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8 DE JUNHO DE 1991 2999

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Textos estatísticos periodicamente divulgados pelo PCP provam que cie é o partido mais duramente atingido pelas práticas discriminatórias que caracterizam a política de informação da RTP. A simples leitura do rol de iniciativas comunistas não cobertas, de exclusões na programação e de graves deturpações das nossas tomadas de posição ocuparia mais tempo do que o disponível para esta intervenção.

Dispenso-me, portanto, de proceder ao inventário da situação de discriminação sistemática que nos atinge. Registo somente que este ano houve uma série de debates mas apenas um multipartidário. Quanto aos seis frente-a-frente realizados, o Governo esteve presente em todos, o PS em três, o PCP, o PRD e o CDS apenas uma vez.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aludindo à privatização do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias, o Presidente da República manifestou-se preocupado com «formas ocultas de dependência e concentração ilegítimas». Creio que foi demasiado brando ao falar de «dúvidas sobre a transparência desses processos». Isso, porque tais processos foram escuríssimos.

É outro tema que incomoda muitíssimo o Governo. No início do ano, após o primeiro adiamento do leilão do Diário de Notícias, o Secretário de Estado para a Comunicação Social compareceu na Assembleia, mas não soube responder a perguntas relativas a supostas e graves irregularidades cometidas na operação de venda do Jornal de Notícias. O não pagamento pelo grupo Lusomundo de parte do lote de acções que adquirira era então lema de extensos artigos no Expresso e no Público. Mas o Secretário de Estado, Sr. Albino Soares, ficou na altura mudo, de nada sabia! Semanas depois, porém, dirigindo-se à Comissão de Economia, Finanças e Plano, afirmou que tudo fora regular na venda do Jornal de Notícias e que não houvera sequer atrasos nos pagamentos da Lusomundo.

Estranha revelação. Que política para a comunicação social é, afinal, a do governo Cavaco, cujos membros adoptam comportamentos tão contraditórios, como a deste Sr. Secretário de Estado?

Os trabalhadores, sobretudo os jornalistas, esses, foram mais uma vez tratados como rebanho sem vontade, simples robots, produtores de mais-valia.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proximidade das eleições foi invocada pelo PSD como argumento para qualificar de inoportuna a mensagem presidencial.

Independentemente de o Presidente ter exercido, como e quando entendeu, um direito constitucional do qual não pode ser juiz o PSD, a questão da data escolhida não é irrelevante.

Com as eleições legislativas à porta, a governamentalização dos audiovisuais carrega uma dupla ameaça: por um lado, influi nos resultados em benefício do partido do Governo e, por outro, constitui um factor de perversão da democracia.

Admito que ninguém nesta Câmara contesta o princípio segundo o qual sem liberdade de informação não há democracia. Mas a direita cavaquista simula esquecer que a perversão da opinião pública, mediante a instrumentalização e a governamentalização dos media não é um fenómeno súbito, instantâneo. A fronteira entre a liberdade e a ausência de liberdade é por vezes movediça, difícil de traçar. Não se acorda, de um dia para o outro, descobrindo que ela desapareceu. A redução das liberdades insere-se num processo gradual, quase molecular, cujo avanço no rolar dos dias é quase imperceptível.

Por isso mesmo se justifica a advertência: a governamentalização da RTP e da RTP, ao ferir as liberdades e perverter a opinião pública, ameaça também a democracia.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu partido considera negativa a atitude do PSD ao fazer rufar os tambores em protesto, quando o Presidente da República, reagindo ao que ouve, vê e lê e a queixas recebidas, decidiu pedir à Assembleia da República uma reflexão aprofundada sobre a problemática da comunicação social e as medidas legislativas que tenha por convenientes para assegurar nela o pluralismo. Obviamente que tal reflexão não pode esgotar-se numa manhã como a de hoje, por iniciativa louvável do CDS.

E que está a acontecer, Srs. Deputados?

O PSD não quer reflectir. Sataniza a iniciativa presidencial e benze-se com temor de qualquer mudança na RTP. O PSD quer entrar no período eleitoral sob os chapéus de uma televisão e uma rádio governamentalização e de uma parcela da imprensa escrita, onde vai tomando forma um poderoso grupo monopolista nascido do parto das privatizações.

Não é difícil perceber por que sorria o Primeiro-Ministro, durante o programa Primeira Página, ao colocar-se, displicente, na postura do procônsul romano Pôncio Pilatos, quando se negou a dar uma opinião sobre a RTP. Está contente o líder do PSD! Pretende que tudo, na comunicação social, fique como está. Ora, isso é coerente com o seu conceito de democracia.

Aplausos do PCP, do PS e do deputado independente Jorge Lemos.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Manuel Maia.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é de hoje, nem tão-pouco exclusivo deste país, a atracção que o poder político costuma mostrar pela comunicação social: discretamente umas vezes, indiscretamente outras.

E, neste caso, através do controle económico, da precaridade do emprego ou da utilização de jornalistas que, esquecidos da sua obrigação de informar, se transformam, e lamentavelmente quantas vezes, em autênticos comissários políticos.

Não foi por acaso que se atrasou tanto a privatização dos jornais - neste momento, convém recordar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que essas privatizações foram a consequência de uma decisão política, que nada teve a ver com o sector-, não foi por acaso que se adiou, quase indefinidamente, a legislação sobre as rádios locais e não é ainda por acaso que se tem vindo a adiar a abertura da televisão à iniciativa privada.

Mas, o pior de tudo, é que os partidos - todos, sem excepção - procedem de modo diferente, conforme estão no poder ou na oposição, com a preocupante atitude de, em último caso, culpar o jornalista das suas próprias incapacidades e das suas limitações.

Por isso mesmo, importa encontrar mecanismos capazes de garantir a independência possível dos diferentes órgãos de comunicação social, independentemente de quem, ocasionalmente, se senta na cadeira do poder é que os políticos sucedem-se, mas a informação terá de permanecer!