2888 I SÉRIE-NÚMERO 89
mesmo depois desse período transitório, haja um protocolo livremente celebrado entre a comissão interprofissional e a Casa do Douro para que assim continue a ser. Mas, repito, não pode ser o Governo, se queremos, de facto, emancipar as organizações agrícolas e dar voz a quem realmente a deve ter, que são os produtores e os comerciantes dos vinhos da região, a estar, desde já, a vinculá-los a uma decisão política que, ainda por cima, teria uma base jurídica perfeitamente discutível e controversa.
De modo que estou em crer que, na tentativa de construção de um modelo moderno e eficaz que resolva os problemas e não crie outros, vamos conseguir prestar um bom serviço à Região.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Maia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela terceira vez, desde que o PSD detém a pasta do Ministério da Agricultura, o Governo traz à Assembleia da República uma proposta de alteração institucional para a Região Demarcada do Douro. E de cada vez uma solução que contradiz e está nos antípodas da anterior ou a esvazia.
Em 1986 o PSD propunha-se, pura e simplesmente, extinguir a Casa do Douro, substituindo-a por uma associação de natureza privada. Tendo enfrentado a forte oposição da região foi-lhe recusada a ratificação pela Assembleia da República e a tentativa fracassou.
Em 1989, o mesmo PSD, também através de autorização legislativa, aprova os Estatutos e o Regulamento Eleitoral da Casa do Douro. Sem força para retomar o seu propósito de extinguir a Casa do Douro, o PSD vê-se forçado a confirmá-la como pessoa colectiva de direito público, representante oficial da lavoura duriense com funções de regulação, disciplina e controlo da produção do Vinho do Porto, bem como dos restantes vinhos da região.
Agora, chega-nos um novo pedido de autorização legislativa para nova alteração dos Estatutos da Casa do Douro, ele próprio com um percurso que reflecte desorientação mas também as intenções últimas do Governo: na primeira versão enviada pelo Governo aos interessados, em Janeiro 1994, voltava-se à ideia da transformação da Casa do Douro numa associação privada e a transferência de todas as suas funções oficiais relativas ao Vinho do Porto para o Instituto do Vinho do Porto (FVP).
Obrigado a recuar devido à forte reacção da lavoura duriense, o Governo apresenta-nos agora um pedido de autorização legislativa que constitui uma autêntica emboscada. No pouco que, propositadamente, revela, o Governo não esconde que o seu objectivo, se o conseguir, é o de esvaziar o que não consegue destruir. Isto é, o Governo é forçado a manter a natureza de associação pública da Casa do Douro, mas logo a seguir retira-lhe, no imediato ou a prazo, todas as funções públicas que actualmente detém. Gato escondido com o corpo quase todo de fora.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Que funções públicas é que restariam à Casa do Douro? Aparentemente nenhumas! Talvez unicamente o registo dos viticultores.
Acresce, contudo, que a proposta de autorização legislativa constitui um autêntico pedido de cheque em branco ao Governo. A acreditar na exposição de motivos o PSD pretenderá transferir globalmente as actuais competências administrativas da Casa do Douro e parte das competências do IVP para uma comissão interprofissional a criar. Mas o Governo não esclarece quais são as competências do IVP que pretende transferir, não junta nem o novo projecto de estatutos da Casa do Douro nem o seu Regulamento Eleitoral e, pior que tudo, fala na criação futura de uma comissão interprofissional, mas nada diz quanto ao seu estatuto, composição, atribuições e funcionamento.
É um órgão do IVP como constava do projecto inicial do Governo ou é uma associação de direito público com autonomia administrativa e financeira? A quem seria atribuída a competência referente ao cadastro, à atribuição do benefício, ao controlo das contas correntes, ao controlo do movimento de vinhos na região, ao escoamento, à regulação de stocks? Ao IVP ou à comissão interprofissional? À Casa do Douro serão atribuídas competências para executar, a título originário ou delegado, as deliberações do interprofissional, ou não? A certificação de que os vinhos para exportação foram antecipadamente pagos ao produtor, questão vital para os interesses destes, mantém-se na Casa do Douro, ou não? Por que é que o Governo não entregou à Assembleia da República, apesar de insistentemente requeridos, os anteprojectos dos estatutos da comissão interprofissional, da Casa do Douro e do Instituto do Vinho do Porto?
E, Sr. Secretário de Estado, o PCP não está isolado nesta matéria, posso até dizer-lhe que também tenho vários textos e a audição parlamentar que realizámos assim o confirmou, ou seja, que, de acordo com os conhecimentos existentes na região dos actuais propósitos do Governo, a tese geral é a de que, mesmo que se avance para o interprofissional, não devem ser retiradas competências à Casa do Douro. Esta é uma linha geral, uma linha de consenso, na qual o PCP se revê e não na linha que o Governo aqui nos traz. Quem está isolado é o Governo e não o PCP.
Se os textos já estão - como têm de estar - elaborados, se correspondem ao que foi debatido e acordado com a Casa do Douro, o Conselho Regional de Viticultores e outros interessados, se são propostas de consenso, porque razão é que o Governo as esconde da Assembleia da República?
Temos toda a legitimidade para duvidar das intenções do Governo. Os exemplos de 1986, 1989 e o percurso seguido nesta nova tentativa de alteração do figurino institucional da Região Demarcada do Douro são mais que suficientes para dizer que o Governo não nos merece qualquer confiança quanto à orientação e conteúdo das modificações que quer introduzir. Mas não se trata somente de um processo de intenções. O texto deste pedido de autorização legislativa e o modo como foi agendado são factos concretos a demonstrar que o Governo balançou de novo a favor dos interesses do grande comércio exportador contra os interesses da lavoura e da defesa da qualidade do vinho do Porto, contra o concerto de posições, contra os interesses de toda a região duriense.
Apesar do Governo ter acordado com os vários interessados que o debate desta matéria só seria feita no início da próxima sessão legislativa, lá para Outubro - o que foi mesmo confirmado nesta Assembleia por Deputados da maioria-, e que até lá continuaria o diálogo com vista a uma solução consensual a verdade é que, já depois de praticamente encerrados os agendamentos para o mês de Julho, o Governo substituiu, repentinamente, uma proposta de lei de autorização legislativa do Ministério das Obras Públicas,