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20 DE MARÇO DE 1993 1805

conta-a publicação do Código do Procedimento Administrativo e do Decreto-Lei n.º 129/91, de 2 de Abril.

O Sr. Presidente (Ferraz de Abreu): - Sr. Deputado, atenção ao tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Não teve em conta, quanto mais não seja, que, nesses domínios, as leis formais, mesmo quando não se limitam a meros programas políticos, têm uma eficácia muito reduzida, quase nula.
O Código do Procedimento Administrativo aí está a demonstrá-lo. Quando se evoca este código nas repartições públicas, é preciso levá-lo debaixo do braço, porque os funcionários que nos atendem não o conhecem, ignoram-no. Não foi feita uma divulgação adequada desse instrumento normativo, e os procedimentos continuam a ser pautados por costumes, velhas praxes e praxes burocráticas, e não por praxes próprias de uma Administração aberta.
Pior ainda acontece com o decreto-lei que visa melhorar as relações entre os utentes e os serviços. Também ninguém o conhece, ninguém o pratica, ninguém o aplica.
Assim, o que verdadeiramente faz falta, no domínio das relações entre a Administração e os administrados, é completar o enquadramento normativo das acções de controlo da primeira pelos segundos. Consideramos que foi óptima a publicação do Código do Procedimento Administrativo, mas é necessário divulgá-lo e levá-lo à prática, como diriam os nossos companheiros da Assembleia membros do Partido Comunista Português. E mais do que pôr em prática o Código do Procedimento Administrativo, o que é preciso é rever o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e a respectiva lei de processo, caminhando decididamente no sentido da aproximação ao sistema anglo-saxónico de jurisdição plena, para controlar a Administração.
É nesse sentido que também nos iremos empenhar, embora - é claro - entendamos que tudo isto não é definitivamente contraditório com as iniciativas que estamos a apreciar. Estamos, por isso, dispostos a aprová-las na generalidade, a benefício do inventário das melhorias que lhe possamos introduzir em sede de comissão.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente (Ferraz cie Abreu): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cipriano Martins.

O Sr. Cipriano Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em discussão e debate estão agora os projectos de lei n.º 71/VI e 22/VI, aquele da autoria do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e este do Grupo Parlamentar do Partido Comunista.
Um e outro traduzem reposições já anteriormente discutidas e aprovadas na generalidade em reuniões plenárias precedentes, mas caducadas em face do decurso da legislatura anterior. Ambos os projectos, cala um à sua maneira, têm intenção clara e expressa de reforçar as garantias, liberdades e direitos dos cidadãos perante a Administração Pública, central, regional e local.
É de notar que, neste domínio, a Constituição caracteriza o direito de os cidadãos terem acesso aos registos e arquivos administrativos e o de serem informados pela Administração como verdadeiros e próprios direitos fundamentais, vinculando, sem mais, quer as entidades públicas quer as privadas, tendo uma aplicação e uma eficácia jurídica imediatas.
Esse facto, porém, não exclui algumas, contadas embora, limitações consideradas ponderosas ao exercício de tais direitos, que devem ceder perante outros valores igualmente com dignidade constitucional, como os relacionados com a segurança interna e a externa, os interesses ligados à investigação criminal e os relativos à dignidade da pessoa humana. Trata-se, no fundo, de restrições ao principio geral do acesso, que a própria previsão constitucional faz questão de taxativa e exaustivamente enumerar, mas que só servem para confirmar a regra geral da transparência.
É sabido que, em Portugal, a actuação e o papel da máquina administrativa do Estado nas suas relações com as pessoas e coro o conjunto dos cidadãos eram rodeados de algum mistério e muito secretismo. Eram um modelo de estrutura administrativa todo ele concebido, organizado e emanado de uma forma hermética, hierarquizada e centralizada. Pesque assim era efectivamente, a sua actuação e afirmação prática no terreno, no dia-a-dia, revestia, como não podia deixar de ser, uma postura distante e uma conduta guiada por critérios burocráticos, anacrónicos, reflectindo ao pormenor a sua armadura interna e externa napoleonicamente artilhada. Vivia-se o tempo em que o conjunto dos cidadãos se limitava a defender-se e a opor-se ao Estado em geral e ao Estado administrativo em par Ë de realçar que esta forma de concepção não democrática da Administração, com o secretismo que acompanhava a sua acção na relação com as pessoas, existiu entre nós durante a monarquia, passando pela I República e
depois, embora com uma lógica e por razões distintas, sob a ditadura que antecedeu o 25 de Abril de 1974. É oportuno lembrar que, nesses tempos, o acto administrativo era visto como um gesto concretizador da soberania, o que diz
bem da feição opressora e asfixiante da Administração Pública então vigente.
Com o advento da Constituição política de 1976, a ruptura jurídica com tais práticas e princípios do passado era inevitável. O poder constituinte de então repudia abertamente a noção de Administração fechada, distante e autoritária, plasmando no seu texto verdadeiros e próprios direitos subjectivos, como os aliás já referenciados, dando lugar à Administração democrática, aberta e humanizada.
Por fim, para concluir este tópico, diremos que tais normas e direitos, com dignidade constitucional, não são mais do que a transposição para o domínio das relações Administração versas administrados dos princípios fundamentais da democracia política: igualdade, proporcionalidade, justiça e imparcialidade.
Pelo exposto, não estaremos longe da verdade se dissermos que as iniciativas ora em discussão aparecem, uma e outra, como uma decorrência natural e lógica do artigo 268 º da Constituição, uma vez que os dois projectos aspiram a disciplinar e mesmo a reforçar certos direitos dos administrados face à Administração.
O projecto de lei n.º 22/VI, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, diz querer contribuir para a divulgação e afirmação prática dos direitos fundamentais do cidadão em face da Administração e estabelecer mecanismos que impulsionem a criação e aplicação de novas garantias e direitos cujo exercício seja relevante para a defesa dos cidadãos e o bom funcionamento da Administração.
Os seus autores reconhecem a consagração legal dos direitos dos administrados, mas afirmam que a Administração Pública está por reformar, as normas e práticas que comprometem a justiça e a imparcialidade se mantêm, as orientações secretistas violadoras do acesso à informação e da transparência administrativa aumentam. Em face disto, propõem-se efectuar através de leis o desenvolvimento, a explicitação e a regulamentação dos referidos direitos.