1584 I SÉRIE - NÚMERO
Ora, a proposta de lei agora, apresentada adensa o mistério, porque, aparentemente, aquilo que a Procurado-ria-Geral da República e os códigos anotados existentes entendem revogado e que o Governo deveria igualmente entender revogado, uma vez que homologou o parecer, afinal, não está revogado, dado que o Governo vem agora propor a sua revogação.
Mas, há pior: o Governo vem propor a revogação no âmbito de uma autorização legislativa, ou seja, vem-nos dizer «nós queremos alterar» e, como disse o Sr. Deputado Nogueira de Brito, o Governo vem aqui pedir-nos para alterar o Decreto-Lei n.° 28/84 mas, no fundo, o que quer é alterar a Lei do Regime da Actividade de Televisão e nada nos diz sobre o Código da Publicidade, apesar do Sr. Secretário de Estado vir agora dizer que, afinal, é esse código que vai ser alterado.
Apesar de tudo, devo dizer que fico mais tranquilo, sabendo que as alterações se vão produzir no âmbito do Código da Publicidade e que, consequentemente, não vamos agravar o absurdo de, tendo nós um código que deve pressupor um esforço de verificação, termos, depois, 200 diplomas avulsos que tratam de matéria de publicidade. Assim, não passaremos a ter o «diploma 201», uma vez que esta alteração, parece, se vai produzir no âmbito do Código da Publicidade.
Quanto à descriminalização da publicidade fraudulenta, estamos todos de acordo, pois é obviamente anacrónico mante-la criminalizada pelo Decreto-Lei n.° 28/84. As medidas cautelares talvez façam sentido, mas a essa questão não lhe podemos responder, visto que, na lei da autorização legislativa, só é especificada uma medida cautelar. Mas como esta norma aparece a par de uma outra, ficamos com a ideia - talvez errada - de que o Governo pensa que outras medidas cautelares virão a existir para além desta e aí já não poderemos dizer a nossa opinião, uma vez que não sabemos o que vai na mente do Governo. Se o Governo tiver a amabilidade de nos esclarecer, talvez possamos dizer mais alguma coisa, embora eu fique com a dúvida de saber que outras medidas cautelares serão essas para além daquela que está especificada, que permite às autoridades fiscalizadoras a possibilidade de proibirem a divulgação de publicidade enganosa. Assim, gostaria de saber quais as outras medidas que estão previstas.
Finalmente, quanto à publicidade na televisão, o Governo vem dizer expressamente aquilo que já se sabia que tacitamente acontecia, ou seja, que aqueles diplomas foram revogados. No entanto, um problema subsiste: mantem-se um dos vícios que a guerra dos lobbies de 1990 introduziu no Código da Publicidade, ou seja, este código fingiu transpor a directiva em matéria de publicidade televisiva mas, depois, previdentemente, no diploma que o aprovou, foi ressalvada a aplicação de várias disposições fundamentais em matéria de publicidade televisiva, designadamente a percentagem de publicidade por dia, etc, etc. E, pior: estas disposições mantêm-se ressalvadas.
Ora, isto nada teria de mal, porque esta ressalva consta também da directiva, só que aí refere-se e parte-se do princípio que quem a aplica o faz com total boa fé. No entanto, como V. Exa. sabe, a tutela governamental da comunicação social tem entendido, por exemplo, a RTP no âmbito desta ressalva, considerando que esta emite exclusivamente para o território nacional e sem possibilidade de poder ser captada fora dele, o que significa que grande parte do que estava disciplinado para a RTP por via da Lei do Regime da Actividade de Televisão não estará efectivamente, por via do Código da Publicidade, se se mantiver aquela «ressalvazinha» que ainda está diploma que aprovou o Código da Publicidade.
A nós, sinceramente, parece-nos que, revogando pressamente, agora, a Lei do Regime da Actividade Televisão dever-se-ia igualmente revogar expressamente uma norma, que posso admitir ter feito sentido numa [...] transitória mas que hoje, de todo em todo, não faz se do, devendo ser aplicada em todas as televisões a [...] geral que consta do Código da Publicidade.
Eram estas as notas que gostaríamos de aqui deixe estando eu certo que a baixa à comissão desta proposta permitirá contornar vários dos problemas que aqui detectemos e que a próxima intervenção do Sr. Deputado Mc Veiga - que tenho visto muito atento a este debate - vai esclarecer-nos sobre o caminho final desta proposta, bem [...] sobre a posição final que adoptaremos sobre esta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Sr. Deputado António Costa, agradeço-lhe as palavras que quis dirigir-me, bem com a boa recordação que me trouxe dos vários anos em que presidi à Assembleia Municipal de Lisboa. Por tudo, estou-lhe muito grato.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente Srs. Deputados: Acrescentarei apenas algumas notas complementares ao que já referi no meu pedido de esclarecimento sobre esta matéria, em que, de facto, manifestei a minha estranheza relativamente à proposta de revogação destes quatro artigos. E creio valer apenas registar o seguinte: com esta revogação expressa fica claro que o Governo pretende um regime sancionatório muito mau benévolo do que aquele que está previsto na Lei de Regime da Actividade de Televisão.
Ora, entendo que isto deve ser registado e, da nossa parte, não merece aplauso, porque, efectivamente, para a mesma infracção, passar-se de uma coima máxima de 5 000 contos para uma coima máxima de 600 contos é algo que não merece o nosso aplauso, parecendo-nos, portanto, que esta questão deve ser efectivamente reflectida pelo Governo.
Por outro lado, gostaria ainda de me pronunciar quanto a outros aspectos relativos, concretamente, à autorização legislativa. Efectivamente, esta descriminalização da publicidade enganosa e da publicidade fraudulenta não consta da directiva que o Governo pretende que seja transposta. A parte relativa à transposição da directiva é outra, está prevista num outro artigo da proposta de lei.
A directiva deixa na disponibilidade dos Estados membros a forma de aplicação do regime sancionatório, ou por forma juridiscional ou por forma administrativa, e, portanto, esta é uma opção que compete à Assembleia da República e ao Governo tomar.
No que se refere a esta discriminalização em concreto, creio que se suscitam alguns problemas, particularmente quanto à publicidade fraudulenta, onde as fronteiras entre esta e o crime de burla são demasiado ténues para que se opte assim por uma discriminalização da publicidade fraudulenta.
Creio que esta questão deveria ser discutida e merecer alguma reflexão. Onde é que acaba a publicidade fraudulenta e começa o crime de burla para ser aplicado ou o regime contra-ordenacional ou o regime constante do Código Penal para o crime de burla? Julgo que esta questão vem aqui pouco reflectida.