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19 DE MARÇO DE 1993 1785

da administração económica as sociedades de capitais públicos, as sociedades mistas e as empresas públicas.
Ora, tudo isto traz um dado novo ao direito financeiro. Assim, verificamos que o determinismo da lei e a intervenção unilateral como regra, cederam o passo à participação do mundo privado, e o negócio entrou no mundo do direito financeiro.
Deste modo, o sistema financeiro adquire, cada vez mais, contactos com o sistema sócio-económico, ao mesmo tempo que aumentam as dificuldades dos parlamentos em acompanharem a execução orçamental, em perseguirem a desorçamentação e em perceberem a privatização da intervenção administrativa.
Curiosamente, é o próprio Parlamento que está aqui, hoje, em causa, pois a degradação do Tribunal de Contas, num quadro em que o Parlamento é incapaz de um controlo efectivo sobre o sistema financeiro público, corresponderia, no fundo, à degradação do próprio Parlamento.
Foi o intervencionismo económico, social e fiscal que trouxe os escândalos e os conflitos políticos para o mundo das finanças públicas, nos sistemas democráticos. Estes escândalos e conflitos políticos não são típicos da neutralidade financeira, mas antes categorias nascidas no tempo em que o montante e o número das operações financeiras públicas cresceu desmesuradamente.
É neste quadro que se justifica, por isso, uma reflexão sobre o exercício dessa função objectiva e constitucional de controlo da gestão e da utilização dos fundos públicos.
Na verdade, os meios clássicos de controlo deixaram de estar adequados às novas realidades. O controlo que o Parlamento exerce sobre o sistema financeiro, através do principio da legalidade financeira, tornou-se quase só um símbolo das prerrogativas parlamentares.
Com efeito, o carácter preventivo da legalidade fiscal ou da legalidade orçamental significa hoje muito pouco. É sobretudo um controlo sobre a receita, quando se sabe que uma despesa pública pode agredir tanto, ou mais, os cidadãos como o estabelecimento de um imposto. É, sobretudo, um controlo sem sequência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Conhece-se o caminho a percorrer, para nos adaptarmos à nova realidade que acabei de caracterizar sumariamente. O caminho é, em primeiro lugar, o de assegurar a plena aplicação de um pá~ fundamental e, afinal, clássico: o âmbito da intervenção do Tribunal de Contas coincide com o âmbito de utilização dos dinheiros públicos.
15to significa que a evolução das competências do Tribunal de Contas só nos satisfará quando pudermos dizer que ele controla os gastos dos órgãos e serviços com tradução orçamental, mas também as transferências e a verificação dos respectivos pressupostos na pessoa dos seus beneficiários e, ainda, todos os gastos públicos sem conexão com o orçamento.
Este princípio, no nosso tempo, implica, em primeiro lugar, o alargamento de jurisdição do Tribunal de Contas, designadamente, segundo o nosso projecto, para abranger as contas das empresas públicas e das sociedades de capitais públicos.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Sentimos que este progresso é, por um lado, aconselhado pelas actuais circunstâncias.
De facto, conhece-se hoje, com mais rigor, o grau das necessidades financeiras das empresas públicas e não pode compreender-se como um tão grande volume de recursos pôde estar, e continua a estar, vedado à fiscalização do Tribunal. Foi, sem dúvida, um mau serviço aquele que prestou ao Estado democrático o legislador do estatuto das empresas públicas, ao protagonizar um recuo que nem o Estado Novo foi capaz de assumir.
Por outro lado, por razões de flexibilidade, sabe-se que a Administração vem recorrendo às sociedades de capitais públicos, por vezes como estádios intermédios da privatização de antigas empresas públicas. Estas sociedades têm mobilizado também, recentemente, um caudal significativo de recursos públicos, pelo que o seu controlo tem que ser assegurado.
Mas este progresso é, por outro lado também, aquele que realisticamente o Tribunal de Contas pode comportar. Porventura, o controlo destas contas não poderá ser rigorosamente uma questão de julgamento, mas antes talvez uma questão de auditoria ou de certificação. É um problema que a regulamentação processual poderá e deverá resolver.
O que é certo é que a fiscalização da tutela, no caso das empresas públicas, ou a fiscalização das assembleias gerais, meramente teórica, no caso das sociedades de capitais públicos, não asseguram plenamente o significado constitucional da função de controlo da utilização dos dinheiros públicos. Enfim, diga-se que as regras e os processos da contabilidade pública são muito diferentes dos da contabilidade privada.
Gostaríamos de ir mais além. Com certeza que alguns outros trabalhos ou tarefas do Tribunal de Contas, designadamente a propósito do instituto do visto, deveriam ser aligeirados, tal como em outros países, em nome da modernização. Temos, porém, a consciência - com o acordo dos interessados, porque o CDS quer assumir que ouviu os conselheiros do Tribunal de Contas antes de fazer a sua proposta - de que a ruptura abrupta em matéria de visto provocaria o caos e de que o aumento das competências só poderá ser gradual, mantendo-se a estrutura actual do Tribunal de Contas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Duas últimas notas importam ainda para o nosso tema de hoje.
A primeira diz respeito à necessidade de cumprir o artigo 59.º da Lei n.º 8«9. É, de facto, incompreensível que, mais de dois anos volvidos sobre a sua aprovação, não esteja ainda regulada a matéria respeitante à estrutura, natureza e atribuições dos serviços de apoio do Tribunal, o que degrada, naturalmente, as suas condições de funcionamento, o brio e a dignidade do respectivo pessoal.
Não iria tão longe como alguns desconfiados que afamam que esta situação não é inocente e representa uma agressão deliberada contra a instituição; mas diria, pelo menos, que foram já ultrapassados os mais tolerantes limites da incúria governativa.
A segunda diz respeito ao problema das incompatibilidades da função de juiz do Tribunal de Contas. Deixando de lado o problema da inconstitucionalidade da proposta da maioria relacionada com esta matéria, não podemos alar um protesto contra uma medida persecutória, a um tempo, contra o Tribunal de Contas e contra a própria Universidade Católica,...

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - ... que degrada a função legislativa e que constitui, ao mesmo tempo e objectivamente, uma manobra de intimidação ostensiva dirigida a todos quantos assumem, no Estado democrático, uma função fiscalizadora.