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3 DE FEVEREIRO DE 1994 1121

Srs. Deputados, entrando no período das declarações políticas, para o efeito, e em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Maio de 1989, a Assembleia da República deliberou, por resolução, constituir uma Comissão Eventual de Inquérito a Actos Administrativos do Ministério da Saúde, actos esses ocorridos durante os anos de 1986, 1987 e 1988.
Respondeu com tal resolução o Parlamento a notícias dadas pela imprensa sobre irregularidades praticadas naquele Ministério e aos pedidos de esclarecimento e de inquérito das bancadas da oposição parlamentar.
Aliás, a Sr.ª Ministra da Saúde da época, na sequência das dúvidas manifestadas pelo então Presidente da Comissão Instaladora do Hospital São Francisco Xavier relacionadas com alguns desses actos, ordenara um inquérito sobre estes, a levar a cabo pela Inspecção-Geral dos Serviços de Saúde.
Também o Ministério das Finanças, pela sua Inspecção-Geral, procedeu a inquérito à gestão financeira do Ministério da Saúde.
A Ordem dos Médicos organizou igualmente um processo sobre os factos em causa, que remeteu à Procuradoria-Geral da República.
Quer o Ministério da Saúde quer o Ministério das Finanças participaram à Procuradoria-Geral da República os resultados dos respectivos inquéritos.
Penso que a Assembleia da República procedeu de igual modo com os autos do seu inquérito.
Posteriormente, a Procuradoria-Geral da República, pela delegação competente, formulou uma acusação contra os agentes considerados responsáveis pelos factos ilícitos denunciados.
Recebida judicialmente a acusação do Ministério Público, o Tribunal Criminal de Lisboa, após julgamento, proferiu sentença, condenando diversos réus por considerá-los autores de factos integradores dos crimes de prevaricação e de burla, para além de diversas ilegalidades e irregularidades traduzidas na violação consciente e intencional de normas básicas e imperativas da actuação dos serviços do Estado.
Pois bem - dirão alguns -, que a Justiça actue; respeitemos a separação de poderes.
Só que os poderes do Estado - dizemos nós -, apesar de separados, não são estanques, especialmente se os condenados criminalmente o foram por actos praticados enquanto membros do poder executivo e no exercício das respectivas funções.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nestas circunstâncias, que são as do caso que vimos tratando, quer o Governo quer a Assembleia da República ficam obrigados perante o País a retirar, de forma clara e inequívoca, da evidência dos factos as devidas consequências políticas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Afinal, trata-se de uma actuação governamental cuja gravidade é hoje indesmentível, apesar dos esforços do Governo e da maioria para a negar, primeiro, e para a branquear, depois.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas não é de pessoas que tratamos, por mais censuráveis que sejam os seus comportamentos ou por mais louváveis que tenham sido os seus propósitos. É da ética política e demais regras da democracia e do Estado de Direito que cuidamos, das regras de actuação a respeitar por quem está ao mais alto nível do Estado, por aqueles que assumiram perante o País e, portanto, perante os cidadãos, actuar no seu interesse e no respeito pelas suas leis - «Juro pela minha honra cumprir com lealdade as funções que me são confiadas» é a fórmula do compromisso jurado, assinado e publicamente assumido pelos membros do Governo no acto de posse.
Com que legitimidade poderá o Estado condenar o carteirista do Metro, o ladrão de automóveis, o assaltante de bancos, o burlão que finta o Fundo Social Europeu ou as normas de atribuição de subsídios aos produtores de cereais, se os órgãos de soberania, legitimados pelo voto popular, toleram ou absolvem os seus membros que, conscientemente, violam as leis que se obrigaram a cumprir e a fazer respeitar?

Aplausos do PS.

No lamentável caso vertente estão presentes todos os ingredientes de uma telenovela, comprovados que estão a promiscuidade administrativa, os enredos sicilianos, o «polvo», na sua dramática e criminosa extensão, envolvendo membros do Governo, funcionários supostamente de toda a confiança, figurantes contratados, jet set e «biscateiros».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não vale e não é sério dizer que sobre o acontecido só a Justiça pode pronunciar-se e que os tribunais ainda não disseram a última palavra.
Aos tribunais o que é dos tribunais, ao Parlamento o que é do Parlamento. E há matéria para ambos.

Aplausos do PS.

O tribunal considerou provados factos, em qualidade e em quantidade, suficientes para que este Parlamento se interrogue: como foi isto possível?
E quem como nós participou na comissão de inquérito parlamentar terá honestamente de concluir que o tribunal foi de uma insuperável exigência probatória, só aceitando dar como provados os factos que não lhe deixavam a mínima margem de dúvida razoável.
Qualquer cidadão médio, um eleitor comum do partido maioritário consideraria, se fosse ele a julgar, provados muito mais actos criminosos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Chegados aqui, cumpre insistir que é de menor importância julgar se este ou aquele agente do enredo em questão deve ou não demitir-se dos cargos que desempenha a nível do Estado. A questão não é de pessoas. Aliás - sem hipocrisia-, admitimos como provável que os mais responsáveis politicamente não tenham querido ir, com os seus actos, além das meras irregularidades e ilegalidades irrefutavelmente cometidas.
Do que se trata, fundamentalmente, em termos de democracia e de Estado de Direito, é que estamos perante o maior escândalo da Administração Pública por-