19 DF. JANEIRO DE 1995 1179
E por essa razão que queria manifestar o meu grande apreço pela intervenção do Sr. Secretário de Estado para os Assuntos Europeus, porque fez uma enumeração» daquilo que posso entender, de pontos de um programa de governo para a Europa e de outros que dizem respeito à reformulação institucional futura. Não vou referir-me aqueles que dizem respeito ao governo da Europa mas aos que dizem respeito à reformulação institucional.
Quanto aos pontos que dizem respeito à reformulação institucional, posso, em primeiro lugar, indicar alguns puramente instrumentais mas que são fundamentais para â arquitectura final - o tal pequeno seixo que se tira debaixo da fraga e a fraga rola Aqui trata-se, provavelmente, dos seixos para segurar a fraga, mas temos de tratar deles.
Em primeiro lugar, qual é o estatuto dos partidos europeus nesta construção que estamos a fazer? Há um partido que se definiu como europeu desde o princípio: o Partido Popular Europeu. Como intervém na vida interna dos países? Como apoia as propagandas? Como financia? Quem controla? Que Tribunal de Contas vai tratar disso? E, quando não for um partido, mas 10, a funcionar em todos os países? Como vamos controlar essa intervenção decisiva e básica na formação dos órgãos que vão exprimir a vontade política democrática? Julgo que, no momento, em que tantas inquietações e transparências temos todos na Europa, este ponto merece alguma consideração a respeito das prospectivas e arquitectura do futuro.
Em segundo lugar, temos uma Comissão Consultiva das Regiões Logo que foi instituída, chamei a atenção nesta Câmara para o facto de que comissões consultivas constituídas por representantes políticos são decisórias na primeira reunião, porque imediatamente começam a reclamar que as suas deliberações sejam respeitadas Não é em nome da vontade que pedem o respeito mas em nome da sua dignidade que o fazem.
Essa Comissão Consultiva deve ou não ser acompanhada de alguma modificação constitucional interna do tipo segunda câmara?
Quanto ao controlo da subsidariedade, esta precisa, em primeiro lugar, de ser controlada quanto ao significado. A subsidiariedade tem bons tratadistas. Lembro Suarei, que seria uma boa autoridade para nos orientar neste sentido e evitar que se confunda isto com a centralização que condescende em descentralizar Não é essa a subsidiariedade que pretendemos mas exactamente a contrária.
Finalmente, temos o problema da dupla velocidade europeia Julgo que temos de assumir o desafio de que a dupla velocidade está em dois planos- por um lado, está no plano político e, aí, nós não queremos nem um directório, nem um «Estado-director», nem uma hierarquia de potências, por outro lado, está no plano social porque queremos que o aprofundamento impeça essa desigualdade entre os povos europeus.
Naturalmente, isto e apenas um começo da nossa meditação. Por mim, penso que a oportunidade e excelente, penso que o debate deve ter continuação. Aliás, agora que estamos fora das discussões em sede da Comissão, devo dizer que o documento me foi muito útil.
Aplausos do CDS-PP
O Sr Presidente (Ferraz de Abreu.)- - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr Presidente, Sr.ªs e Srs Deputados Há pouco mais de dois anos, esteve na agenda do dia. Apaixonou, como porventura poucas outras questões o terão conseguido, as opiniões públicas na Europa Multiplicou debates. Movimentou protestos. Abalou Governos. Arrasou famílias políticas. Dividiu povos. Foi o tempo de Maastricht Da ratificação do Tratado, de União paradoxalmente chamado, com ironia de quem, talvez deste modo, terá desejado assinalar com o equívoco todos os muitos de que este processo de construção tem sido feito.
Por cá tudo foi mais silenciado.
A questão foi tabu e, na lógica dos velhos partidos tradicionais que entendem a política como privilégio de alguns, o debate foi impedido. Concediam-nos a cidadania, disseram, mas tiraram-nos voz. Atribuíam-nos novos direitos, disseram, mas retiraram-nos o da livre escolha.
Processo curioso, pois, este, o nosso, tanto mais que protagonizado por aqueles para quem como dogma este Tratado foi assumido, não como uma via mas como a única possível. Uma via que nós, Os Verdes, dissemos então ser incapaz de interpretar a história recente da Europa e equacionar os grandes desafios que à humanidade se colocavam Uma via que afirmámos estar condenada ao fracasso por recuperar valores caducos de regimes feitos da marginalização dos povos, da anulação da identidade cultural, de asfixiante autoritarismo Uma via que negava enfrentar a profunda crise ecológica e o desafio civilizacional implícito que a Conferência do Rio tinha lançado e que teimava em impor um modelo obsoleto de crescimento ilimitado, gerador não de bem-estar mas de exclusão social e de degradação ecológica. Uma opção cujos efeitos não se fizeram esperar bem como o prudente distanciamento dos seus acérrimos defensores, hoje moderadamente críticos como convém, perante a pressão das opiniões públicas.
Os efeitos são visíveis na ausência de resposta aos problemas essenciais, nas profundas frustrações criadas, na instabilidade, bem como no agravamento da crise económica, nos fenómenos de exclusão, na degradação ecológica, no acentuar dos desequilíbrios entre povos e regiões, na violação de direitos humanos, no desenvolvimento de guerras, nos fenómenos migratórios, nos sinais de intolerância e racismo, numa Europa cada vez, mais enorme corpo em simultâneo crescimento e desagregação, que se mostra incapaz de reagir e que urge pensar diferentemente
Sr. Presidente, Srs. Deputados. É, pois, perante isto que dizemos que é preciso mudar, alterar os pressupostos.
A próxima revisão do Tratado pode ser parte integrante dessa mudança que implica debate vivo, participação, informação, envolvimento dos cidadãos na tomada de decisões.
É uma mudança que implica a recusa da padronização destruidora da identidade cultural, ambiental e social, impostas por instâncias que escapam ao poder fiscalizador dos povos, numa arquitectura de desigualdade de todo inaceitável Uma mudança que implica a recusa da perpetuação de mecanismos de competição mundial, destruidores do que é pequeno e diverso, que recusa a desigualdade na troca entre o Norte e o Sul e o condenar à miséria, à desertificação e à fome povos cujos recursos se exploram em pseudo-programas ditos de cooperação Uma mudança que implica a recusa da manutenção do desperdício de recursos humanos e financeiros para suporte de grandes aparelhos militares, tão delapidadores quanto inúteis quando se trata de encontrar os caminhos da paz Uma mudança que implica a recusa da lógica desumanizadora do consumismo e do produtivismo, do lucro a qualquer preço, que têm pautado a construção europeia e, ainda, que determina atender ao primado das pessoas que não o dos mercados, a uma nova solidariedade entre gerações e à preser-