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19 DE MAIO DE 1994 2355

obstáculo efectivo à visibilidade da acção do Partido Socialista, precisamente nos momentos mais decisivos do combate político; orientar o Presidente da República o «muito fôlego» da Presidência, para acabar com o pouco fôlego do actual secretário-geral do PS; pretender o Presidente da República utilizar o PS como instrumento de um ajuste de contas final com Cavaco Silva; estruturar o Presidente da República, com o núcleo de homens da sua confiança, o movimento anti-cavaquista, criando com este congresso um frentismo de esquerda, que pudesse reivindicar a dissolução antecipada da Assembleia da República e preparar uma equipa apartidária de Governo, a estruturar na amálgama de independentes do MASP, com um mínimo de figuras identificadas para agregar socialistas e comunistas; tentar o Presidente da República, apoiado nesse mesmo núcleo dos seus homens, impedir que o PS seja um partido independente, dirigido pelos seus órgãos próprios, portador de uma estratégia eleitoral e de um projecto político com autonomia.
Sete pecados mortais, sete acusações, assim apontados ao Presidente da República por um alto dirigente socialista, que até agora não se demitiu dos seus cargos nem foi demitido deles.
Acusações destas, jamais o PSD ousou fazer.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem.

O Orador: - Fui ver a Constituição e posso, neste momento, garantir-vos solenemente que nenhum dos comportamentos apontados pelo dirigente socialista faz parte dos poderes e das atribuições do Presidente da República.

Risos do PSD.

Por momentos - e só por momentos - imaginei que o Presidente da República poderia ser o General Ramalho Eanes. Imaginei mais que o Primeiro-Ministro poderia ser o Dr. Mário Soares. Imaginei ainda o Dr. Jorge Lacão - e, hoje, o Sr. Deputado Armando Vara - a escreverem o que escreveram sobre e comportamento do Presidente da República para com o Governo e para com o maior partido da oposição.
Confesso que não fui mais longe. Não tive coragem para imaginar qual seria a reacção do Dr. Mário Soares se fosse Primeiro-Ministro.
Parece, segundo a imprensa, que o líder do PS terá telefonado ontem ao Presidente da República, dando-lhe conta do isolamento do Dr. Jorge Lacão. Depois do artigo de hoje do Sr. Deputado Armando Vara, que prossegue nas acusações ao Presidente da República, em Belém aguarda-se hoje outro telefonema do engenheiro António Guterres.
Amanhã parece que também haverá outro telefonema, para explicar as declarações de hoje, ao Diário de Notícias, dos Srs. Deputados José Sócrates e José Lamego.
Sobe a ansiedade à espera das próximas entrevistas dos Drs. Cunha Rêgo e Carlos Monjardino ou do Sr. Comandante.
Seguramente que aí, talvez como fez à chegada da África do Sul, será o Dr. Mário Soares a telefonar de novo ao engenheiro António Guterres, explicando o isolamento destas personagens no Palácio de Belém.

Risos do PSD.

São muitos telefonemas e poucas explicações ao País.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Tudo parece excessivamente artificial, como num jogo de sombras.

Aplausos do PSD.

É necessário, Srs. Deputados, alargar as «avenidas» da discussão, como disse o Sr. Presidente da República, e esclarecer tudo isto. Compreende-se e respeita-se que a delicadeza e o estoicismo do secretário-geral do Partido Socialista o tenham levado, de uma forma elegante, a remeter a autoria dos ataques que lhe foram desferidos para - e cito - «pessoas a coberto do anonimato».
Só que o «vendaval» provocado na comunicação social teve autores visíveis, que foram precisamente os principais organizadores do congresso, os amigos dilectos do Sr. Presidente da República.
Organizaram o congresso em nome dele, sob o seu patrocínio, com organização logística na sede da Fundação Mário Soares... e estenderam-lhe a passadeira vermelha que conduziu ao discurso do sobressalto e dos sobressaltados. Sobressaltemo-nos, pois, todos um pouco, sintamos o frémito dessa sensação esfuziante. Ouçamos, recolhidos em silêncio, as palavras de quem tirou, contra o PS- não fomos nós-, as conclusões deste congresso, porque essas pessoas têm nome e têm rosto.
Primeira: quem tem dúvidas que o secretário-geral do Partido Socialista seja alternativa a Cavaco Silva não é um anónimo, é Vítor da Cunha Rêgo, um dos organizadores do congresso. E porque é que António Guterres, segundo ele, não é alternativa? Responde Cunha Rêgo no Independente de 13 de Maio: «Porque não compareceu no congresso, e, aí, cometeu um erro muito grande».
Não pode, por isso, opôr-se António Guterres ao Primeiro-Ministro nas legislativas? Cunha Rego responde, entre o enigmático e o ameaçador: «Temos de ver». Temos de ver? Qual é o sujeito para que remete este verbo? Quem tem de ver? Aguarda-se a resposta

Vozes do PSD:- Muito bem!

O Orador: - Guterres, que Cunha Rego afirma não ser «o chefe da esquerda», está, segundo o mesmo, numa «posição de subalternidade na vida política nacional», e não levou em linha de conta que o congresso foi feito a pensar na esquerda, e em si, Guterres. Diz mesmo - e cito de novo Cunha Rêgo: «Ele teve as informações mais do que necessárias para poder ou não decidir se estava ou não disposto a fazer parte, não só deste congresso (vejam bem!) mas das suas consequências».
Vítor da Cunha Rêgo, com a clarividência que lhe é reconhecida, anteviu que o líder do PS, com esta atitude, não estaria de corpo e alma, como parece que não está, com os espíritos do sobressalto.
Por isso, foi avisando: «Presumo que o Engenheiro António Guterres não vai mudar de linha. Infelizmente, como não o vai fazer...» E ficaram as reticências.
Teme ele que o PS perca as legislativas por isso, e antevê mesmo as consequências imediatas: «Quando ele regressar de Tóquio vem numa posição muito difícil. Encontra uma grande presença de Mário Soares na vida política nacional». E encontrou de facto. Só que pelas piores razões.