O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1111 - 29 DE JANEIRO DE 1994

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Subsecretário de Estado, não percebi bem esta distinção que faz entre a consulta e a comunicabilidade.

O Sr. José Calçada (PCP): - Nós é que não percebemos nada!

O Orador: - Porque, se um investigador - e todos os professores são investigadores, em maior ou menor grau - lê um documento e, depois, tem de citar o documento, isto é, se eu quero fazer um trabalho sobre o Estado Novo, sobre o Dr. Salazar e sobre o Dr. Marcelo Caetano, e se não posso, em nota de pé de página ou no texto, citar a fonte que usei, corro o risco de que pensem que estou a inventar factos ou a esconder as minhas fontes, impedindo quem leia esse trabalho de saber que ele tem solidez académica, de saber que o autor não está a inventar factos e, pelo contrário, está a fazer afirmações fundamentadas.
Em segundo lugar, há determinados factos que estão aqui «fechados a sete chaves» mas que são abertos noutros arquivos. Por exemplo, o investigador Freire Antunes publicou correspondência e factos sobre Salazar e Caetano, e até correspondência entre Caetano e Salazar, Salazar com presidentes americanos e Marcelo com presidentes americanos, etc., e citou as caixas e os documentos, mas os nossos investigadores não podem fazer o mesmo. Então agora temos de ir para os Estados Unidos da América para ler uma carta do Dr. Salazar a Kennedy, ou um encontro entre o Dr. Marcelo Caetano nos Açores com o Presidente dos Estados Unidos da América? E não podemos fazer isso aqui? Isto não cabe na cabeça de ninguém!
Talvez V. Ex.ª faça confusão - desculpe se estou enganado - entre o que é cair um documento no domínio público e ser comunicável. Quer dizer, a obra de um escritor qualquer cai no domínio público passados 50 anos - ninguém pode guardar, para além disso, a reserva sobre essa obra ou sobre os direitos de autor. Julgo que, por aí, talvez V. Ex.ª esteja a fazer alguma confusão: é melhor rever estes três conceitos - a acessibilidade, a comunicabilidade dos investigadores e o domínio público.
Pelo grande respeito e admiração que tenho pelo actual Director da Torre do Tombo, queria que, de uma vez por todas, V. Ex.ª desmentisse aqui, nesta Assembleia, esta atoarda que, contra ele, circula de estar a fotocopiar para uso privado os documentos vedados aos outros. Eu não admito, como conhecedor que sou da pessoa que está em causa, que ele faça isso! Mas V. Ex.ª tem a obrigação de fazer o desmentido.

(O Orador reviu).

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, antes de iniciar a minha intervenção, queria fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Orador: - Queria perguntar se o Sr. Presidente tem elementos que nos permitam esclarecer se o n.º 3 do artigo 3.º da Lei n. º 4/91 tem sido cumprido, no que se refere ao poder deliberativo da Presidência da Assembleia da República ou dos Vice-Presidentes na concessão de autorizações de consulta, a título excepcional, dos arquivos da ex-PIDE/DGS e da Legião Portuguesa.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Sr. Deputado, neste momento não tenho condições para lhe responder, mas imediatamente transmitirei ao Sr. Presidente da Assembleia da República essa sua solicitação, de modo a que lhe seja dada a devida resposta.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, tendo em atenção que a lei citada determina que o poder de autorizar a consulta é exercido conjuntamente pelo Presidente e Vice-Presidentes da Assembleia da República e não pode ser exercido individualmente - essa é a aplicação do regime constitucional, tal como estava definido -, pergunto a V. Ex.a, que é Vice-Presidente da Assembleia da República, se, desde 91, desde essa altura teve conhecimento directo de algum pedido de acesso a documentos. Se não teve, concluo que não houve nenhum.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Não tive, Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente. Portanto, podemos concluir que não houve nenhum pedido de acesso a qualquer documento que tenha chegado à Mesa.

O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Não, Sr. Deputado, não pode concluir assim, mas apenas aquilo que disse, ou seja, que não tive qualquer solicitação para acesso a qualquer processo.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Subsecretário de Estado da Cultura: V. Ex.ª, da última vez que esteve neste Plenário, falou-nos da Somália e espero que hoje não nos fale do Burundi ou de qualquer outra referência cultural sua! No entanto, como disponho de pouco tempo, não posso alongar-me e passo às questões que lhe quero colocar.
Não podemos aceitar a falácia da sua resposta ao fazer referência ao artigo 17.º da actual lei que estabelece o regime geral dos arquivos, que se refere, como sabe, aos documentos que não são comunicáveis por conterem dados pessoais de carácter judicial, policial ou clínico, o que, obviamente, não é o caso. É que se V. Ex.ª pensa assim só confirma um desconhecimento, que, aliás, pareceu evidenciar, daquilo que são realmente os arquivos de que estamos a falar.
Na minha opinião, estamos a falar de uma questão de política arquivística e, nesse aspecto, confirmam-se os nossos piores receios, que nos foram manifestados por personalidades como o Professor José Matoso e outras, aquando da extinção do JPA e daquela acumulação de atribuições na Torre do Tombo. Essa questão de política arquivista, obviamente, não a posso desenvolver aqui mas a outra, que é de relacionamento entre um organismo como a Torre do Tombo e os investigadores, posso e vou fazê-lo.