaça de descalabro financeiro que pesa sobre alguns jornais outrora prestigiados, os elevados custos equacionados com a exiguidade do mercado publicitário concentrado em algumas mãos, constitui um circunstancialismo desencorajador para uma imprensa que se quer de qualidade, a que a nossa posição de país europeu impõe com extrema urgência.
As recentes privatizações de dois jornais de grande circulação, respectivamente no norte e no sul do País, vieram levantar a suspeita que desde há muito se temia de concentração dos principais diários passarem para o controlo dos grupos financeiros não suficientemente conhecidos do grande público.
O Sr. António Guterres (PS): -Muito bem!
O Orador: - Os exemplos dos outros países europeus demonstram que a largueza da tiragem necessária para o negócio ser lucrativo está sempre associada a centros de produção crescentemente reduzidos, como também está provado que as leis anti-trust ou de defesa da concorrência nem sempre são suficientes para evitar, na prática, a formação de grandes cartéis de informação, em aberta violação, aliás, do imperativo constitucional que comete ao Estado assegurar a liberdade de informação e a independência dos órgãos da comunicação social, impondo o princípio de especialidade de empresas titulares de órgãos de informação geral, tratando-as e apoiando-as de forma não discriminatória e impedindo a sua concentração, designadamente através de participações múltiplas e cruzadas, como também lembrou o Sr. Presidente da República.
A coincidência do teor dos editoriais de ontem do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias que se sentiram directamente atingidos por uma passagem da mensagem presidencial, não pode deixar de ser, mesmo que se trate de pura coincidência, motivo para preocupação. Temos, pois, de estar vigilantes e preparados para aprofundar, se necessário for, através de medidas legislativas, o sistema jurídico-institucional que garanta a efectiva liberdade de informação na imprensa diária. A concorrência salutar que neste momento se verifica entre os principais jornais em vias de privatização e os novos periódicos privados contribuirão certamente para os jornalistas se porfiarem no seu profissionalismo, isenção e independência.
Não se pode esperar que toda a imprensa escrita trate por igual todas as correntes político-partidárias. Ninguém desconhece que um jornal privado tem inteira liberdade de adoptar os seus próprios critérios de preferência nos artigos de opinião, mas o rigor e a ética obrigam a que a notícia não seja manipulada, que a selecção e o alinhamento dos acontecimentos políticos não seja sistematicamente feito para prejudicar ou debilitar aleivosamente a imagem pública de certas personalidades, grupos ou partidos, que a apreciação das posições assumidas por diversos líderes políticos não se faça de uma forma sofisticada de propaganda política e que, sob a capa de análises, veicule mensagens sectárias e que se dê guarida privilegiada a alguns plumitivos, cuja única obsessão é atacar de uma forma infundada e infudamentada os adversários políticos, em manifesta violação do estatuto editorial destas publicações, que proclamam os propósitos de rigor, isenção e pluralismo, como seus princípios nortcadores.
Não quero exemplificar como alguns diários de boa circulação, que recentemente mudaram de proprietários, estão a descambar no culto da personalidade e da adulação do poder.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Seria lamentável que a passagem destes jornais do sector público para o privado contribuísse para a desinformação e sujeição ideológica, desvirtuando as regras do jogo democrático, muito especialmente em época marcada pela disputa eleitoral, como é a que estamos a viver no presente. Tem, por isso, inteiro cabimento o aviso do Sr. Presidente da República quando sublinha que «A liberdade de informação não pode ser apenas garantida pela observância dos direitos dos seus produtores e agentes.